Acórdão nº 8091/03.6TBVFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | PAULO SA |
Data da Resolução | 08 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.
No Tribunal da Comarca de Santa Maria da Feira, AA- A... Portugal, Companhia de Seguros, S.A.
instaurou acção declarativa sumária contra Brisa – Auto-Estradas de Portugal, S.A, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 16559,45, acrescida de juros vincendos à taxa legal, desde citação até efectivo e integral pagamento.
Alega, para tanto, em síntese: Mediante contrato de seguro celebrado com CC, assumiu a responsabilidade pela circulação do veículo ...-...-PT.
Em Março de 2001, ocorreu um acidente de viação na A1, no sentido N/S, ao Km 280, no qual intervieram vários veículos, tendo a A, por via do contrato de seguro pago os danos sofridos pelo PT, uma vez que o seguro cobria danos próprios, no valor de € 13.218,14, bem como os danos do veículo embatido pelo PT, no valor de € 3.242,19.5716 Por via do acidente, teve a autora outras despesas, de € 47,00 e € 52,12.
O acidente ficou a dever-se à existência de excesso de água no piso, cujos meios de escoamento se revelaram insuficientes, o que representa um perigo para os utentes da via.
E a ré é responsável por manter essa via em condições de segurança para os que nela circulam, pelo que deve indemnizar a autora no que, por causa do acidente, teve de despender.
A ré contestou.
Além de impugnar a factualidade alegada referente ao modo do acidente e danos, diz que, no momento em que ocorreu o acidente, fazia mau tempo, com fortes rajadas de vento e com chuvas intensas, atingindo a precipitação os 30 mm em 10 minutos, o que se fez sentir em todo o norte do país.
A queda de tão grande quantidade de chuva é facto fortuito ou de força maior que não pode ser imputável à ré, nem é dominável pela sua vontade.
Pelo que, só sendo responsável por reparar danos decorrentes de facto ilícito a si imputável, tal não sucede com o facto que, segundo a autora, está na origem do acidente.
Pois que a ré não omitiu qualquer acto destinado a assegurar permanentemente as condições de circulação e segurança na referida auto-estrada, não sendo responsável pelas consequências do acidente.
Requereu a intervenção acessória provocada da DD-Companhia de Seguros F...-M..., SA, por com esta ter celebrado seguro de responsabilidade civil pelas indemnizações que, nos termos da legislação em vigor, sejam exigidas da ré.
Termina a pedir a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Admitida a intervenção, a DD-F...-M... contestou.
Impugna a existência de quaisquer deficiência no piso da via ou a existência de lençóis de água, mas apenas que chovia torrencialmente, que o piso estava molhado e escorregadio, razões pelas quais, associadas à inabilidade de alguns condutores ou ao excesso de velocidade, faz assentar a ocorrência do sinistro.
Impugna o modo do acidente descrito pela autora, bem como os danos alegados, por desconhecimento.
Pede a improcedência da acção.
Seleccionada a matéria de facto, sem reclamação das partes, procedeu-se a julgamento, tendo-se, posteriormente, sentenciado a condenação da ré a pagar à autora a quantia de € 8.279,73 e juros de mora, desde a citação.
Em via de recurso, foi anulado o julgamento.
Após nova audiência de decisão sobre a matéria de facto, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 16.507,33, com juros de mora legais, desde a citação até efectivo pagamento.
Inconformadas com a sentença, recorrem a ré e a interveniente.
Apenas a primeira alegou.
A Relação do Porto veio a julgar a apelação improcedente e a confirmar a sentença recorrida.
Desta decisão veio recorrer a R, Brisa, de revista, para este STJ.
A Brisa concluiu as suas alegações do seguinte modo: 1 – Dos depoimentos das testemunhas da autora, existia um “ribeiro” de água que vinha do lado oposto, isto é, do sentido Sul/Norte; 2 – Provou-se que a ora recorrente efectuou, na data do sinistro, o patrulhamento ao longo da A 1 (resposta ao quesito 33º), e que “No âmbito de tal vigilância, pelo menos até uma hora antes, em que um veículo da Brisa passou no local, a situação descrita nos factos provados 6, 14 e 15 não foi detectada” – (Resposta ao quesito nº 36º da Base Instrutória).
3 – Não se pode ignorar que, para além da chuva intensa, tinha havido um transbordo para a via de uma linha de água do exterior à zona concessionada, não se podendo exigir à mesma que procedesse, de imediato, à sinalização do local e repusesse o rápido escoamento das águas, que provinham não só da chuva intensa, mas duma linha de água do exterior e adjacente à zona concessionada, conforme se sabe e está provado.
4 – O douto aresto ora recorrido perante tal prova entende que, mesmo assim, não se encontra preenchido o conceito e definição de força maior que nos é dada pelo nº 2 da base XLVII, ou seja, de um” acontecimento” imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária, não basta à concessionária “(...) manter a via em condições ou em boas condições mas em perfeitas condições de utilização, não se consentindo excepções ou menor atenção ao cumprimento, sem reparo, de tais obrigações.” – 1º parágrafo a fls. 18 do douto aresto.
5 – À ora recorrente não impende sobre a mesma a “tutela” de linhas de água exteriores à sua concessão, tão somente impende sobre a mesma ter drenagem para drenar águas pluviais e não outras pelo que perante os factos supra referidos, e ainda de fortes rajadas de vento (resposta ao quesito 38º da Base Instrutória), quantidade de precipitação no dia em causa (resposta ao quesito 37º da Base Instrutória) e com os depoimentos supra referidos, a resposta aos quesitos 18º e 19º da Base Instrutória, houve, em suma, uma conjugação de factos que se integram no conceito e definição de força maior que nos é dada pelo nº 2 da base XLVII, ou seja, de um” acontecimento” imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária, a Brisa provou a sua falta total de culpa no incumprimento das suas obrigações ou, eventual, caso seja esse o entendimento, cumprimento defeituoso do contrato.
6 – O douto Aresto, após atenta leitura, peca por em traços gerais dizer que a Brisa não assegurou, de forma continuada e permanente as necessárias condições de utilização, segurança e comodidade na circulação da auto-estrada, o que lhe era absolutamente exigido e sem excepções ou menor atenção ao cumprimento, sem reparos das sua obrigações.
7 – Ao contrário do entendimento do Tribunal “a quo” não se vislumbra um facto ilícito cometido pela Brisa, pois não impende sobre a mesma, nem decorre do D.L. nº 294/97 de 24/10, a obrigação de a todo o tempo e em toda a extensão da auto-estrada assegurar que não existe qualquer “obstáculo” no piso que possa dificultar, assustar os utentes ou pôr em perigo a circulação automóvel.
8 – “No âmbito de tal vigilância, pelo menos até uma hora antes, em que um veículo da Brisa passou no local, a situação descrita nos factos provados 6, 14 e 15 não foi detectada.” – (Resposta ao quesito no 36º da Base Instrutória); 9 – Perante tais factos, acrescido das fortes rajadas de vento (Resposta ao quesito 38º da Base Instrutória), quantidade de precipitação no dia em causa (resposta ao quesito 37º da Base Instrutória) e com a resposta aos quesitos 18º e 19º da Base Instrutória, 10 – houve uma conjugação de factos que se integram no conceito e definição de força maior que nos é dada pelo nº 2 da base XLVII, ou seja, de um” acontecimento” imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária, 11 – a Brisa provou a sua falta total de culpa no incumprimento das suas obrigações ou, eventual, caso seja esse o entendimento, cumprimento defeituoso do contrato, contudo, 12 – não entendeu o Tribunal “a quo” a falta total de culpa da ora recorrente, mantendo na íntegra a douta Sentença do tribunal de 1ª instância.
13 – Ao contrário do entendimento do Tribunal “a quo” não se vislumbra um facto ilícito cometido pela Brisa, pois não impende sobre a mesma, nem decorre do D.L. nº 294/97 de 24/10, a obrigação de a todo o tempo e em toda a extensão da auto-estrada assegurar que não existe qualquer “obstáculo” no piso que possa dificultar, assustar os utentes ou pôr em perigo a circulação automóvel.
14 – Tendo a ora recorrente BRISA ao seu dispor meios efectivos de fiscalização, 24 horas sobre 24 horas, da auto-estrada A1, norma alguma, legal ou contratual, obriga a Brisa, como resultado, a garantir a ausência de obstáculos na sua área concessionada.15 – À Brisa, como concessionária, compete tão-somente fazer um esforço razoável para assegurar a boa, segura e livre circulação nas auto-estradas.
16 – Exige-se antes que “em termos razoáveis, em tempo oportuno e de modo eficaz, a Brisa assegure a boa circulação nas auto-estradas concessionadas, fazendo as reparações devidas, mantendo uma vigilância permanente (esta em termos realistas) (...)“ (cfr. Ac. Da Relação de Lisboa de 3 1/10/96, in CJ, IV, pág. 149).
17 – Considerando o factualismo dado como provado, não oferece dúvidas que a Ré Brisa, no caso vertente, provou a sua falta total de culpa no incumprimento ou, eventualmente, se for esse o entendimento, cumprimento defeituoso do contrato, 18 – como se provou a ocorrência de um acontecimento concreto que integrou o conceito de força maior, segundo a definição que nos é dada pelo n.º 2 da base XLVII, ou seja, de um” acontecimento” imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária.
19 – Através das Bases anexas ao Decreto-Lei 294/97 de 24 de Outubro, fácil é concluir que a responsabilidade da R. Brisa será civil extra-contratual subjectiva por facto ilícito, 20 – e regula-se unicamente pelo princípio geral contido no art.º 483º do Código Civil, que estatui que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar...
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Acórdão nº 4401/08.8TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2012
...seu art.º 12.º mesmo aos acidentes ocorridos anteriormente - cfr. neste sentido, entre outros, os acórdãos, do STJ de 8.02.2011, Proc. 8091/03.6TBVFR.P1.S1, de 15.11.2011, Proc. n.º 1633/05.4TBALQ.L1-S1, de 2.11.2010, Proc. n.º, 7366/03.9TBSTB.E1.S1, de 1.10.2009, Proc. n.º, 1082/04.1TBVFX.......
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Acórdão nº 131/14.0T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2016
...para as questões em apreciação, o que se refere nos Acs. do STJ de 15.11.2011 (proc. nº 1633/05.4TBALQ.L1.S1) e de 8.2.2011 (proc. nº8091/03.6TBVFR.P1.S1), entre muitos outros mais recentes, incluindo desta Relação, que podem ser consultados in Assim, não é suficiente para ilidir a presunçã......
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Acórdão nº 77/09.3T2ALB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Março de 2011
...sup. cit. e Acs. do STJ de 13.11.2007, p. 07A3564, de 09.09.2008, p. 08P1856, de 01.10.2009, p. 1082/04.1TBVFX.S1 e de 08.02.2011 p. 8091/03.6TBVFR.P1.S1. Assim sendo, In casu, impendendo sobre a ré B... a presunção de culpa competia-lhe elidi-la, provando que actuou com ausência de culpa d......
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Acórdão nº 375/07.0TBAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2012
...em www.dgsi. pt. No mesmo sentido, entre outros, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09-09-2008 (Garcia Calejo), proc. n.º 8091/03.6TBVFR.P1.S1, de 01-10-2009 (Santos Bernardino), proc. n.º 1082/04.1TBVFX, de 02-11-2010 (Fonseca Ramos), proc. n.º 7366/03.9TBSTB, de 08-02-2011 (Paulo ......
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