Acórdão nº 9447/14.4TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | MARIA ERMELINDA CARNEIRO |
Data da Resolução | 14 de Junho de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo número 9447/14.4 T3DPRT.P1 Comarca do Porto – Maia - Instância Local – Secção Criminal – J1 Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:I - RelatórioNestes autos de processo comum singular supra identificado, em que é arguida e demandada civil B…, (identificada nos autos), após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença, onde se decidiu nos seguintes termos (transcrição parcial): «Por todo o exposto, julgo a acusação particular totalmente improcedente por não provada e consequentemente, absolvo a arguida B…, pelo cometimento, em autoria material de quatro crimes de difamação cometidos através de meios de comunicação social, p. e p. pelos artigos 180º, nº1 e 183º, nº2 do C.Penal.
Mais julgo totalmente improcedente o pedido de indemnização civil deduzido contra a demandada/arguida, quer a título de danos patrimoniais, quer a título de danos não patrimoniais.».
Inconformado com a decisão proferida, dela recorreu o Assistente/Demandante Civil, C…, nos termos que constam a fls. 1293 a 1391, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição com exceção da matéria provada no acórdão cível e da sentença recorrida insertas nas conclusões 9 e 17): «CONCLUSÕES:1ª.
O Recorrente, Assistente e Demandante Civil no supra referenciado processo em que é Arguida e Demandada Civil D. B…, não podendo conformar-se com os erros e a Injustiça de que enferma a sentença, vem interpor Recurso de toda a decisão (matéria penal e matéria civil) com impugnação de decisão sobre a matéria de facto e sobre a matéria de direito.
2ªO Assistente não se pode conformar com a sentença proferida no processo supra referenciado e que julgou a acusação particular totalmente improcedente por não provada e consequentemente, absolveu a arguida B…, pelo cometimento, em autoria material de quatro crimes de difamação cometidos através de meios de comunicação social, p. e p. pelos artigos 180°, n°1 e 183°, n°2 do C. Penal, e outrossim julgou totalmente improcedente o pedido de indemnização civil deduzido contra a demandada/arguida, quer a título de danos patrimoniais, quer a título de danos não patrimoniais.
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O Recorrente deduziu:
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Enquanto Assistente - Acusação particular contra a Arguida B… por autoria material na forma consumada da prática de quatro crimes de difamação p. e p. pelos artigos 180º e 183º, 2 do Código Penal; e b) Enquanto Demandante Civil – pedido de indemnização civil com fundamento designadamente no disposto nos artigos 2º, 12º, 20º e 25º da Constituição da República Portuguesa e nos artigos 70º, 72º e 483º do código Civil.
3ªO Ministério Público “para efeitos do disposto no artigo 285º, nº 1, do CPP, acompanhou a acusação particular deduzida pelo Assistente, pelos factos da mesma constantes, bem como quanto à sua qualificação jurídica, por integrarem a prática de quatro crimes de difamação com publicidade p. e p. pelos artigos 180º e 183º, nº 2 do C. Penal”.
4ªO Mmº Juiz “recebeu a acusação particular deduzida pelo Assistente, acompanhado do Mº. Pº. pelos factos e enquadramento legal nelas mesmas referidos” e mandou autuar “como processo comum com a intervenção do tribunal singular – não obstante a “matéria penal” ser da competência do Tribunal coletivo, nos termos do art.º 14º do CPP –,em prejuízo do Princípio do Juiz Natural, o que procurou sanear no inicio do julgamento, com recurso, à posteriori, ao disposto no artigo 16º, nº 3, do CPP.
5ªNos dias que precederam o julgamento alguma imprensa referiu-se à matéria do julgamento dos presentes autos como uma questão já julgada e decidida nos meios de comunicação social, e fê-lo de forma a explorar os sentimentos e emoções, com o contributo interessado da Defesa, que, ademais, escolheu explorar a exposição da Arguida e de propiciar apelos de movimentos anti praxes, de familiares de vítimas D…, entre outros – “que poderiam usar o Metro como meio de transporte” – para populares se manifestarem em frente do tribunal nos dias do julgamento, o que se verificou, com maior incidência na primeira sessão de julgamento, a favor da Arguida contra o Assistente.
6ªO julgamento do presente processo foi rodeado de um clima emocional propiciado pela pressão jornalística que o antecedeu e acompanhou, com evidente parcialidade em benefício da tese dos movimentos anti praxe, aqui com manifesto fervor militante e particularmente imprudente. Aliás, no decorre do julgamento, na prática assistiu-se a uma inversão das partes, pois quem pareceu ser julgado foi o Assistente, que se sentiu julgado sem uma acusação e sem correspondentes meios de defesa.
Aliás, o Assistente, transformado em Arguido, sem acusação, foi censurado pelo Julgador e pelo Representante do Ministério Público, repetidas vezes, designadamente por não deduzido queixa em 2004 contra a jornalista que fez a primeira reportagem, apesar do Assistente se ter justificado que, aquela reportagem visava toda a Tuna, e também o Assistente e o Departamento Jurídico da Universidade, ter informado os H2…, entre os quais o Assistente, de que iria agir judicialmente contra a jornalista, o que não aconteceu, e do que o Assistente só teve conhecimento depois de esgotado o prazo do direito de queixa.
Outrossim, o Assistente, sentiu-se injustiçado, além do mais, com a observação do Julgador de que a declarada dor do Assistente pela perda de um colega e amigo e pela dor da mãe não é comparável a dor da mãe, pois o Assistente não desconhece que a dor da mãe pela perda precoce de um filho deve ser imensa, e é neste reconhecimento que deve ser aferida a genuinidade da declaração, e, ademais, certamente o Julgador não ignora que o Assistente é J… (desde os 5 anos) com naturais dificuldades de discurso, com hiatos e com naturais atrasos na pronunciação das palavras e construção das frases.
7ªArguida, no seu interrogatório, como aliás na própria contestação, confessou os factos da acusação, que se passam a descrever (factos constantes dos artigos 140º a 144º da acusação: “140º Numa entrevista (Integral) publicada no E…, edição online, de 30 de Janeiro de 2014, que aqui se dá por integralmente transcrita: - A uma pergunta do Jornalista (F…) sobre se o G… “não queria preocupar os pais...”, a D. B…, afirmou: “Claro, se a gente soubesse... Sabe que entre eles (reportando-se a todos os elementos da Tuna Académica da Universidade H…) há um secretismo muito grande. Há um código. Mas mais. Eles roubavam-lhe roupa. Eram uns miseráveis. Desde meias a boxers, a camisas. (...)”; - E a outra uma pergunta do mesmo Jornalista sobre se “a PJ nunca consegue chegar a incriminar ninguém da tuna pelo sucedido?”, a D, B…, afirmou: “Não. Há dois suspeitos que é um tal I… e o gago (J…)”, é este o nome de código na Tuna, do Assistente;” “141º Esta entrevista ainda está publicada e disponível na internet, como se verifica através do doc. nº 1 junto com a queixa”; “142º Em entrevista gravada e passada (imagem e som) na K…, no dia 30 de Janeiro de 2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida, e na K1… Jornal K3…, a D. B… declarou que, relativamente ao falecimento de seu filho G…, “há dois suspeitos, um I… e um C… (o aqui Assistente), que foram considerados suspeitos”.
“143º - Em entrevista, no Programa da “K2…” da K1…, de 5 de Fevereiro de 2014 (imagem e som), que aqui se dá por integralmente reproduzida, a D. B…, relativamente à morte do seu filho G…, declarou, designadamente: - “Existem dois suspeitos”; “Fizeram um pacto de silêncio”, querendo referir-se a todos os elementos da Tuna; - “Chamaram-no para o matar”; - “O Diretor do Hospital e o meu cunhado diziam que o médico (denunciante) era «maluco»”; - “(...) justiça é meter dentro da cadeia os assassinos do meu filho, porque há dois, um tal C… e um I…”.
“144º E em entrevista, no Programa da L… da “L1…”, de 11 de Fevereiro de 2014 (imagem e som), que aqui se dá por integralmente reproduzida, a D. B…, relativamente ao falecimento do seu filho G…, declarou designadamente: - “Há suspeitos”; - “Estamos a falar de marginais”, querendo referir-se a todos os elementos da Tuna;- “Há dois suspeitos”; - “A morte (do G…) tem rosto: os dois suspeitos são os assassinos do meu filho”;- “Há um pacto de silêncio” querendo referir-se aos membros da Tuna.
A carga difamatória das expressões da Arguida supra referidas, proferidas por intermédio da comunicação social, ofensivas da dignidade do Assistente, determinaram a queixa e a acusação que nos traz ao julgamento e à sentença ora sindicada.
8ºA decisão da matéria de facto peca por excessiva no manancial de matéria de facto provada tendente à justificação ou desculpabilização dos crimes de difamação, inclusive com matéria juridicamente irrelevante e ou ilegítima, e por defeito na matéria não provada que inculca a não justificação.
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O Tribunal a quo decidiu da seguinte forma a matéria de facto que considerou, em muito pontos infundadamente, relevante:
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Considerou provada a seguinte matéria de facto: (…) b) Considerou não provada a seguinte matéria de facto: (…)10ªNo julgamento da matéria de facto, ao Tribunal compete analisar criticamente as provas – juridicamente relevantes – com recurso às presunções legais, com observância do princípio da aquisição processual, da livre apreciação – que exige autonomia, materialidade e objetividade – e prudência – (ou seja liberto de subjetividade, de emoções, e das pressões da alguns órgãos de comunicação social que, in casu, esteve sempre pressente), com a apreensão de todos os elementos probatórios, relevante e admissíveis, existentes no processo.
E é dever do Juiz cumprir uma das suas funções fundamentos da sua razão de ser e der existir, enquanto elemento que procura a verdade material possível com a finalidade de prestar um bom serviço ao cidadão e de fazer Justiça. E a verdade é que o cidadão Assistente viu denegada a Justiça da Dignidade de Pessoa e da sua personalidade com Direitos.
11ªA decisão sobre a matéria de facto, apesar da sua cuidada fundamentação, peca...
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