Acórdão nº 04P3172 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Outubro de 2005
Magistrado Responsável | HENRIQUES GASPAR |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no STJ: 1 Acordam no plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça: 1. FAB, identificado no processo, interpõe recurso para fixação de jurisprudência do acórdão da Relação do Porto (proc. 3165/04-4ª), que, confirmando decisão do tribunal de Bragança, «julgou inaplicável o n° 6 do art° 698° do C.P.C, ao prazo fixado no n° 1 do art° 411° do C.P.P., quando o recorrente tenha impugnado a matéria de facto, pretendendo a sua reapreciação».
Como sobre a mesma questão foi proferido, entre outros, o acórdão do S.T.J. de 27/11/2002, publicado na Colectânea de Jurisprudência (STJ), Ano X, 2002, Tomo III, págs. 236 e ss., o qual no domínio da mesma legislação «proferiu decisão assente em solução oposta à do acórdão recorrido», o recorrente pede que o recurso seja admitido, e após decisão em conferência que conclua pela oposição de julgados, seja julgado procedente, com a revogação do acórdão recorrido, fixando-se jurisprudência no sentido de que «é aplicável em processo penal o disposto no artigo n° 6, do C.P.C., ex vi artigo 4° do C.P.P., no que respeita ao alargamento do prazo de recurso, se o recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova».
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Remetido o processo ao Supremo Tribunal, a Secção, em conferência, pronunciou-se no sentido da existência de oposição de julgados, determinando o prosseguimento do recurso.
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Foram apresentadas alegações pelo Ministério Público e pelo recorrente.
A Exmª magistrada do Ministério Público considera que o acórdão recorrido deverá ser mantido, e que o conflito que se suscita há-de resolver-se no sentido em que este acórdão decidiu, propondo, para o efeito, que a jurisprudência seja fixada pelo seguinte modo: «Quando o recurso tiver por objecto a reapreciação da matéria de facto e a prova tiver sido gravada, ao prazo previsto no n° l do art° 411° do Código de Processo Penal não acresce o prazo referido no artigo 698°, n° 6 do Código de Processo Civil, por este não se lhe aplicar subsidiariamente».
O recorrente, por seu lado, faz terminar a alegação com a formulação das seguintes conclusões: 1ª. Quando em processo penal, o recorrente tenha impugnado a matéria de facto, ao prazo previsto no art° 411°, n° 1, do C.P.P., acresce o prazo de 10 dias previsto no art° 698°, n° 6, do C.P,C., aplicável por força do art° 4° do C.P.P.; 2ª. "O direito ao recurso, corporizando-se como um dos elementos das garantias fundamentais da defesa, não só pressupõe como mesmo reclama que o recorrente disponha não apenas dos elementos indispensáveis à própria decisão de recorrer ou não, mas ainda daqueles dados e elementos necessários à elaboração e apresentação da própria motivação, aliás simultânea em processo penal", como seja a disponibilidade de tempo para audição e análise das cópias das gravações, para a respectiva transcrição e para a referenciação dos concretos elementos de prova que fundamentem decisão diversa da impugnada; 3ª. A impugnação da matéria de facto em processo penal determina e envolve todo um particular e muito especial circunstancialismo, a requerer e a exigir consequentemente a devida atenção, face ao ónus da especificação prevenido nos 3 e 4 do art° 412° do C.P.P., com implicações e consequências decisivas, situação "que de modo nenhum foi contemplada nem prevenida nas alterações introduzidas pela Lei n° 59/98"; 4ª. "No nosso actual sistema processual penal, a consideração única do prazo geral de 15 dias para interposição do recurso não satisfaz as referidas exigências, decorrentes desse sistema, no caso especifico de o recurso poder ter como objecto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto envolvendo a reapreciação de prova gravada"; 5ª. Já a aplicação do art° 698°, n° 6, do C.P.C., por força do art° 4° do CPP, "se harmoniza com a natureza e as regras do processo penal referentes ao recurso tendo como objecto a impugnação da matéria de facto com base em elementos decorrentes da gravação das declarações prestadas em audiência"; 6ª. Inexiste norma no processo penal que directamente ou por analogia, possa regular o caso, o que legitima o recurso à citada norma processual civil, por remissão do art° 4° do C.P.P.; 7ª. A verificada oposição de julgados deve ser resolvida no sentido propugnado pelo Acórdão fundamento, fixando-se, em consequência, jurisprudência que determine que "é aplicável em processo penal o disposto no artigo 698°, n° 6, do C.P.C., "ex vi" artigo 4° do C.P.P., no que respeita ao alargamento do prazo de recurso, se o recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova"; 8ª. Foram violados os artigos 698°, n° 6 do C.P.C, e 4° do C.P.P..
Termina, pedindo que o recuso seja julgado procedente, fixando-se jurisprudência no sentido de que «é aplicável em processo penal o disposto no artigo 698°, n° 6. do C.P.C., ex vi artigo 4° do C.P.P., no que respeita ao alargamento do prazo de recurso, se o recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova».
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Colhidos os vistos, nos termos determinados pelo artigo 442º, nº 3 do Código de Processo Penal, cumpre apreciar e decidir.
Tal como foi verificado pela Secção, o acórdão recorrido e o acórdão fundamento decidiram de modo divergente a mesma questão de direito.
O acórdão recorrido, com efeito, invocando expressamente a discordância com jurisprudência anterior do Supremo Tribunal, julgou inaplicável em processo penal a norma do n° 6 do art. 698° do CPC, que estabelece que no caso de o recurso ter como objecto a reapreciação da matéria de facto, o prazo de interposição é acrescido de 10 dias.
Por seu lado, o acórdão invocado como fundamento, considerando que existia uma lacuna no que respeita à regulação do prazo de recurso em processo penal quando o recorrente pretenda a reapreciação da matéria de facto e haja prova gravada, resolveu idêntica situação aplicando ao processo penal a referida norma de processo civil por força do disposto no artigo 4º do Código de Processo Penal.
As decisões invocadas são, pois, contraditórias sobre a decisão da mesma questão de direito, tendo sido proferidas no domínio da mesma legislação.
Existe, assim, tal como decidiu a Secção, oposição de julgados.
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