Acórdão nº 04B539 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2004
Magistrado Responsável | FERREIRA DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 25 de Março de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A" instaurou, com data de 26-1-01, acção ordinária contra B e mulher C, solicitando se declarasse que: - o preço real da cessão da quota com o valor nominal de 5.250.000$00, de que era titular no capital social da firma "D ", e cedida ao Réu marido, fora o de 17.500.000$00; - o preço real acordado para a referida cessão, e que o réu marido se obrigou a pagar-lhe, era o constante do contrato promessa de cessão de quotas de 30-2-98; - na escritura de cessão de quotas de 28-4-98 celebrada no 7° Cartório Notarial do Porto, o preço por que a quota era cedida ao réu marido, bem como a declaração de que o mesmo tinha sido recebido pela demandante, eram declarações meramente formais que não correspondiam à vontade real das partes, subsistindo, como reais e únicas, quanto ao preço por que a cessão era feita e a forma do seu pagamento, as declarações constantes do contrato promessa de 30-3-98, e que o réu marido, confessando-se devedor, se obrigou a pagar-lhe; - a falta de pagamento da quantia de 130.208$00, no dia 8-10-00, da responsabilidade do réu marido, teve como consequência que, quanto a ele, se considerassem vencidas as prestações restantes; E ainda se condenassem os RR: - a pagar-lhe a quantia de 11.848.928$00, quantia esta correspondente ao preço que faltaria liquidar pela cessão da quota do valor nominal de 5.250.000$00; - a pagar-lhe os juros de mora vencidos, no montante de 211.306$00, e vincendos. Invocou, para tanto, e resumidamente, o seguinte: - prometeu dividir uma quota que possuía na firma "D" em quatro quotas e ceder cada uma delas a outras tantas pessoas que identifica, entre elas o ora Réu, sendo o preço desta acordada cessão o de 17.500.000$00 e o sinal de 1.875.000$00, que recebeu, ficando ainda combinado que aquele pagaria uma prestação mensal de 130.208$00; - foi efectuada a referida cessão de quotas, em cuja escritura ficou a constar que a demandante declarou ceder a dita quota por preço igual ao seu valor nominal e já ter recebido o preço, o que não correspondia à verdade, sendo que o preço real e as condições da cessão acordadas foram as que constam do contrato promessa; - o réu marido, no mês de Outubro de 2000, deixou de pagar a prestação mensal a que estava obrigado, o que implicou o vencimento de todas as demais prestações, sendo, por isso, devedor da quantia de 11.848.928$00, da responsabilidade de ambos os demandados, casados entre si e que contraíram a dívida em proveito comum do casal. 2. Contestaram os RR, os quais, para além de suscitarem as excepções dilatórias de preterição de litisconsórcio necessário e da nulidade do processo por ineptidão da petição inicial, sustentaram que a diferença entre o valor do contrato- promessa e do contrato prometido era resultante de empréstimos efectuados pela A. à sociedade "D" antes da cessão, sem qualquer suporte documental e de que nenhum dos cessionários tirou proveito, tendo ainda sido acordado que esta firma liquidaria as prestações mensais em causa, o que fez até Setembro de 2000, dado, neste mês, o réu marido ter sido compelido a afastar-se da sociedade. Simultaneamente, deduziram o incidente de intervenção acessória provocada desta firma, o qual viria a ser indeferido. 3. Houve réplica. 4. No saneador, o Mmo. Juiz «a quo» julgou improcedentes as alegadas excepções. 5. Procedeu-se a julgamento com gravação da prova e, por fim, tendo o Mmo. Juiz do Círculo Judicial de Gondomar, por sentença de 12-2-03, julgado a acção totalmente improcedente, absolvendo, em consequência, os RR do pedido. 6. Inconformada, apelou a A. tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 6-10-03, concedido parcial provimento ao recurso e, consequentemente, revogado a sentença recorrida, declarando que o preço real da quota social da firma "D" cedida ao Réu marido era de 17.500.000$00, preço que este se obrigara a liquidar, e condenando-se ainda este demandado a pagar à A. a quantia de 11.848.928$00 acrescida de juros de mora vencidos no montante de 211.306$00 (a converter na correspondente importância em euros) e vincendos à taxa legal, no mais confirmando a decisão impugnada, ainda que por diferente fundamento. 7. Inconformado com tal aresto, dele veio o Réu B recorrer de revista para este Supremo Tribunal, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: 1ª- No caso em apreço, recorrida, recorrente e outros celebraram o contrato promessa que serve de causa de pedir aos autos, no qual pactuavam prestar falsas declarações perante uma autoridade pública, numa concertação de vontades contrária à lei, à ordem pública e aos bons costumes, e assumindo contornos de incriminação penal (Cfr. C. Civil, artigos 280° e 294° e C. Penal artigo 359); 2ª- Ora, a sua cominação deverá ser a nulidade prescrita pelos normativos em vigor e pelos mais elementares ditames de bom senso, a qual deverá cingir-se à amputação da cláusula inválida, por não se ter apurado nos autos a sua essencialidade para a conclusão do negócio (Cfr. C. Civil, artigo 292°); 3ª- Acresce que na prometida escritura de cessão de quotas outorgada entre recorrida, recorrente e outros o preço declarado difere do consignado no contrato promessa pelo valor dos suprimentos efectuados pela recorrida à "D", e cujo reembolso foi por ela assumido através do pagamento de todas as prestações vencidas entre a data de celebração da escritura e Setembro de 2000; 4ª- A factualidade assente permite, nesta sede, afastar a virtualidade de uma encenação simulatória destinada a ludibriar outrem. 5ª- Quer pela inexistência dos terceiros a quem estaria destinada tal maquinação, dado que intervieram no contrato promessa e na escritura prometida a totalidade do capital social...
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