Acórdão nº 05B691 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Maio de 2005 (caso NULL)

Data05 Maio 2005
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" e B intentaram, no Tribunal Cível do Porto, acção declarativa comum na forma ordinária contra C e esposa D, pedindo que os réus fossem condenados: a) a reconhecer ao autor marido a qualidade de sucessor de E; b) a restituir à massa hereditária o lugar de garagem, parte integrante da fracção D do prédio sito na Rua Aires Ornelas, nºs..., do Porto; c) a indemnizar a massa hereditária dos prejuízos emergentes do "lucro cessante" decorrentes da "ocupação ilícita" do lugar de garagem e que à data da petição computaram em 990.000$00, acrescidos de 30.000$00 mensais até à sua efectiva entrega; d) no pagamento dos respectivos juros de mora contados desde a ocupação ilícita até ao efectivo pagamento da indemnização, e que vencidos às taxas legais computaram, à data da petição, em 163.250$00.

Alegaram, para tanto, que: - são herdeiros de E, mãe do autor, falecida em Dezembro de 1993, de cujo acervo hereditário faz parte a fracção autónoma D do prédio sito na Rua Aires Ornelas nºs ... do Porto, que é constituída por uma habitação no 2º andar, esquerdo, com entrada pelo nº ... e que dela faz parte um lugar de garagem na cave com entrada pelo nº ..., por a referida E a haver recebido também em herança de sua filha, solteira, F, falecida antes daquela, em Novembro de 1993, e que a havia comprado em 28 de Outubro de 1986 a G; - no entanto, os réus ocupam o lugar de garagem na cave, sem que para tal tenham qualquer título legítimo, e recusam-se a largar mão dele em favor dos autores, com isso causando prejuízos a estes, uma vez que se mostram impossibilitados de retirar dele as vantagens económicas que obteriam se o mesmo não estivesse ocupado.

Requereram, ainda, a intervenção principal provocada de H e esposa I e de J e esposa K, demais herdeiros e respectivos cônjuges.

Contestaram os réus sustentando, em síntese, que: - corre já uma acção proposta por G contra os aqui autores e demais intervenientes, em que se pretende ver reconhecido o efeito contrário do aqui visado; - com efeito, nessa acção ataca-se a nulidade da aquisição, por parte de F, em 28/10/1986, à G; - os réus ocupam o lugar de garagem legitimados por autorização e consentimento desta.

Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria de facto controvertida, após o que foi proferida sentença que, julgando a acção totalmente procedente por provada: a) declarou o autor marido e os intervenientes H e J sucessores de E; b) em consequência condenou os réus a restituir à herança que estes representam o lugar da garagem que integra a fracção "D" do prédio sito na Rua Aires Ornelas, nºs ..., no Porto; c) e bem assim, a pagar à mesma herança a quantia de 990.000$00 (4.938,10 Euros) acrescida de 30.000$00 (149,64 Euros) mensais contados desde 12/09/96 até efectiva restituição do citado lugar de garagem, e os respectivos juros de mora à taxa legal calculados e contados mensalmente desde 12/12/93 até se verificar a ordenada restituição.

Inconformados apelaram os réus, com parcial êxito, porquanto o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 12 de Outubro de 2004, revogou a sentença recorrida na parte em que condenou estes a pagarem aos autores as quantias aí determinadas, confirmando-a na parte restante.

Interpuseram, desta feita, os autores recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que confirme a decisão da 1ª instância.

Em contra-alegações defenderam os recorridos a bondade do julgado.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

Nas alegações do recurso formularam os recorrentes as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. O acórdão em crise considera provados os factos alegados nos artigos 8° a 12°, 16°, 18° a 21°, 23°, 25° e 35° a 38° da contestação dizendo a fls. 427 que os mesmos ficaram provados na acção n° 2000/94, em que foi autora G e réus os recorrentes e outros, herdeiros da E, herdeira única da F (n°1 do CPC), com o que se discorda.

  1. Diz o art. 522°, n° 1, do CPC, que a parte interessada não carece de repetir num segundo processo os meios de prova, depoimentos e arbitramentos, já feitos num primeiro processo, bastando invocar o meio de prova, "os depoimentos e arbitramentos".

  2. Quais são, e onde estão os meios de prova apresentados pelos réus, a certidão com o depoimento de parte ou as transcrições ou gravações de inquirição de testemunhas ou o relatório do arbitramento feito no Proc. n° 2000/94 que permitem ao acórdão em crise aplicar o art. 522°, n° 1, do CPC? A resposta é fácil: em lado nenhum.

  3. A circunstância desses factos (conclusão), todos reportados à F, terem sido considerados provados no Proc. nº 2000/94 nem sequer os torna realidade entre os ali réus (os aqui autores e outros) e a autora, G, fora do Proc. n° 2000/94 (art. 673°, 1° segmento, do CPC).

  4. Por maioria de razão não pode o acórdão em crise considerá-los realidade entre partes diferentes e num processo diferente.

  5. O uso numa acção de depoimentos importados de outra acção "não se confunde com a insindicabilidade pelo STJ da matéria de facto (CPC - 729º, 1 e 2)", conforme o Acórdão do STJ de 13/01/2004 (Proc. n° 3642/03 da 2ª secção), está assim sujeita ao controle do tribunal de revista pois envolve a violação da lei do processo como é o caso dos autos.

  6. A exercitação da faculdade fiscalizadora pela 2ª Instância (art. 712°, n° 1, a), só é possível com a rigorosa delimitação nas conclusões de recurso das indicações a que alude o art. 522°-C, indicação do lado, cassete, início e termo dos depoimentos questionados ou dos que impunham diferente decisão conforme o disposto nos arts. 690° e 690-A (redacção do Dec. lei n° 183/2000 de 19/8) todos do Cód. Proc. Civil.

  7. O acórdão recorrido exerceu o poder fiscalizador sobre o seguinte: "16. Impunha-se uma resposta negativa aos factos 1° e 2° constante da base instrutória; 17. Entendeu o M° Juiz a quo, com base nos depoimentos produzidos em sede de audiência de julgamento, considerar provados os dois factos constantes da base instrutória; 18. Entendem, no entanto, os aqui recorrentes, que uma correcta apreciação e valoração dos depoimentos das duas únicas testemunhas arroladas pelos recorridos, bem como dos depoimentos das testemunhas arroladas pelos recorrentes, levaria a que tais factos fossem dados como não provados; 19. Aliás estranhamente, nenhum contrato de arrendamento foi junto aos autos a comprovar a efectiva renda cobrada pelo arrendamento da habitação, sem o lugar de garagem; 20. Por outro lado, temos os depoimentos das testemunhas L e M, que contrariam em absoluto a matéria dada como provada" (fls. 423).

  8. A total ausência da indicação do início e termo das faixas da gravação (rotações) onde constam os depoimentos questionados e os que impunham uma decisão diferente não permite a reapreciação da decisão de facto.

  9. Não se trata de excesso de formalismo, mas sim do cumprimento da lei, desde logo para permitir aos autores aqui recorrentes o contraditório, que assim não foi possível.

  10. O acórdão recorrido na ausência de preenchimento dos requisitos a que alude a lei processual (9ª a 11ª conclusões) fez um uso ilegal do disposto no art. 712°, n° 1, a), do Cód. Proc. Civil.

  11. Considera o acórdão recorrido (fls. 429 e segs.) que "ficou provado, através da certidão junta do Acórdão do STJ, proferido no Proc. 2000/94, que a propriedade da fracção D, como incindível que era... Assim, o réu C ocupava a titulo legítimo o lugar de garagem até ao momento em que foi definida por trânsito em julgado, que o lugar de garagem não poderia considerar-se autonomizado...", com o que igualmente se discorda.

  12. O decidido pelo Acórdão do STJ de 25/11/2002 (de fls. 223 a 235) foi que o contrato de compra e venda da fracção D celebrado entre a F e a G é válido, questão prévia suscitada nestes autos a fls. 162; subsidiariamente que os recorrentes e outros (réus no Proc. n° 2000/94) não tinham a obrigação...

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