Acórdão nº 97P456 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Outubro de 1997 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA GUIMARÃES
Data da Resolução30 de Outubro de 1997
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Perante o Tribunal Colectivo na Comarca de Santa Comba Dão, respondeu, em processo comum, o identificado arguido A, o qual, após julgamento, veio a ser condenado como autor de um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158 n. 1, do Código Penal revisto de 95, na pena de 9 (nove) meses de prisão. Julgado foi, também, parcialmente procedente o pedido cível de indemnização contra ele formulado pela ofendida-lesada B, pelo que condenado foi a pagar àquela, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, a quantia de 200000 escudos. Interpôs o arguido dois recursos: um primeiro que se consubstancia na motivação de folhas 92 e seguintes, reagindo ao indeferimento duma requerida documentação das declarações orais prestadas em audiência, através dos meios técnicos disponíveis no tribunal e quanto à determinação no sentido da audiência de julgamento decorrer com exclusão de publicidade; e um segundo, em que se insurge contra o acórdão final proferido (motivação de folhas 109 e seguintes), recurso este por via do qual subiu aquele primeiro, face ao disposto nos artigos 406 n. 1, 407 n. 3 e 408 n. 1, alínea a), todos do Código de Processo Penal. (Cfr: despacho de folha 106). No que tange ao primeiro recurso interposto, a motivação apresentada foi concluída, pelo arguido, desta sorte: A decisão violou o artigo 363 do Código de Processo Penal na medida em que o Tribunal dispunha de meios técnicos e de pessoal qualificado, aliás só assim se entendendo o anterior despacho do Juiz titular do processo que deferiu a documentação de declarações orais; Com ela se pretende prevenir a correspondência entre a prova que é produzida e a que resulta do julgamento; Dada a natureza do próprio processo, tal não acarretaria tão pouco qualquer delonga processual, tanto mais que o Tribunal se encontra equipado e com pessoal qualificado para usar os meios técnicos de gravação que ali se encontram instalados; Desta forma e face aos legítimos receios do recorrente, se impossibilitou uma relativa reapreciação da prova pelo Tribunal; Por outro lado a decisão de jus desvirtuou a regra da publicidade da audiência consagrada constitucionalmente - artigo 20 da Constituição da República Portuguesa, violando consequentemente este citado artigo, gerando inconstitucionalidade que se invoca; No caso em apreço não há justificação jurídica, científica ou filosófica, que permita discricionariamente proceder-se à audiência de julgamento à porta fechada em detrimento da regra da publicidade conforme o artigo 87, do Código de Processo Penal também violado; O Tribunal fez uma incorrecta interpretação da regra; Como se disse, inexiste fundamentação jurídica, científica ou filosófica neste caso que justifiquem a decisão, posto que a salvaguarda da dignidade da ofendida, face ao crime de que o arguido vem acusado, não é posta em crise, nem a de outras pessoas tão pouco, assim como não há que salvaguardar, por disso não necessitar a moral publica, nem o normal funcionamento da audiência foi alguma vez posta em crise; Devem aquelas decisões ser revogadas, porquanto numa se justificava a documentação de declarações orais - artigo 363, do Código de Processo Penal e noutra não se justificava a exclusão ou tão pouco a restrição da publicidade da audiência de julgamento; Consequentemente, a revogar-se aquelas decisões, verificar-se-á uma nulidade insanável - artigos 119 e 321, n. 1, ficando por isso inválida a audiência e as actas posteriores. No que se reporta ao segundo recurso interposto, os conclusivos da motivação apresentada foram os seguintes: A sentença viola o artigo 410 n. 2, alínea a), do Código de Processo Penal; Dos autos não consta nem foi feita prova em julgamento que permitissem o Colectivo enveredar pela via da condenação, isto é, se é certo que o Tribunal é livre de apreciar a prova produzida, artigo 127, do Código de Processo Penal, não é menos certo que a matéria de facto apurada não é suficiente, conjugada com as regras da experiência comum para levar à condenação, nos termos em que foi proferida a sentença recorrida e tal é susceptível de censura pelo Supremo Tribunal; Já que é insuficiente a matéria de facto apurada para a decisão de direito; Deve revogar-se a sentença recorrida, absolvendo-se o arguido, por insuficiência da matéria de facto apurada, com todas as legais consequências, incluindo a do pagamento da indemnização a que foi condenado. No concernente ao primeiro recurso interposto, ofereceu a digna magistrada do Ministério Público a douta resposta de folhas 124 e seguintes, na qual concluiu no sentido de que "nada obstava ao registo da prova no caso em apreço..." e no de que a "proibição de assistência a acto processual é um acto dependente da livre resolução do juiz, não sendo, deste modo recorrível, razão pela qual nesta parte deve o recurso interposto pelo arguido não ser conhecido". De todo o modo, não se ficou por aqui a ilustre magistrada, convindo recordar as premissas que a levaram também a concluir em que "... bem andou a Meritíssima Juiz titular do processo no deferir a pretensão do arguido". É, pois, da dita resposta que se respiga o que segue para melhor compreensão de uma outra questão que está em causa. Ali se escreveu: "Resulta dos actos que em 10 de Janeiro de 1997 o arguido veio requerer, ao abrigo do preceituado no artigo 363, a documentação das declarações orais a prestar na audiência de julgamento aprazada para o dia 23 daquele mês, uma vez que o tribunal dispunha do equipamento técnico e pessoal para o efeito. A Meritíssima Juiz titular do processo, concordando... deferiu tal pretensão por despacho datado de 16 de Janeiro. Contudo no início da audiência de julgamento o tribunal colectivo, entendendo que não estava vinculado pelo anterior despacho da Meritíssima Juiz titular do processo, pronunciou-se sobre tal requerimento no sentido do seu indeferimento por, em sua opinião, perante o tribunal colectivo, não existindo, em regra, duplo grau de jurisdição em matéria de facto, não ter aplicação o estabelecido naquele normativo. Ora, afigura-se-nos que o tribunal colectivo não tinha poder jurisdicional para se pronunciar sobre o dito requerimento uma vez que o mesmo tinha já sido objecto de despacho da Meritíssima Juiz titular e o caso não se enquadrava nas situações a que alude o artigo 666 n. 2 do Código de Processo Civil, aplicável por força do preceituado no artigo 4 do Código de Processo Penal. Na verdade dispõe o artigo 666 n. 1 do Código de Processo Civil que "proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa". Por sua vez o n. 3 deste normativo diz-nos que "O disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes aplica-se até onde for possível, aos próprios despachos". Este regime é aplicável ao processo penal pois este é omisso sobre tal matéria impondo-se assim, colmatar tal lacuna mediante o recurso ao Código de Processo Civil. Acresce que o tribunal de Círculo de Viseu não foi até ao momento presente instalado pelo que a competência para preparar os processos penais até à audiência de julgamento é do tribunal da Comarca e do Juiz titular do processo, atento o preceituado no artigo 55 n. 6 do Decreto-Lei n. 214/88 - Regulamento da Lei Orgânica dos Tribunais - e deste modo afigura-se-nos legítimo concluir que o poder jurisdicional no que concerne ao requerimento do arguido se encontrava extinto mercê do despacho sobre ele proferido...

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