Acórdão nº 05B489 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Maio de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução05 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou, no Tribunal Cível de Lisboa, acção declarativa, sob a forma de processo comum ordinário, contra "B", pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de 14.978.348$00, correspondente ao capital em dívida (13.267.077$00) e aos juros de mora vencidos até à data da apresentação em juízo, no montante de 1.711.271$00, bem como os juros vincendos, à taxa legal de 10% ao ano, acrescida do imposto de selo que for devido pelos mesmos, sobre o capital em dívida, até integral e efectivo pagamento.

Alegou, para tanto, em síntese, que: - em 27 de Julho de 1993, foi nomeado vogal do Conselho de Administração da ré; - este cargo, para efeito de remuneração, era equiparado a subdirector geral da Função Pública; - o mandato conferido ao autor tinha a duração de quatro anos, cessando em 27/07/97; - porém, no dia 7 de Agosto de 1995, a ré exonerou o autor do cargo de vogal do Conselho de Administração, sem precedência de processo disciplinar e sem se basear em justa causa; - à ré assistia o direito de revogar o mandato conferido ao autor, antes da data fixada para o respectivo termo (art. 1170°, n° 1, do Código Civil), mas, porque o mesmo era oneroso e foi revogado antes do decurso do respectivo prazo, a ré constituiu-se na obrigação de o indemnizar nos termos do disposto na alínea c) do art. 1172° do Código Civil; - o autor auferia mensalmente a quantia de 326.480$00, com subsídio de férias e de Natal, e estava-lhe atribuído o uso e fruição de uma viatura automóvel, marca Toyota Carina E, cujo combustível, seguro e manutenção eram suportados pela ré e que para ele representava a vantagem económica anual correspondente a 1.125.000$00; - a despesa média mensal de combustível era de 38.784$00, seguro de 21.262$00, manutenção de 9.269$00, valor de aquisição da viatura de 4.500.000$00; - a ré pagava ainda mensalmente ao autor um complemento de telefone, no valor mensal de 9.641$00; - o valor da indemnização a que o autor tem direito deve ser calculado em função da compensação que o mandato lhe deveria proporcionar, se não tivesse sido revogado antes da data fixada para o respectivo termo, importando tal compensação em 13.267.077$00.

Contestou a ré e deduziu reconvenção, pedindo que o autor seja condenado a pagar-lhe a quantia de 4.763.020$00, acrescida de juros de mora à taxa legal, então de 10%, desde a data em que se dever considerar notificado da reconvenção.

Alegou, essencialmente, que: - à data da nomeação do autor, o prazo de mandato dos membros do Conselho de Administração era de 3 anos, uma vez que a alteração estatutária do prazo do mandato de 3 para 4 anos se verificou no decurso do exercício de funções pelo autor, pelo que o mandato conferido a este cessaria em 27/07/96; - não é verdade que a cessação não se haja fundado em justa causa, pois o Conselho de Fundadores baseou a sua deliberação na constatação da incapacidade dos membros do Conselho de Administração para a prossecução dos objectivos da ré e para assegurar o desempenho do mandato, quer actualmente, quer face às estratégias novas necessárias para remédio das anomalias observadas; - tratando-se de mandato destinado ao exercício de gestão de uma pessoa colectiva, a inadequação do mandatário, a sua incapacidade quanto à prossecução dos fins da Fundação, constitui uma justa causa de revogação, como se retira, com patente analogia, do disposto no art. 257°, n° 6, do Código das Sociedades Comerciais; - a utilização da viatura e o custeio pela ré dos respectivos encargos (combustível, seguro, manutenção), bem como o pagamento de custos de telefone particular, só podem ser entendidas como prestações remuneratórias; - ora, cabe ao Conselho de Fundadores da ré a competência, em exclusivo, para a fixação da remuneração dos membros do Conselho de Administração, nos termos dos arts. 9°, n° 1, e 10°, n° 4, do Estatuto da ré; - nunca o Conselho de Fundadores deliberou atribuir ao autor prestações pecuniárias ou em espécie, para além do vencimento mensal fixo equivalente ao cargo de subdirector geral da Função Pública, designadamente a utilização de veículo para uso pessoal, o combustível, o seguro e a manutenção correspondentes, ou o pagamento de despesas do seu telefone particular; - foi o próprio Conselho de Administração a que o autor pertenceu que, com o voto favorável deste, concedeu regalias aos seus membros; - as deliberações e orientações tomadas pelo autor e demais membros do Conselho de Administração ampliaram, consequentemente, o valor da sua retribuição, à margem da intervenção do Conselho de Fundadores, contra deliberação expressa deste Conselho e sem competência para o efeito; - são, ainda, deliberações nulas, não podendo produzir qualquer efeito quanto ao pretendido cálculo da indemnização peticionada; - o autor, enquanto vogal, determinou a ré à realização de prestações remuneratórias que o beneficiaram, à revelia de qualquer deliberação do órgão competente em contrário da deliberação sobre a matéria por este tomada; - o prejuízo sofrido pela ré afere-se pelo valor do ilegítimo benefício alcançado pelo autor, que foi de 4.763.020$00.

Houve réplica do autor, nomeadamente contestando a reconvenção.

Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria quesitada, vindo, depois, a ser proferida sentença que: a) julgou a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 4.836.766$00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento; b) julgou a reconvenção improcedente, por não provada, absolvendo o reconvindo do pedido reconvencional.

Inconformada apelou a ré, interpondo o autor recurso subordinado, ambos sem êxito, já que o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 29 de Abril de 2004, decidiu pela improcedência dos recursos, confirmando a decisão recorrida.

Interpôs, então, a ré recurso de revista, pugnando pela revogação ou anulação do acórdão recorrido.

Em contra-alegações defendeu o recorrido a manutenção da decisão em crise.

O Tribunal da Relação de Lisboa, pronunciando-se quanto à invocada nulidade do acórdão, nos termos dos arts. 668º, nº 4 e 744 do C.Proc.Civil, considerou não ocorrer aquela nulidade.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

Nas alegações do recurso formulou a recorrente as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. A justa causa não assume, na cessação do mandato, a configuração de facto impeditivo do direito à indemnização, sendo a sua inexistência, ao invés, um facto constitutivo (negativo), cuja arguição, caracterização e prova pertence a quem se arroga o direito, pelo que, entendendo o contrário, o acórdão violou o disposto nos arts. 342º e 344° do Código Civil.

  1. Ainda que assim não se entendesse, os factos concretamente alegados pela recorrente e por ela demonstrados enquadram-se nas motivações expressas na deliberação de exoneração do Conselho de Fundadores, mormente quanto a não ter o recorrido perfil adequado a reequilibrar os fundos próprios da Fundação ou a diminuir a dependência de subsídios externos, como decorre das respostas dadas aos quesitos 13°, 14°, 15°, 18°, 19°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24° e 25°.

  2. Acresce, se assim também não se entendesse, que, face à verificação, constante da sentença, de que a recorrente é um instrumento para a concretização de determinadas políticas na área da sua actividade, erradamente a obediência a essas políticas, materializada na deliberação de cessação do mandato, assume a natureza de justa causa objectiva.

  3. De modo que o acórdão recorrido, mantendo a condenação da recorrente no pagamento de indemnização por revogação do mandato sem justa causa, cometeu erro de julgamento com violação do disposto no art. 1172° do Código Civil.

  4. A considerar-se a existência de justa causa, os juros de mora incidentes sobre a importância de indemnização devem ser calculados a partir da citação da apelada, sendo neste sentido que deve ser lida e compreendida a parte decisória da sentença quanto à acção.

  5. Colocada ao Tribunal da Relação de Lisboa a questão do cômputo dos juros apenas a partir da citação, o acórdão recorrido omitiu completamente a apreciação da questão, pelo que se cometeu a nulidade prevista no art. 668°, n° 1, alínea d), do Código de Processo Civil (omissão de pronúncia).

  6. Foi o próprio recorrido quem, para sustento da acção, alegou a utilização de viatura para fins pessoais, a vantagem económica que isso para si representava, o valor desta, os custos suportados pela recorrente quanto a...

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