Acórdão nº 848/08.8TBFAF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Março de 2011

Data29 Março 2011

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente (s): Caixa Geral de Depósitos SA e D…; Recorrida (s): M…; ***** Nos autos de inventário para partilha de bens, em que é cabeça de casal D… e requerida M…, a interveniente acidental Caixa Geral de Depósitos SA e a requerida M… vieram interpor recurso de apelação do despacho judicial de 12.05.2009, que ordenou à Caixa Geral de Depósitos SA que prestasse as determinadas informações bancárias “ com a expressa cominação de que a falta de colaboração para com este Tribunal será severamente sancionada em multa”.

Esta instituição escusou-se a fornecer a informação solicitada, invocando o sigilo bancário.

Formula a apelante Caixa Geral de Depósitos SA as seguintes conclusões que se transcrevem: a) - O Tribunal a quo ordenou no despacho recorrido a disponibilização pela CGD de «… extracto de todas as contas bancárias a prazo e à ordem desde Abril de 2008, inclusive, até à presente data, tituladas ou co-tituladas pelo cabeça-de-casal, D…, ….», sob pena de ser severamente sancionada em multa.

  1. – Como decorre das notificações recebidas, estamos perante um processo de inventário para partilha subsequente ao divórcio entre o ex-casal D… e M….

  2. - A CGD, invocando o dever de segredo bancário ao qual está por lei obrigada nos termos do art. 78.º do Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro (Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras), tinha já recusado a satisfação de anterior pedido idêntico (cfr sua carta de fls.-de 04-02-2009).

  3. - Na segunda notificação efectuada (de 18-05-2009), a insistir pela prestação de tais elementos, a mesma foi complementada com requerimento mediante o qual a interessada / requerida M… prestou o seu consentimento pessoal à prestação de tais informações, «… por se tratar de depósitos que integram o património comum do seu dissolvido casal.» e) - Ora, mediante tal consentimento, tornou-se possível à CGD prestar as informações solicitadas em relação às contas onde a requerida M… fosse titular conjuntamente com o cabeça-de-casal D… (cfr art.-79, nº.-1 do aludido Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro). Pelo que, nesta parte, ficou o pedido do Tribunal de 1ª Instância satisfeito.

  4. - Mas não em relação às demais, necessariamente não abrangidas pela autorização pessoal e exclusiva da requerida M… . Em relação a essas, portanto, mantém-se necessariamente o dever de sigilo bancário ao qual a CGD está legalmente vinculada. O que, aliás, é reconhecido pela 1ª Instância.

  5. - O que acontece é que o Mmo. Juíz do Tribunal a quo no despacho do qual ora se recorre, não invocando qualquer disposição legal que preveja uma excepção ao dever de sigilo, e considerando que «No conflito de interesses entre o dever das instituições bancárias de não revelar as informações relativas às contas bancárias dos seus clientes e o direito de quem se arroga herdeiro/interessado de determinada pessoa de localizar os bens e que seria também proprietário – pelo menos alegadamente – dos valores depositados, não se pode deixar de se entender que aquele dever cede perante este direito, manifestamente superior, por reconhecido na lei….

    », ordenou a prestação da informação – sob pena de multa severa - invocando, designadamente, o dever de cooperação e o disposto nos arts.-519 e 266 do CPC.

  6. - Ora, parece que o melhor entendimento será o de que as invocadas normas não constituem, por si só, uma derrogação do dever de segredo bancário (profissional) legalmente imposto e cuja violação é penalmente sancionada (art.º 195.º do Código Penal), pois, a ter-se outro entendimento, tal deixaria sem qualquer sentido a legítima recusa de prestação de informação, prevista no art. 135º do Código de Processo Penal e o respectivo regime de verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado, previstos nos nºs 2 a 5 do mesmo art. 135º .

  7. - De resto, o próprio art.-519, nº.-3, al. c) (para onde o art.-266, nº.-3 também remete), ressalva expressamente a necessidade de salvaguarda do «sigilo profissional ou de funcionários públicos», considerando legítima a recusa com base em tal dever de sigilo, e estipulando que, neste caso, será então aplicável com as devidas adaptações o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de segredo bancário - cfr nº.-4 do aludido art.-519 do CPC.

  8. - Do que decorre que o pedido de informação em causa, tem isso sim, de ser analisado à luz do disposto no art.º 135º do C.P.P., para onde remetem tanto o nº.-4 do art..-519 do CPC, como a al. d) do nº.-2 do art.-79 do Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro.

  9. – Prevê, de facto, o art. 79º, nº 2, al. d) do RGICSF que os elementos sujeitos a segredo podem ser revelados nos termos da lei penal e de processo penal, e dispondo esta lei de uma previsão normativa especialmente aplicável a estes casos, constante dos arts. 182º e 135º do Código de Processo Penal, crê-se que deverão ser primacialmente estas as normas a aplicar.

  10. - Ora a ponderação de interesses que poderá conduzir à prevalência do interesse público na administração da justiça relativamente aos interesses protegidos pelo segredo bancário, tem a sua sede própria no procedimento de quebra de sigilo bancário previsto no art. 135º, nº 3 do C.P.P..

  11. - Ao ordenar a prestação dos elementos de informação em causa, o Tribunal a quo, violou o disposto no n.º 3 do art. 135.º do CPP, já que deveria ter suscitado junto do Tribunal da Relação do Porto o incidente de prestação de informação com quebra do dever de segredo.

  12. - Na verdade, concordando com a interpretação daquela norma feita pelo STJ no seu Acórdão de 06/02/2003, relativo ao processo n.º 03P159, publicado in www.dgsi.pt, Sumário – n.º III, também a CGD defende que: “A decisão sobre o rompimento do segredo é da exclusiva competência de um tribunal superior ou do plenário do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT