Acórdão nº 2803/2005-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Abril de 2005
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I Nos autos de acção declarativa com processo ordinário em que são Autores GRUPO D, S A e outros, Ré CP-CAMINHOS DE FERRO EP, e interveniente REDE FERROVIÁRIA NACIONAL - REFER, EP, declarou-se o Tribunal incompetente em razão da matéria, em sede de audiência preliminar, cfr fls 697, nos seguintes termos (sic) «As RR são ambas empresas publicas; de acordo com o art.°. 1° do DL 405/93 de 10 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 94/97 de 23 de Agosto, passou aquele diploma - Regime de Empreitadas de Obras Públicas a ser aplicável às empresas públicas; o art.º 224° deste regime determina que são os tribunais administrativos os competentes para os litígios emergentes dos contratos de empreitadas promovidos pelas citadas empresas públicas; à data em que foi celebrado o contrato em causa não estava ainda em vigor este regime, mas por força do contrato era já aplicável o mencionado regime das empreitadas de obras públicas; por outro lado, o mencionado art.°. 224° é de carácter adjectivo, logo de aplicação imediata. Pelo exposto é que concluo como acima exposto, pela incompetência material deste tribunal, como tribunal comum e pela competência do tribunal administrativo para apreciação do litigio em causa -art.º 66º do CPC .----Absolvo da instância a Ré e a Interveniente Refer .-----Custas pelos AA a pela Interveniente D Industrial S.A..----».
Inconformados com esta decisão, recorreram os Autores e D Industrial, SA, apresentando as seguintes conclusões: - À data da celebração do contrato de empreitada que está na base do litígio, o objecto dos presentes autos, não se encontrava ainda em vigor o regime do Decreto-Lei nº 405/93, de 10 de Dezembro, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 94/97, de 23 de Agosto; - No momento da abertura do concurso que conduziu à celebração do referido contrato estava em vigor, para as empreitadas de obras públicas, o regime jurídico constante do Decreto-Lei nº 235/86, de 18 de Agosto; - É incontroverso que a Ré CP tinha, à data, a natureza de empresa publica, em face dos respectivos estatutos (Decreto-Lei nº 109/77, de 25 de Março e Decreto-Lei nº 116/92, de 20 de Junho); - O Artº 10 nº 3 do Decreto-Lei nº 235/86 estabelecia que a aplicação do mesmo diploma às empresas públicas ficaria dependente de portaria do ministro competente; - Não existia, nem nunca existiu, qualquer portaria que tornasse aplicável à Ré CP, enquanto empresa pública, o regime constante do Decreto-Lei n° 235/86; - No momento da formação do contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP, esta empresa, embora tivesse a natureza de empresa pública, não se encontrava sujeita ao regime das empreitadas de obras públicas, pelo que os contratos de empreitada celebrados pela mesma revestiam natureza privada; - Quando da assinatura do contrato de empreitada entre as Agravantes e a Ré CP, a redacção então vigente do regime jurídico das empreitadas de obras públicas - Decreto-Lei nº 405/93 - excluía expressamente a sua aplicabilidade às empresas públicas; - A remissão constante da Cláusula 11. do contrato junto aos autos para a aplicação do regime do Decreto-Lei nº 235/86 não significa que as partes tenham pretendido transformar o contrato celebrado num contrato de obra pública; - Ao incluírem a cláusula em apreço no contrato, as partes pretenderam apenas adoptar um conjunto de regras de carácter substantivo, que deveriam regular a respectiva relação a título meramente subsidiário; - As normas do regime das empreitadas de obras públicas constantes do Decreto-Lei nº 235/86 passaram a ser aplicáveis ao contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP, não porque o devessem ser directamente por força da Lei, mas por virtude de uma remissão operada por vontade das partes; - Pelo que a remissão para o mencionado regime não veio por em causa a natureza privada do contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP; - A relação contratual estabelecida entre as Agravantes e a Ré CP é, inquestionavelmente, uma relação de natureza jurídico-privada; - A Lei n° 94/97 não é, nem nunca foi, aplicável ao contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP, pelas simples razão de que o próprio Decreto-Lei nº 405/93, que viria a ser alterado por aquela lei, nunca foi aplicável ao mesmo contrato; - Com efeito, a Cláusula II do contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP manda aplicar subsidiariamente ao mesmo contrato o regime concreto constante do Decreto-Lei nº 235/86, e não o regime das empreitadas de obras públicas que, em cada momento, se encontrasse em vigor; - Ainda que se considerasse ser o Decreto-Lei nº 405/93 aplicável ao contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP, a verdade é que, também nesse caso, a entrada em vigor da Lei nº 94/97 não teria a virtualidade de alterar a natureza jurídico-privada de tal contrato, ou de passar a conferir competência à jurisdição administrativa para conhecer dos litígios emergentes do mesmo; - Desde logo, porque a Lei nº 94/97 se aplica apenas para o futuro; - A Lei n° 94/97 não contém qualquer disposição que lhe atribua eficácia rectroactiva, nem existe na mesma qualquer referência à respectiva aplicabilidade as relações contratuais por parte das entidades que passaram a estar abrangidas pelo regime do Decreto-Lei nº 405/93.
- Não existe motivo para subtrair a Lei nº 94/97 aos princípios gerais sobre a aplicação das leis no tempo, constantes do Artº 12º do Código Civil; - A Lei nº 94/97 não reveste, em si mesma, carácter adjectivo ou processual; - A Lei nº 94/97 veio alterar uma lei substantiva, na qual existia já, desde o início da respectiva vigência, uma norma adjectiva; - A Lei nº 94/97, limitando-se a alterar a redacção de duas disposições de natureza substantiva do Decreto-Lei nº 405/93, alargando simplesmente o âmbito de aplicação do mesmo diploma é, também ela, uma lei substantiva; - A entrada em vigor da Lei nº 94/97 não alterou a relação contratual anteriormente estabelecida entre as Agravantes e a Ré CP, a qual continuou a ter natureza jurídico-privada e a estar, por isso, sujeita à jurisdição dos tribunais comuns; - Os tribunais comuns são, efectivamente, os tribunais competentes para conhecer dos litígios emergentes do contrato celebrado entre as Agravantes e a Ré CP; - A decisão recorrida violou, pelo menos, o Art° 212º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, os Artºs 12º e 405° do Código Civil, o Artº 66º do Código de Processo Civil e o Artº 178º do Código de Procedimento Administrativo.
Nas contra alegações a Ré CP pugna pela manutenção do julgado.
Por requerimento de fls 502 a 504 D Industrial, SA havia solicitado a sua intervenção principal e por despacho de fls 618 foi relegada a admissibilidade de tal intervenção para sede de audiência preliminar, onde, contudo, se omitiu qualquer decisão sobre tal requerimento.
Posteriormente à audiência preliminar e por despacho de fls 752 foi decidido o seguinte «Entendo ter ficado prejudicado o requerimento de intervenção espontânea de fls 502, face à declaração de incompetência material. Remeta estes autos ao Tribunal da Relação de Lisboa.» Notificada de tal despacho, a interveniente Refer veio requerer ao Tribunal que julgasse deserto o recurso interposto uma vez que não havia sido notificada das respectivas alegações pela Agravante e considerando o tempo decorrido entre o despacho que o admitiu e o conhecimento da subida.
Foi então proferido pelo Tribunal o seguinte despacho «Antes de mais, passo a fazer um apanhado do presente processo.
Foi esta acção intentada por GRUPO D, S.A. (mandatários - Drs. … - ver fls. 178), R SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, S.A. (mandatários -Drs. … - ver fls. 19) e E, S.A. (mandatários - Drs. …. - ver fls. 20) contra CP - CAMINHOS DE FERRO, EP (mandatário, entre muitos outros, Dr. …, que, supostamente, será o Dr. … - ver fls. 169 v° e assinatura das peças processuais apresentadas em nome desta Ré), que contestou.
A fls. 282 foi requerida a intervenção principal, como Ré, da REFER, S.A., que foi admitida por...
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