Acórdão nº 0111116 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Março de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ORLANDO GONÇALVES |
Data da Resolução | 05 de Março de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em audiência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
Relatório Pela -ª Vara Criminal de Competência Mista do Tribunal Judicial da Comarca de....., sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo: José....., solteiro, nascido a 01/05/73, na freguesia de....., filho de Manuel..... e de Maria....., residente na Praça....., ....., ....., e João....., divorciado, empregado de escritório, nascido a 31/06/63, na freguesia de....., ....., filho de João..... e de Emília....., residente na Rua....., ....., ....., actualmente detido no E.P. de....., imputando-se-lhes a prática dos factos constantes de folhas 107 a 110 dos autos, pelos quais teriam cometido: - O arguido José....., um crime de homicídio por negligência grosseira, p. e p. pelo artigo 137º, nºs 1 e 2, do Código Penal, e um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação, p. e p. pelo artigo 3º, nº 2, do Dec.-Lei nº 2/98, de 3/1; e - O arguido João....., um crime de favorecimento pessoal, p. e p. pelo artigo 367º, nº 1 do Código Penal.
A fls. 315 dos autos, os demandantes e a demandada civis efectuaram transacção quanto ao pedido de indemnização civil, que foi homologada por sentença de fls. 316.
Após audiência de discussão e julgamento, por acórdão de 2 de Maio de 2001, o Tribunal Colectivo julgou parcialmente procedente, por provada a acusação pública e, em consequência, decidiu: - Absolver o arguido C do crime por que vinha acusado; - Condenar o arguido José..... na pena de dois (2) anos e seis (6) meses de prisão, pela prática de um crime de homicídio por negligência grosseira, p. e p. pelo artigo 137º, nº 1 e 2, do Código Penal e na coima de 100.000$00 (cem mil escudos), pela prática da contra-ordenação ao artigo 124º, nº 1 e 3 do Código da Estrada de 1994.
- Nos termos do artigo 141º, do Código da Estrada, foi ainda o arguido José..... inibido de conduzir veículos automóveis pelo período de um (1) ano.
Inconformado o arguido José..... recorreu para este Tribunal da Relação do Porto, concluindo na sua motivação: 1º - Da enumeração dos factos considerados provados consta que a vítima seguia a pé, fora da faixa de rodagem, tendo o arguido, não conseguindo dominar o veículo por forma a mantê-lo na faixa de rodagem por onde circulava, invadido a berma, embatendo na vítima com a frente do lado esquerdo do veículo que conduzia.
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- A sobredita factualidade foi considerada provada na instância recorrida, não obstante o arguido, que confessou os factos descritos na acusação, descrevendo o atropelamento em causa, negar ter invadido a berma, fundando-se a convicção do Tribunal Colectivo tão só no croquis de fls. 9 dos autos.
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- Ademais, o participante do acidente, a testemunha António....., não presenciou o atropelamento, elaborando o aludido croquis com base numa mera dedução, como o próprio expressamente reconhece em audiência de julgamento.
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- Considerar provados tais factos revela um notório erro na apreciação da prova produzida, em clara violação do princípio "in dúbio pro reo", e com nefastas consequências no tocante à determinação da medida concreta da pena aplicada.
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- Com efeito, se o acórdão recorrido peca por excesso na parte em que dá por provados os factos descritos em 1, por outro lado, peca por defeito ao não valorar (nem positiva nem negativamente) o facto de o arguido ter afirmado que a vítima carregava um tronco que arrastava na parte interior da faixa de rodagem.
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- Com o descrito nas precedentes conclusões violou-se o art.379.º, n.º l , al. c) do Código de Processo Penal.
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- Por outro lado, verificou-se em audiência de julgamento uma alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, susceptível de conduzir à condenação do arguido por crime diverso do constante da acusação, ou seja, pela prática de um crime de omissão de auxílio, previsto e punido pelo artigo 200.º do Código Penal, tendo tal alteração sido comunicada ao Ministério Público, para que este proceda pelos novos factos.
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- Contudo, a matéria de facto em causa - constituindo uma alteração substancial para os efeitos da alínea f) do artigo 1º da lei adjectiva - foi atendida e determinante da decisão de excluir a aplicação ao caso sub judice o perdão e a amnistia previstos na Lei n.º 29/99, de 12 de Maio, em contravenção ao disposto no art.359.º n.ºl do Código de Processo Penal.
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- O desvio do tema da prova que se deu notícia supra determinou, ainda, a prática da nulidade do acórdão, na parte respeitante à inaplicabilidade do perdão e amnistia previstos na referida Lei 29/99, nos termos do disposto no art. 379º, nºs. 1 e 2 do Código de Processo Penal.
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- Não tendo o arguido sido condenado pelo crime, de omissão de auxílio, nem se julgando verificados os elementos integrantes do referido crime, que serão apurados em sede própria, deve o arguido beneficiar do sobredito perdão, 11º - Devendo aguardar-se pela decisão final, onde se decidirá definitivamente pela verificação - ou não - do crime de omissão de auxílio e, consequentemente, da aplicação ou inaplicabilidade do disposto no artigo 2º n.º 1 alínea c) da Lei n.º 29/99 (cfr. Acórdão, do Tribunal da Relação do Porto, de 28 de Junho de 1995, in www.dgsi.pt).
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- Tendo sido tal prova valorada e tida em conta no acórdão recorrido estar-se-à na prática a julgar o arguido duas vezes pelo mesmo crime, uma vez que a mesma prova será tida em conta para uma eventual condenação pelo crime de omissão de auxílio, originando o mesmo facto, eventualmente, duas condenações violando-se assim, o art. 29.º, n.º 5 da Constituição.
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- O Tribunal recorrido condenou o arguido pela contra-ordenação prevista no Código da Estrada de 1994 sem que se tenha feito qualquer prova em audiência sobre essa matéria e sem haver qualquer elemento constante dos autos que confirme esses mesmos factos.
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- De facto, a decisão do Tribunal recorrido, em virtude da completa ausência de prova relativamente à contra-ordenação, é completamente omissa na sua motivação quanto a estes factos, achando-se violadas assim as disposições dos art.ºs 58 ,n.ºl al. b) do D.L. 433/82 de 27 de Outubro e 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, o que determina a nulidade do acórdão em consonância com o art.º 379.º, n.º1, al. a) do Código de Processo Penal.
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- De qualquer forma, apesar da ausência completa e total de prova que levasse à condenação do arguido pela prática da contra-ordenação em causa, certo é que tal infracção prescreveu - tendo em conta a data da prática da mesma - nos termos das disposições conjugadas dos art.º s 124.º do Código da Estrada, e 17.º, n.º1 e 27.º al. b) do D.L. 433/82 de 27 de Outubro.
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- Pelo exposto violou o acórdão recorrido os art.s 32.º,n.º2 e 29.º, n.º 5 da Constituição, os art.ºs 410.º, n.º 2 al. a), 359.º, n.º l, 379.º, 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, os art.ºs 17.º, n.º l, 27.º, al. b) e 58.º, n.º1, al. b) do DL 433/82 de 27 de Outubro e os art.ºs 1.º n.º l e 2, n.º l al. c) da Lei 29/99 de 12 de Maio.
Nestes termos, deve o acórdão recorrido ser declarado nulo e em consequência ser remetido o processo para novo julgamento quanto ao crime de homicídio por negligência grosseira e absolvido o arguido da prática da contra - ordenação prevista no art.º 124.º do Código da Estrada.
Respondeu ao recurso a Ex.ma Procuradora da República na Comarca, defendendo que o douto acórdão recorrido não enferma do vício aludido, no art. 410.º, n.º 2 , al. a) do C.P.P, por ter feito uma correcta apreciação da prova produzida em audiência de julgamento; que o arguido não beneficia do perdão concedido pela Lei nº.29/99 de 12/5, por ter sido apurado em julgamento a prática de factos integradores do crime de omissão de auxílio, p. e p. no art.º 200º, n.ºs 1 e 2 do C. Penal; que deve ser declarado extinto, por prescrição, o procedimento pela contra-ordenação pelo qual o arguido foi condenado; e que no mais deve ser mantido o douto acórdão recorrido, não tendo sido violado o disposto nos art.ºs 32.º, n.º 2 e 29.º, n.º 5 da Constituição, 410.º, 359.º, 379.º e 374.º do C.P.P. e 1.º e 2.º da Lei n.º 29/99 de 12/5 ou qualquer outro preceito legal.
O Ex.mo Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação do Porto emitiu parecer no sentido de que deverá ser julgado prescrito o procedimento pela contra-ordenação, mantendo-se, no mais, o acórdão recorrido.
Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º2 do Código de Processo Penal respondeu o arguido/recorrente, concluindo como na motivação e conclusões de recurso.
Por despacho de 14 de Novembro de 2001, foi notificado o arguido/recorrente para, sob pena de não conhecimento do recurso que versa a matéria de facto, dar integral cumprimento ao disposto no art.412.º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Penal.
O arguido/recorrente apresentou de seguida um requerimento de esclarecimento da motivação de recurso, em que concluiu: 1º- O arguido dá aqui por integralmente reproduzidas as conclusões apresentadas nas alegações de recurso.
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- O Tribunal "a quo" deu como provado que a vitima seguia fora da faixa de rodagem baseando-se no croquis de fls. 9 e no depoimento do agente da G.N.R. supra transcrito, no entanto o arguido afirma que a vitima seguia em cima da linha delimitadora da faixa de rodagem e a testemunha Isabel..... que passou pelo local do acidente pouco depois, afirma que a vitima jazia a apenas um metro da faixa de rodagem, pelo que deveria ter-se considerado provado que a vitima caminhava em cima da linha delimitadora da faixa de rodagem e não fora dela, não tendo por consequência o veiculo que tripulava o arguido invadido a berma; 3º- Não existindo qualquer testemunha presencial do acidente não podia o Tribunal "a quo" dar como provado que o arguido guiava sem a atenção devida e deveria ter dado como provado que a vitima carregava um tronco de cerca de dois metros no seu braço direito como afirma o arguido; 4º- O Tribunal "a quo" deu como provado que o arguido embateu com a frente do...
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