Acórdão nº 0342387 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Outubro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelANTÓNIO GAMA
Data da Resolução22 de Outubro de 2003
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de S M Feira foi a arguida Sandra..., condenada como autora material de um crime, p. e p. pelo art. 40º n.º 2 do DL 15/93 de 22/01 em 90 (noventa) dias de pena de multa ao quantitativo diário de 3 € (três Euros), num total de 270 € (duzentos e setenta Euros) com 60 (sessenta) dias de prisão subsidiária.

Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs o presente recurso rematando a pertinente motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: Constando dos factos provados que "o produto estupefaciente detido pela arguida seria suficiente para o consumo da mesma durante pelo menos 15 dias, caso fosse esse o destino do produto", e que o mesmo se destinava "a fim não concretamente apurado" e vindo a arguida a ser condenada como autora de um crime p. e p. pelo art.º40º, n.º 2, do Decreto Lei n.º 15/93 de 22.01 (consumo) verifica-se contradição entre a matéria de facto dada por provada e a decisão proferida, ou seja, face aos factos provados impunha-se uma decisão oposta, o que acarreta a necessidade da renovação da prova nos termos prescritos no art.º 430º do Código Processo Penal.

O crime de tráfico de estupefacientes não exige nos seus elementos tipificantes que a droga se destine à venda, bastando a simples detenção ilícita da mesma; desde que ela não se destine na totalidade ao consumo próprio do agente.

Verificando-se, pois, que a arguida detinha na sua posse um saco plástico com 24,70 gramas de um produto vegetal prensado denominado resina de cannabis, dois comprimidos de cor verde com uma substância activa denominada MDMA, sete comprimidos de cor branca Logo Dexter, contendo a mesma substância activa; e sete comprimidos de cor verde, Logo Ferrari, contendo a mesma substância (MDMA), é de puni-la pelo crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art.º 25º n.º 1 alínea a), do Decreto Lei n.º 15/93 de 22.1, ainda que o tribunal não tenha considerado provado, nem que aqueles produtos se destinavam a ser vendidos a terceiros, nem que se destinavam ao seu próprio consumo.

É que a contestação, de que no julgamento se não logrou fazer prova, de que os produtos detidos pela arguida se destinavam ou não a cedência a outrém, não pode reverter a seu favor. Não é aplicável ao caso o princípio "in dubio pro reo".

Na vigência do art.º 40º do Decreto Lei n.º 15/95 de 22.1 entendia-se que a detenção de produto estupefaciente por período superior a três dias afastaria a aplicação de tal artigo enquadrando-se tal detenção no art.º 25 do mencionado diploma legal.

Decorre do art.º 28º da Lei 30/2000 que foi revogado expressamente o artigo 40º, passando o consumo de estupefacientes a ser regulado no seu art.º 2º, sendo que os elementos objectivos são idênticos em ambos os normativos.

Do mencionado art.º 2 resulta que se considera consumo a detenção de produto estupefaciente suficiente para o consumo médio individual durante o período de 10 dias, período esse superior ao consagrado no art.º 40º. Ora tendo o legislador regulado o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, Lei 30/2000, alargando a quantidade que se permite deter para efeitos da sua consagração como consumo e revogando expressamente o anterior normativo que regulava a situação, tem forçosamente que se concluir que todos os casos que excedam o limite permitido nessa lei deixam de enquadrar-se no instituto legal do consumo.

Assim, não há que "repristinar" o art.º 40 quando a detenção de estupefacientes excede a quantidade permitida pelo art.º 2º, n.º 2 da lei 30/2000 de 29 de Novembro.

A situação em causa nos autos enquadra-se no crime de tráfico de menor gravidade p. e p. no art.º 25º, n.º 1 al. a) do Decreto Lei n.º 15/93 de 22.1, uma vez que a arguida detinha o produto estupefaciente em causa nos autos, o qual a mesma destinava a vender, sendo certo que a ilicitude do facto se considera consideravelmente diminuída, nomeadamente tendo em conta os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das drogas.

Tendo a arguida sido condenada como autora de um crime p. e p. no art.º 40º, n.º 2, da Lei 15/93 de 22.1, o tribunal interpretou erradamente o disposto no art.º 28º conjugado com o art.º 2º da Lei 30/2000 de 29 de Novembro.

Requer o reenvio do processo para novo julgamento ou se assim se não entender a condenação da arguida pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25º do Decreto Lei n.º 15/93 de 22.1.

Admitido o recurso, a arguida respondeu concluindo pela manutenção da decisão recorrida.

Já neste Tribunal o Ex.mo Procurador Geral Adjunto foi de parecer que o recurso merece provimento.

Cumpriu-se o disposto no art.º 417º n.º 2 do CPPenal, tendo a arguida concluído pela manutenção da decisão recorrida.

Após os vistos realizou-se audiência não tendo sido suscitadas nas pertinentes alegações novas questões.

Factos provados: No dia 28 de Julho de 2001, pelas 00h40, na Praça Professor Leão, nesta cidade de Santa Maria da Feira, a arguida tinha na sua posse, dentro de uma mochila, um saco de plástico com 24,270 gramas de um produto vegetal prensado denominado resina de canabis, dois comprimidos de cor verde com uma substância activa denominada MDMA; sete comprimidos de cor Branca "Logo Dexter", contendo a mesma substância activa; e sete comprimidos de cor verde, "Logo Ferrari", contendo a mesma substância (MDMA).

A referida resina de canabis está prevista na Tabela I-C anexa ao Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, e a substância activa presente nos referidos comprimidos consta da Tabela II-A, anexa ao citado Decreto Lei.

A arguida tinha comprado as referidas 24,270 gramas de resina de canabis em Vila Real, onde trabalhava na altura, por preço não apurado, e destinava-a, tal como os referidos comprimidos MDMA, a fim não concretamente apurado.

O produto estupefaciente detido pela a arguida seria suficiente para o consumo da mesma durante pelo menos 15 dias, caso fosse esse o destino do produto.

Na altura a arguida auferia cerca de 500 € por mês como acessora informática.

A arguida agiu de livre vontade e consciente de que praticava actos proibidos por lei, conhecia a natureza e as características daqueles produtos e sabia que não podia detê-los consigo nem cedê-los ou vendê-los a outrém.

A arguida não tem antecedentes criminais.

A arguida é aprendiz de bordadeira, auferindo cerca de 300 € por mês. Reside com a mãe e padrasto.

Não se provou que: A arguida tenha adquirido a resina de canabis por 10.000$00.

A arguida destinasse a referida substância bem como os referidos comprimidos de MDMA à venda a consumidores desses produtos.

O tribunal fundou a sua convicção: No exame pericial de fls. 33.

No CRC de fls. 13 No depoimento da arguida que confessou os factos que lhe vinham imputados, afirmando, no entanto, que adquiriu aquele produto para consumo próprio durante as férias. Afirmou que na altura trabalhava em Vila Real e que antes de vir de férias se abasteceu aí de produto estupefaciente, porque conhecia, nessa cidade, os fornecedores.

Depôs ainda afirmando que adquiriu a totalidade de haxixe por 22.000$00.

Embora o seu depoimento em audiência de julgamento tenha sido contraditório com o depoimento prestado em sede de 1º interrogatório quanto ao tempo de duração do produto, de ambos resulta que o produto seria suficiente para pelo menos 15 dias de consumo.

Os agentes que procederam à sua detenção não presenciaram a venda de qualquer produto, não tendo qualquer indício que a mesma alguma vez se tivesse dedicado ao tráfico.

Assim, embora a quantidade de produto aprendido seja já relevante, ficam sérias dúvidas de qual o seu destino - o consumo próprio da arguida ou a venda.

A arguida depôs ainda quanto à sua situação pessoal.

*O Direito: A factualidade apurada não despertou ou mereceu qualquer reparo ao recorrente nem à recorrida. Porém o conhecimento dos vícios a que alude o art.º 410º n.º2 do Código Processo Penal é oficioso, Ac. do Plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça de 19.10.1995 DR, Iª série, de 28 de Dezembro, pelo que se impõe averiguar se a decisão recorrida padece de alguns dos vícios referidos nesse normativo.

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