Acórdão nº 03P373 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPEREIRA MADEIRA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. O Ministério Público requereu o julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, de CJV, devidamente identificado, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelas disposições combinadas dos artigos 203º, n.º 1, e 204º, 1, al. a) e 2, al. e) do Cód. Penal. Durante a audiência de julgamento, o tribunal colectivo, depois de produzida a prova, mas antes das alegações orais, proferiu, a dado momento, o seguinte despacho (fls. 223): "Da prova produzida em audiência poderá resultar indiciada pelo arguido a prática de um crime de receptação - n.º 1 do artigo 231º do Código Penal, alteração esta não substancial da acusação, isto porque o arguido sabia que os bens apreendidos haviam sido furtados, e não obstante quis adquirir os mesmos, sabendo proibida a sua conduta." Não foi então levantada qualquer objecção a tal despacho judicial, nomeadamente por banda do arguido e o julgamento prosseguiu com a produção de alegações orais que se lhe seguiram. A final, foi proferida decisão em que, além do mais, foi julgada improcedente e não provada a acusação quanto ao aludido crime de furto qualificado, dele se tendo absolvido o arguido, «convolando-se a acusação para o crime a seguir referido: condena-se o arguido CJV, como autor material de um crime de receptação, p.p. pelo artigo 231º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão». (...) Por requerimento entrado em 5/11/02, pelo arguido foi interposto recurso do falado despacho de comunicação da «alteração não substancial dos factos», culminando a motivação com este teor conclusivo: A) O despacho recorrido viola o disposto nos artigos 1º, n.º 1, alínea f), 358º e 359º, todos do Código de Processo Penal. De facto, as alterações de facto que comunicou ao arguido após a produção da prova traduzem antes uma alteração substancial dos factos descritos na acusação já que traduzem a imputação de um crime diverso e autónomo - de receptação - daquele que lhe vinha imputado - de furto qualificado. B) Ao ter consignado o despacho recorrido que se tratava de um caso de alteração não substancial dos factos descritos na acusação, e ter procedido o Tribunal a quo em conformidade com o disposto no artigo 358º do Código de Processo Penal, violados foram ainda o princípio do contraditório e as garantias de defesa do processo criminal (artigo 32º n.º 1, da Constituição da República Portuguesa). C) Pelo que o despacho recorrido é nulo por violação dos normativos supracitados, devendo ser declarado tal vício e ordenada a sua substituição por outro que cumpra os ditames do artigo 359º do Código de Processo Penal. Termos em que deve o presente Recurso ser considerado provido, com todas as consequências legais, nos termos mencionados nas conclusões, como é de DIREITO E JUSTIÇA. E, proferido o acórdão final, do mesmo, agora confortado com o benefício de apoio judiciário, entretanto logrado, interpôs novo recurso, agora confinado a este outro rol conclusivo: A) A imputação ao arguido de um crime de receptação dolosa p.p. pelo artigo 231º, nº. 1, do Código Penal, quando na acusação lhe vinha imputada a autoria de um crime de furto qualificado, constitui alteração substancial dos factos - o que deve ser declarado. B) O Acórdão recorrido, ao considerar tratar-se de alteração não substancial, incorreu em violação dos artigos 1º, n.º 1, alínea f) e 359º do Código de Processo Penal, o que acarreta a nulidade da sentença, nos termos do artigo 379º, nº. 1, alínea b), do mesmo diploma legal. C) O elemento subjectivo do tipo de receptação dolosa - intenção de obter vantagens patrimoniais - não estava inserido no texto da acusação (nem foi inserido na comunicação efectuada após a produção de prova). Ao acolher tal elemento subjectivo a decisão condenatória incorreu em alteração substancial dos factos descritos da acusação. O que acarreta a nulidade da Sentença, nos termos dos normativos citados na conclusão anterior. D) Do mesmo modo, viola o Acórdão recorrido as garantias de defesa do processo criminal (plasmadas no artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), bem como o principio do contraditório. E) Concomitantemente, declarada que seja a nulidade da Sentença, deve o Tribunal manter a absolvição do arguido pela prática do crime de furto qualificado, mandar extrair certidão de todo o processado, ordenar o arquivamento do processo e remeter essa certidão ao Ministério Público (vide artigo 359º, n.º 1, do Código Penal). F) Sem condescender, sempre se deverão considerar como violados pelo Acórdão recorrido os artigos 40º , 50º e 71º do Código Penal. Assim como os princípios da adequação, da proporcionalidade, da necessidade e da razoabilidade das penas. Atentos todos os factos provados, e demais considerações factuais do Acórdão recorrido, impunha-se a aplicação ao arguido de uma pena de prisão, mas suspensa na sua execução. Termos em que deve o presente recurso ser considerado provido, nos termos enunciados nas conclusões, como é de D I R E I T O e JUSTIÇA! Respondeu o MP junto do tribunal recorrido defendendo em suma: 1. No caso em apreço nos presentes autos, uma vez que foi o arguido confrontado com as alterações operadas, relacionadas com a matéria imputada ao mesmo, durante a realização do julgamento, está afastada a possibilidade de tal questão constituir fundamento para anular o julgamento . 2. Na verdade, e tendo em conta a doutrina obrigatória do Assento do STJ, 1/2000, de 11.2, não foram violadas quaisquer normas no decurso do julgamento realizado e de que resultou a condenação do arguido. 3. No que concerne à pena aplicada ao arguido, tendo em conta os antecedentes criminais do mesmo no que se refere a crimes contra o património, não pode deixar de se verificar que o mesmo não sentiu o efeito das condenações anteriores. 4. Há, assim e neste caso concreto, uma necessidade acrescida de ao arguido ser aplicada uma pena que tenha em conta os factos apurados, o dolo e as necessidades de...

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