Acórdão nº 02P4420 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Janeiro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | PEREIRA MADEIRA |
Data da Resolução | 16 de Janeiro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. JCT interpôs recurso da decisão proferida no processo n.º 78/01 da 2.ª Vara Criminal de Lisboa, 2.ª secção, que o condenou na pena única de 10 anos de prisão pela prática de dois crimes de abuso sexual de criança agravado p.p. pelos art.ºs 172.°, n.º 1, 177°, n.º 1 a), 30.°, n.° 1, e 79.° do Código Penal, sendo a pena parcelar do crime ocorrido entre 1996 e Fevereiro de 1999 de 8 anos de prisão e a pena parcelar do crime ocorrido entre Abril de 1999 e princípios de 2000 de 6 anos de prisão. Entende o arguido recorrente que existe nulidade insanável de todo o processo - art.ºs 119° al. b), 48.° e 49.°, n.º 1, do CPP - erro notório na apreciação da prova e que a medida da pena é excessiva; Concluiu no recurso para a Relação de Lisboa, que: 1. Quanto aos factos ocorridos em 1996 (todos os factos até à data da 2.ª denúncia, em 1999) a Mãe da menor desistiu da queixa respectiva. 2. Nos termos do art.º 178.°, n.º 1, do CPP, o crime previsto no art.º 172.° do CPP depende da apresentação de queixa. 3. Com a desistência de queixa fica impedida a sua renovação. 4. Nos termos do disposto no art.º 49.°, n.º 1, do CPP, o M.P. ficou impedido de promover o processo quanto a esses factos. 5. Daí o artifício processual que se formulou: o de criar novo processo crime onde estavam incluídos os factos descritos naquele primeiro processo como forma de se ultrapassarem os obstáculos legais. 6. Criando-se, aliás, uma injustiça relevante: o arguido esteve detido preventivamente vários meses pela prática dos factos ocorridos em Outubro de 1996 (pelos quais veio agora a ser condenado) sem que esse tempo de prisão conte para a liquidação da pena. 7. Pelo exposto, nos termos do art.º 119.° al. b), com referência aos art.ºs 48.° e 49.°, n.º 1, do CPP, deverá ser reconhecida ...a nulidade insanável de todo o processo por ilegitimidade do MP em promover a acção penal quanto aos factos de 1996. 8. ...O tribunal "a quo" errou notoriamente na apreciação da prova em julgamento não indicando qualquer facto que justifique a interrupção, em Março de 1999, do comportamento delituoso que o arguido vinha praticando sobre a sua filha menor CMMC desde 1996. 9. Com efeito, o aludido comportamento criminoso quer antes quer após o mês de Março de 1999 é exactamente o mesmo, sendo certo que pai e filha viviam sob o mesmo tecto, numa relação de proximidade que facilitava a repetição e diminuía a culpa do arguido, tudo isso sempre desde sempre até ao início de 2000. 10. A prova que admite diferente conclusão encontra-se nos depoimentos prestados pela menor em audiência. 11. Por esse motivo, considera-se que o acórdão violou o art.º 30.°, n.º 2 ao ter considerado que o arguido praticou dois crimes de abuso sexual de criança na forma continuada. 12. Ao invés, deveria ter considerado que a conduta homogénea do arguido preencheu apenas um crime de abuso sexual de criança na forma continuada. 13. Entende o arguido que a pena única aplicada de dez anos de prisão é elevada sendo de atender ao pedido da filha de que não queria ver o pai na cadeia. 14.O tribunal apenas referiu a favor do arguido o facto de ter profissão certa e, em certo ponto, não se registarem antecedentes criminais de relevo. 15. Olvidou o contexto vivencial do arguido e sua família, os quais são de origem cabo verdeana, vivendo numa barraca dum bairro de lata em condições promíscuas o que esteve de alguma maneira na base do comportamento desviante do arguido. 16. Não são prementes as necessidades de prevenção especial tanto mais que o arguido jamais voltará a repetir estes factos, sendo certo que nunca mais voltará a viver debaixo do mesmo tecto com a sua filha CMMC" Na Relação, entendeu o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, em alegações orais, que havia desconformidade entre acusação e a decisão e que, por esse motivo, a decisão recorrida devia ser anulada, já que não fora cumprido, como devia ser, o disposto no art.º 359.° do CPPenal. Entendeu igualmente que havia insuficiência da matéria de facto provada para a decisão. Porém, aquele tribunal superior, entendendo por forma diversa, sem grandes explicações, negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida. Inconformado, recorre o arguido agora ao Supremo Tribunal de Justiça, balizando com estas premissas conclusivas o campo de conhecimento do recurso: 1. Importa não confundir os factos ocorridos em 1996 e os ocorridos posteriormente a essa data! 2. Quanto aos primeiros, havia sido apresentada queixa pela mãe da menor. Durante o inquérito a representante legal da menor desistiu dessa queixa (o que ocorreu no âmbito do processo n.º 11.482/96.3JDLSB da 12.a Secção do DIAP de Lisboa). 3. Desistência de queixa a que não se opôs o arguido. Só não se verificou a homologação da mesma por entretanto o MP ter arquivado o processo. Contudo, entende o recorrente que tal desistência manteve a sua validade processual e com as suas consequências jurídicas: a não renovação da queixa relativamente a tais factos, sendo certo que à data não se colocava a questão da legitimidade da intervenção do M. P., porquanto tinha havido queixa apresentada. 4. Pelo exposto, entende o recorrente que o Tribunal recorrido, salvo o devido respeito, mal andou em confundir as questões em análise, ao adicionar os factos delituosos praticados pelo arguido em 1996 e os posteriores a essa data! 5. Quanto aos primeiros factos não tinha o MP legitimidade para deduzir acusação pública, por se verificar a situação enunciada nos arts. 48.º, 49.º, n.º 1, e 51.º, n.º 1, do CPP, com referência ao disposto no art. 116.º, n.º 2, do Código Penal. 6. Certamente por esse motivo o MP não quis 'reabrir' o anterior inquérito, pois teria a braços uma 'incómoda' desistência de queixa e teria de se pronunciar pela sua homologação, com os efeitos enunciados na lei 7. Pelo exposto considera o arguido violadas as normas contidas nos artigos referidos na conclusão n.º 5, tendo o tribunal recorrido interpretado tal normativo no sentido da inexistência de qualquer nulidade processual penal, e ao invés devia ter...
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