Acórdão nº 03B3318 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Abril de 2004

Magistrado ResponsávelLUCAS COELHO
Data da Resolução22 de Abril de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- D. A, casada, residente na freguesia de Moreira dos Cónegos, concelho de Guimarães (1), instaurou no tribunal dessa cidade, em 12 de Outubro de 2000, contra D. B, viúva de C, falecido em 23 de Dezembro de 1999, e os 5 filhos do matrimónio, casados, residentes também na mesma freguesia, acção ordinária tendente a obter a condenação dos réus - a mãe na qualidade de meeira e todos na de herdeiros aceitantes da herança do defunto - à restituição da quantia de 3.190.000$00, acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos desde 7 de Janeiro de 1997 até à propositura da acção, no valor de 837.375$00, e vincendos até integral pagamento. Neste sentido se alega na petição, por um lado, que a autora e o marido, D, emprestaram ao longo de anos ao casal da 1ª ré diversas quantias em dinheiro que a certa altura atingiam a soma global de 3.190.000$00. Com vista à restituição dessa importância, o finado emitiu na referida data de 7 de Janeiro de 1997 um cheque do mesmo montante a favor de D, o qual, endossado à demandante e apresentado a pagamento no banco sacado, foi, todavia, devolvido por falta de provisão. O processo crime a propósito movido ao sacador veio a ser arquivado por morte deste. Alega por fim a autora que os aludidos contratos de mútuo são nulos por falta de forma, visto não terem sido celebrados por documento escrito nos termos do artigo 1143º do Código Civil, formulando, em remate, os pedidos de declaração de nulidade dos mesmos negócios jurídicos, e de condenação dos réus a reconhecerem a nulidade e a restituírem o quantitativo de 3.190.000$00 acrescido dos juros acima indicados. Contestaram os réus, e prosseguindo o processo a tramitação legal, veio a ser proferida sentença, em 26 de Setembro de 2002, que julgou a acção improcedente. A apelação da autora foi outrossim votada ao insucesso na Relação de Guimarães, que negou provimento ao recurso, confirmando a decisão da 1ª instância. Do acórdão neste sentido proferido, em 26 de Março de 2003, traz a demandante revista a este Supremo Tribunal, cujo objecto, considerando a respectiva alegação e suas conclusões, à luz da fundamentação da decisão em recurso, reside na questão de saber se a acção deveria proceder, em suma, com base no enriquecimento sem causa dos demandados. II- A Relação deu como assente a factualidade considerada provada na 1ª instância, para a qual, não impugnada e devendo aqui manter-se inalterada, desde já se remete nos termos do nº. 6 do artigo 713º do Código de Processo Civil, sem prejuízo das alusões pertinentes. Trata-se, de resto, fundamentalmente, da matéria de facto que acaba de se descrever. 1. A partir desses dados factuais, considerando o direito aplicável, a sentença julgou como se disse a acção improcedente. Ponderando neste sentido a natureza do mútuo, qualificou-o em primeiro lugar como contrato real quoad constitutionem. Segundo este critério, a espécie negocial em causa não tem efectivamente carácter consensual, mas natureza real, uma vez que o contrato não se aperfeiçoa pela mera emissão das declarações negociais consentâneas com a sua tipicidade, exigindo ademais a entrega da coisa mutuada. Quanto ao critério da forma, já o mútuo deve ser qualificado, ora como contrato consensual, ora como contrato formal ou solene, consoante o valor da coisa. Na versão original do artigo 1143º do Código Civil, o mútuo de valor superior a 20.000$00 só era válido se fosse celebrado por escritura pública, e o de valor superior a 10.000$00 se o fosse por documento assinado pelo mutuário, prescindindo a lei de forma especial caso não ultrapassasse este limite. Os valores indicados receberam, todavia, actualizações no curso dos anos, operadas sucessivamente através dos Decretos-Leis nº. 190/85, de 24 de Junho, e nº. 163/95, de 13 de Julho, até se chegar à redacção actual, introduzida pelo Decreto-lei nº. 343/98, de 6 de Novembro, que os fixou em 20.000 e 2.000 €, respectivamente. Pois bem. Provando-se que a autora e o marido emprestaram durante alguns anos diversas quantias ao marido da 1ª ré e pai dos restantes réus, que ele teria de lhes restituir, isso significa que...

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