Acórdão nº 456/06.8TBVGS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Novembro de 2010
Magistrado Responsável | HELDER ROQUE |
Data da Resolução | 23 de Novembro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Área Temática: DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL Doutrina: - J. Álvaro Dias, Dano Corporal - Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Almedina, 2001, 136, nota (291). - Antunes Varela, das Obrigações em Geral, I, 1970, 421 a 424. - Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual, Almedina, 2005, 42. - Cardozo, Il Quantum nel Danno a Persona. Gli Anni Recenti, Law Bulletin. - Pinto Monteiro, Sobre a Reparação dos Danos Morais, Revista Portuguesa do Dano Corporal, Setembro de 1992, nº 1, 19. - Sinde Monteiro, Estudos sobre a Responsabilidade Civil, Almedina, 1983, 248.
Legislação Nacional: CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 661.º, N.º 1 E 668.º, N.º 1, E), 684.º, N.º 4. CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 496.º, 566.º, N.º2, 805.º, N.º 3, 806.º, N.º1. Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 15-6-93, BMJ Nº 428, 530; - DE 18-11-75, BMJ Nº 251, 107; - DE 6-5-1999, Pº Nº 99B222, WWW.DGSI.PT ; - DE 4-10-2005, Pº 05A2167, WWW.DGSI.PT - DE 4-10-2007, Pº Nº 07B2957, WWW.DGSI.PT ; - DE 10-7-2008, Pº Nº 08B1343, WWW.DGSI.PT; - DE 19-5-2009, Pº Nº 298/06.OTBSJM.S1, WWW.DGSI.PT ; - DE 27-10-2009, Pº Nº 560/09.0YFLSB, WWW.DGSI.PT . ACÓRDÃO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 4/2002, STJ, DE 9-5-2002, DR, 1ª SÉRIE-A, DE 27-6-02.
Jurisprudência Estrangeira: - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE ITÁLIA, DE 6-6-1981, CITADO POR ARMANDO BRAGA, IN “A REPARAÇÃO DO DANO CORPORAL NA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL”, ALMEDINA, 2005, 41, NOTA (34). - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE ITÁLIA, Nº 7101, DE 6-7-1990, RIVISTA DE GIURISPRUDENZA IN TEMA DI CIRCOLAZIONE E TRANSPORTO, 1991, 644. -ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ITALIANO, DE 14-7-1986, RESPONSABILITÀ CIVILE E PREVIDENZA, 1986, 520 E SS. Sumário : I - Entendendo-se referido o limite da condenação ao pedido global, nada obsta a que, representando este a soma de várias parcelas, que não correspondam a pedidos autónomos, como acontece, por via de regra, nas acções de indemnização, se possam valorar essas parcelas em quantia superior à referida pelo autor, desde que o cômputo global fixado na sentença não exceda o valor total do pedido.
II - A lesão da integridade físico-psíquica, uma vez reconhecida a sua existência como dano-evento, deverá sempre ser reparada, ainda que não incida na capacidade de produzir rendimentos e, também, independentemente desta última.
III - Da configuração do dano biológico como lesão da saúde, ou seja, da sua qualificação como dano-evento, objectivamente antijurídico, violador de direitos fundamentais, constitucionalmente, protegidos, resulta, como consequência, a atribuição da sua natureza não patrimonial.
IV - Verificando-se o dano biológico, deverá o mesmo ser reparado e, eventualmente, deverá ser ressarcido, também, o dano patrimonial da redução da capacidade laboral, caso se demonstre a sua existência e o nexo de causalidade com o dano biológico.
V - Ficando a autora com uma marcada intensidade, ao nível das sequelas psíco-somáticas sobrevindas, como consequência necessária e directa do acidente que sofreu, muito embora sem se ter demonstrado qualquer quebra na sua capacidade de ganho, tendo sido afastado o rebate profissional, o dano biológico ocorrido é catalogável no quadro tipológico do dano moral, desde que um eventual acréscimo de esforço físico e/ou psíquico se não repercuta, directa ou indirectamente, no estatuto remuneratório profissional ou na sua carreira, em si mesma, e não se traduza, necessariamente, numa perda patrimonial futura ou na frustração de um lucro.
VI - O dano biológico pode ser ressarcido como dano patrimonial, ou compensado, a título de dano moral, mas não nas duas vertentes, simultaneamente, devendo a situação ser apreciada, casuisticamente.
VII - Inexistindo cálculo actualizado da indemnização a prestar, quanto aos danos de carácter patrimonial, ao contrário do que acontece quanto aos danos de natureza não patrimonial, o início dos juros de mora conta-se, desde a citação, para os primeiros, e da prolação da decisão, quanto aos últimos.
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA(1).: AA, residente na Rua da C..., nº ..., V..., Vagos, propôs contra a BB-“Companhia de Seguros F..., SA”, com sede no L... do C..., nº ..., em Lisboa, a presente acção com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €206.517,58, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, bem assim como as importâncias a liquidar em execução de sentença, pelos danos futuros previsíveis emergentes dos tratamentos e intervenções cirúrgicas a que ainda tiver de ser submetida, medicação, consultas, deslocações, despesas com os mesmos e consequências definitivas, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação, alegando, para tanto, que, ao atravessar a estrada, fazendo uso de uma passadeira para peões, foi aí atropelada por um veículo seguro na ré, que circulava com velocidade excessiva e sem qualquer atenção, de tal sorte que nem sequer travou para evitar o acidente, em consequência do qual sofreu lesões físicas que lhe demandaram internamento hospitalar, tratamentos e intervenções médicas, tendo advindo sequelas definitivas que, além de dores e sofrimento, lhe provocaram incapacidade permanente.
Na contestação, a ré imputa à autora a culpa pela produção do acidente, por ter iniciado a travessia da estrada, inopinadamente, e sem se certificar que o podia fazer sem perigo, impugnando, também, parte da matéria atinente aos danos, e termina com o pedido da procedência parcial da acção.
Na réplica, a autora conclui como na petição inicial.
A sentença julgou a acção, parcialmente, provada e procedente e, em consequência, condenou a ré a pagar à autora a indemnização de € 34.037,58, acrescida de juros de mora, contados desde a data da citação e até integral pagamento.
Desta sentença, a autora interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado, parcialmente, procedente a apelação, revogando, em parte, a sentença, e condenando a ré a pagar à autora, a título de indemnização pelo acidente dos autos, as quantias de € 25.923,00, a título de danos patrimoniais, e de € 50.000,00, a título de danos não patrimoniais, perfazendo o montante indemnizatório global de € 75.923,00, acrescido de juros de mora, nos termos fixados na sentença, no mais absolvendo a ré do pedido.
Deste acórdão da Relação de Coimbra, a ré e a autora interpuseram recurso de revista, a primeira, a título independente, e a segunda, subordinadamente, terminando as alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: A RÉ 1ª – Nos termos do artº 661º do C P Civil, o tribunal, não pode condenar em quantidade ou em objecto diverso do que se pedir; 2ª - A autora peticionou a quantia de 4.487,58€ pelas perdas por si sofridas durante a sua incapacidade, quantia essa correspondente aos cálculos e valores por si considerados; 3ª - Nem o Mmº Juiz a quo nem a Relação podiam, com base noutros cálculos e valores (nomeadamente quanto à efectiva incapacidade), atribuir-lhe indemnização superior à peticionada; 4ª - A autora peticionou a indemnização que entendeu por bem por danos patrimoniais futuros decorrentes das perdas salariais consequentes da incapacidade de que ficou afectada para o trabalho (artºs 185º a 187º da sua petição); 5ª - Também ficou provado que a incapacidade de que ficou afectada não tinha reflexos patrimoniais na sua capacidade profissional, nem na sua carreira e não exigia sequer esforços suplementares; 6ª - Pelo que, nesse aspecto, a acção devia ser julgada improcedente, como foi; 7ª - Não tendo a autora peticionado indemnização autónoma pelo dano biológico traduzido na sua referida incapacidade, estava o tribunal impedido de lhe atribuir qualquer indemnização a esse título; 8ª - Pelo que, nessa parte, deve ser revogado o douto acórdão recorrido; 9ª - Assim não se entendendo, o dano biológico não pode ser objecto de duas indemnizações (uma pela vertente patrimonial e outra pela vertente não patrimonial), porquanto, quanto ao dano patrimonial, já foi afastada a possibilidade de indemnização, relevando apenas a vertente não patrimonial.
10ª - De qualquer modo, sempre deveria o seu montante situar-se nos limites estabelecidos no anexo IV à referida Portaria - ou seja, não excedendo em caso algum a quantia de 20.000,0€; 11ª - Devem manter-se, por mais equitativas (artº 566°, 3, do C Civil), as indemnizações por danos não patrimoniais e dano estético fixadas na douta sentença da 1ª Instância; 12ª - A manterem-se, no todo ou em parte, os valores indemnizatórios atribuídos no douto acórdão recorrido, devem os juros ser contados apenas a partir da data do mesmo douto acórdão, ex vi do disposto no artº 566°, 2, do C Civil.
13ª - Ao decidir como decidiu, o douto acórdão recorrido violou as disposições legais que ficam citadas e ainda as dos artigos 562° e 564° do mesmo diploma legal.
A AUTORA: 1ª - A idade limite a ter em conta será não a de vida activa mas sim a da esperança média de vida, que, em Portugal e para as mulheres, se situa nos 81 anos, segundo dados do INE.
2ª - No sentido de balizar os efeitos da IPP ao termo da vida efectiva e não da vida profissionalmente activa, o que aliás se entende, pois as limitações sentidas por uma pessoa que padece de alguma incapacidade reflectem-se quer no trabalho (fonte de rendimento) quer nas suas tarefas diárias, que vão necessariamente para além daquele, veja-se, a título de exemplo o Ac. do STJ, de 13.03.2003, in AJ, 47748° - 33 e o recente Ac. da Relação de Coimbra, ainda não publicado, proferido no proc° n° 141/04.5 TBSVV.C1 (3a Secção).
3ª - Mesmo sendo certo que a autora não estava profissionalmente inserida, também é verdade que tinha a expectativa de vir a singrar na área por ela...
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