Acórdão nº 04A537 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Maio de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | PINTO MONTEIRO |
Data da Resolução | 18 de Maio de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I - "A" intentou acção com processo ordinário contra B; C; D, pedindo que sejam declaradas nulas ou anuladas todas as deliberações tomadas na Assembleia de 26.12.01; sejam declaradas ilegais as decisões da 2ª ré tomadas enquanto Presidente da Mesa da Assembleia Geral de 26.12.01; seja declarada falso o teor da acta dessa Assembleia, como excepção das deliberações e votos expressos aí referidos. Subsidiariamente, para a hipótese de improcedência do 2º pedido, pede que sejam julgadas ilegais as decisões da Mesa da Assembleia Geral
Alegou factos tendentes a demonstrar que devem ser anuladas as decisões e deliberações tomadas, na Assembleia Geral em questão
Em contestação, os réus excepcionaram a ilegitimidade das 2ª e 3ª rés e, impugnando os factos, sustentaram que a acção deve improceder e o autor ser condenado como litigante de má fé
O processo prosseguiu termos, tendo no despacho saneador sido as 2ª e 3ª rés consideradas partes ilegítimas e absolvidas da instância
Dessa absolvição e ainda do despacho que ordenou o desentranhamento da réplica, agravou o autor
Teve lugar audiência de julgamento, sendo proferida decisão que decidiu pela improcedência da acção
Apelou o autor
O Tribunal da Relação negou provimento ao agravo e julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença
Inconformado, recorre o autor para este Tribunal
Formula as seguintes conclusões: - A intervenção do notário na Assembleia não se limita à simples transcrição do declarado por quem a dirige para um documento a que se atribui a força pública, mas antes ganha sentido e alcance apenas e tão só na medida em que garante que o que aí narrou corresponde, de facto, à realidade; - Daí decorre que o que verdadeiramente se pretende com a documentação notarial da acto não é a sua força probatória plena, entendida esta como um fim em si mesmo, mas antes tudo aquilo que lhe é subjacente - a garantia de que o exarado em acto é certo, genuíno e conforme ao ocorrido, porque foi aí atestado por uma autoridade pública, isenta e independente; - Para além disso, não é indiferente, para quem o requer, a presença na Assembleia de alguém estranho aos cooperantes, ainda por cima investido de uma autoridade pública no que se refere à certificação de declarações, certo como é que o notário não se limita a narrar o declarado pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral, mas antes pode e deve atender, fazendo incluir na acta, às menções que qualquer associado lhe peça; - A presença do notário dá, assim, garantias ao cooperante que os seus direitos na Assembleia não possam ser grosseiramente violados ou, se o forem, que tais violações não deixaram de ser atestadas na própria acta, nos termos do disposto no nº 7 do artigo 46º do Código do Notariado; - Assim, se o que se pretendeu conferir ao sócio ou, como in casu, ao cooperante, quando se lhe atribuiu o direito de exigir a documentação notarial da acta, foi uma especial garantia de autenticidade e credibilidade, em termos tais que lhe permitam crer que, atenta a sua elaboração por uma autoridade pública, será a mesma conforme ao efectivamente ocorrido na Assembleia, apenas quando demonstrado que o exercício desse direito não teve como escopo a prossecução desta finalidade, mas antes objectivo diverso, em prejuízo de interesses alheios, se poderá atribuir carácter abusivo à pretensão de ver sancionada a sua violação, com a consequente anulação de todas as deliberações sociais; - Não resultando dos autos demonstrado um único facto de onde se possa retirar ter o recorrente visado prosseguir qualquer outro fim que não o de garantir a autenticidade e conformidade da acta com o ocorrido na Assembleia, resultando antes ter a própria recorrida considerado que o pedido de documentação da acta por notário correspondia ao exercício normal de um direito conferido por lei (certo como é que nunca pôs em causa a sua existência ou exercício legítimo), não pode o mesmo exercício ser considerado abusivo; - Violado que foi esse direito, e carecida que está a acta da certeza e autenticidade que apenas a intervenção notarial lhe poderia conferir, não pode, assim, ser negado ao requerente o correlativo direito a ver anuladas todas e cada uma das deliberações exaradas no documento particularmente elaborado pela Assembleia com fundamento no abuso de direito consubstanciado na ausência de prova da desconformidade entre o narrado na acta e o efectivamente ocorrido na Assembleia; - Na verdade, tendo sido, como foi, requerida a documentação notarial da acta, e tendo tal pretensão sido indevidamente desatendida, seguindo-se a reunião sem assistência do oficial público e documentada unicamente por acta lavrada no livro respectivo, invocada tal ilegalidade, não pode admitir-se como meio de prova das deliberações tomadas na reunião a acta lavrada pela Assembleia; - Donde decorre que, da circunstância de não ter sido julgado demonstrada a desconformidade entre o narrado na acta e o ocorrido na Assembleia não resulta, só por isso, o inverso, isto é, a sua conformidade; - Pelo contrário, exigida que foi, pelo recorrente, a documentação notarial da acta e não tendo esta sido elaborada de acordo com essa pretensão, jamais poderá a acta ilegalmente realizada pela Assembleia constituir meio de prova do ocorrido nessa reunião e, muito menos, poderá ser atribuído à recorrida o benefício de dar como demonstrada a conformidade de tudo o que, em violação do direito do recorrente, aí se permitiu descrever como correspondendo ao que de facto ocorreu; - Não tendo a requerida intervenção notarial sido assegurada pela recorrida, tornou-se, por isso, indemonstrável a conformidade entre tudo o que de relevante ocorreu na Assembleia e o relato da acta certo como é que, tendo esta sido elaborada através de um mero instrumento particular, é, então, necessariamente ilegal; - A ser sufragado o entendimento perfilhado no acórdão sob recurso, o recorrente, que viu negado o seu direito e interesse a ver documentado na acta, com a força e autenticidade conferida pela autoria do notário, tudo aquilo que de relevante efectivamente sucedeu nessa Assembleia, vê-se forçado a ter que demonstrar a desconformidade entre o ocorrido e o narrado, sob pena de esse seu direito não merecer a correlativa tutela legal, sancionando-se a ilegalidade cometida com a respectiva violação; - A pretendida anulação das deliberações sociais, longe de ser abusiva, mais não é do que o corolário e consequência lógica da violação de um direito legalmente atribuído ao recorrente e por este exercido à luz e na prossecução do interesse para o qual lhe foi consagrado; - Da mesma forma, não é pelo facto do recorrente ter aceite a existência das deliberações, votações e sentidos de voto exarados na acta que será abusivo o seu direito de exigir a anulabilidade, certo como é que a acta não se reconduz nem se esgota nas deliberações aprovadas ou nas respectivas votações, mas constitui antes um documento de tudo o que de relevante aconteceu na reunião; - O interesse do recorrente na documentação notarial da acta, tal como o de qualquer sócio que o requeira, não se cinge ou consome, assim, na garantia de autenticidade das deliberações, votações e sentidos de voto, mas vai mais longe que isso, pretendendo ver essa autenticidade alargada a todo e qualquer facto que, na Assembleia, tenha assumido a relevância necessária para que desse documento venha a constar, interesse que redobra de sentido quando, como é o caso, a Assembleia foi precedida de uma tentativa do recorrente colher informação sem êxito, na extensão e com o conteúdo pretendido; - Com efeito, não basta então que a mera contagem dos votos esteja certa em relação às propostas de deliberação. É preciso mais. E esse mais não deixaria de existir se o notário estivesse estado presente na Assembleia; - Aliás, se assim não fosse, isto é, se, como o acórdão concluiu, o que interessa é que as deliberações tomadas estejam consignadas em acta, então é absurdo e ininteligível o argumento que, não provada a desconformidade, nada há a anular; - E o reconhecimento efectuado, de boa fé pelo recorrente de que algumas das deliberações tomadas e os votos expressos constantes da acta irregular correspondem ao ocorrido não pode reverter contra si próprio no sentido de ser reconhecida a essa acta virtualidades de demonstração quer de todas as deliberações aí tomadas quer do que de relevante se passou naquela Assembleia; - Do exposto resulta, assim, inexistir qualquer abuso no exercício do direito do recorrente a anular todas as deliberações tomadas na Assembleia Geral de 26.12.01, contidas na acta junta aos autos e ilegalmente lavrada, pelo que, assim o decidido violou o acórdão sob recurso, por errada interpretação e aplicação, o disposto no artigo 334º do C. Civil, bem como os artigos 63º nº 7 e 58º nº 1, alínea a) do Código das Sociedades Comerciais; - Resultando demonstrado na matéria de facto assente na sentença, por um lado, que apenas alguma da documentação solicitada pelo recorrente à recorrida cooperativa, como forma de formar e esclarecer a sua convicção acerca das deliberações a apreciar na Assembleia Geral, lhe foi facultada e, provado que está também, por outro, não lhe terem sido facultadas cópias da documentação a que teve acesso, forçoso será concluir ter sido, dessa forma, violado...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 453/11.1TYLSB-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Dezembro de 2015
...mesmo. Não é, contudo, isso que vem provado, não tendo a tal respeito o recorrente demonstrado a sua tese.” – Ac. STJ de 18-05-2004, P. 04A537, in Concluímos, pois, que a deliberação em apreço é anulável, nos termos dos arts. 58º, n.º 1, al. a), e 63.º, n.º 6, do CSC…”. ... Contudo, há que ......
-
Acórdão nº 08B333 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Março de 2008
...a limitação decorrente da necessária competência territorial, se transformou em impossibilidade - neste sentido, Ac. do STJ de 18/5/2004 (Pº 04A537), in Não tendo, assim, a presença do notário sido injustificadamente omitida ou mesmo impedida. Sendo certo que, só em tal caso, a falta em apr......
-
Acórdão nº 453/11.1TYLSB-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Dezembro de 2015
...mesmo. Não é, contudo, isso que vem provado, não tendo a tal respeito o recorrente demonstrado a sua tese.” – Ac. STJ de 18-05-2004, P. 04A537, in Concluímos, pois, que a deliberação em apreço é anulável, nos termos dos arts. 58º, n.º 1, al. a), e 63.º, n.º 6, do CSC…”. ... Contudo, há que ......
-
Acórdão nº 08B333 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Março de 2008
...a limitação decorrente da necessária competência territorial, se transformou em impossibilidade - neste sentido, Ac. do STJ de 18/5/2004 (Pº 04A537), in Não tendo, assim, a presença do notário sido injustificadamente omitida ou mesmo impedida. Sendo certo que, só em tal caso, a falta em apr......