Acórdão nº 113/09.3GBCV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Julho de 2010
Magistrado Responsável | MOURAZ LOPES |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: IMPROCEDENTE Legislação Nacional: ARTIGOS 292º E 69º/1 ALÍNEA A) DO CP, 152º 153º Nº 8,156º DO CE E 4º DA LEI N.º 18/2007) Sumário: 1.O condutor de veículo, desde que esteja em condições de o fazer, e podendo embora incorrer na prática de um crime de desobediência, pode recusar-se a submeter-se ao exame de detecção de álcool ou de substâncias psicotrópicas, assuma este a forma de colheita por ar expirado ou por exame ao sangue.
2 A lei não impõe ou exige que se formule um pedido expresso de consentimento de quem tem que sujeitar-se ao exame de recolha de sangue para efeitos acima referidos.
Decisão Texto Integral: 21 No processo Comum Singular nº 113/09.3GBCV.C1 do Tribunal Judicial da Covilhã o arguido P. foi condenado pela prática de «um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p.p. pelo artigo 292º n.º 1 do Código Penal na pena de sessenta dias de multa à razão de 8 euros o que perfaz o montante de 480€. Foi ainda condenado na proibição de conduzir veículos com motor pelo período de três meses (artigo 69º n.º 1 a) do CP) e ainda condenado a pagar as custas do processo fixando-se em 1 UC a taxa de justiça acrescido de 1% sobre a mesma a favor do Fundo de Apoio às Vítimas de Crimes Violentos e nos encargos.
Não se conformando com a decisão, o arguido interpôs recurso para este Tribunal da Relação.
Nas suas alegações o arguido conclui a sua motivação nos seguintes termos: «I. Nos presentes autos, ficou provado, que nunca foi solicitado ao arguido qualquer autorização, por qualquer forma, para o sujeitar à recolha de sangue que serviu de base ao exame de alcoolemia no sangue constante dos autos.
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Tal falta de informação ou de obtenção de consentimento do arguido, entendemos é motivo suficiente para considerar inadmissível tal recolha de sangue, aliás como já foi e muito bem decidido no Acórdão da Relação do Porto, de 9.12.2009 ( — Proc.1421/08.6PTPRT.P1, o qual segue aliás, o entendimento, de decisão do Tribunal Constitucional (n.Q 275/2009, de 27-05, DR, 2 Serie, n. 129, de 07/07/2009.
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Na verdade, não se poderá nunca concordar com a exclusão de aplicação de tal doutrina e jurisprudência ao presente caso, como veio fazer, o Meritíssimo Juiz a quo, quando os pressupostos de declaração de nulidade da prova são exactamente os mesmos quer num quer noutro caso.
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Nesta parte, também nunca se poderá aceitar ou consentir (expressa ou tacitamente) que em matéria de validação ou legalidade dos meios de obtenção e recolha de prova em processo penal se aplique, sem mais, a figura do consentimento presumido, prevista no artigo 382 do Código Penal.
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Na verdade, e aliás como já é jurisprudência assente, “O consentimento presumido assume sempre carácter subsidiário, no sentido de que só é legítima a sua invocação quando não for possível obter a manifestação expressa da vontade ou houver perigo sério na demora” conforme Acordão da Relação de Coimbra, de 28-04-2009(in http://www.dgsi. pt/ jtrc. nsf/0/e96337e8b7f6cc8f802575ba004875e8?O pen Docume jj proc. n. 92/08.4GDCTB-A.C1).
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No caso do autos, não se verificou qualquer dessas duas situações excepcionais, dado que nem sequer foi questionado ou informado o arguido de que lhe iria ser recolhido sangue para qualquer efeito de recolha de prova.
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Aliás, a aplicação de tal figura de consentimento presumido, nos termos propostos e apresentados na decisão recorrida, seria uma verdadeira revogação, tácita, de todos os princípios e limites constitucionais à intromissão na vida privada, plasmados no nosso Código de Processo Penal.
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Refira-se, por último, que, no presente caso, e atentas as normas e o diploma legal que estabelece a recolha e obtenção dos meios de prova em matéria de exames de álcool — artigos 152 e seguintes do Código da Estrada -, a recolha de sangue nem sequer é, efectivamente, obrigatória ou essencial no apuramento do estado de alcoolemia de qualquer condutor, dado que, em ultima análise se prevê que o estado de embriaguez seja aferido por exame médico! IX. Assim, jamais se poderá concordar ou aceitar que, neste ou em qualquer outro caso, se obtenha e recolha sangue como meio de obtenção de prova para efeitos penais, sem o consentimento expresso do arguido ou ordem legal e judicialmente legítima.
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Nestes termos, e nos demais legalmente admissíveis, que certamente V. E.xas se dignarão suprir, terá de se concluir, que nesta matéria de validade de recolha e obtenção de sangue como meio de prova sem consentimento expresso do Arguido, será sempre considerada como prova inadmissível, por ser proibida por lei.
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Concluindo-se assim que a colheita de sangue para fins de obtenção de prova, ao abrigo dos actuais artigos 152 n. 3, 1S3Q, n. 8 e 156 n. 2, todos do Código da Estrada, na redacção dada pelo DL 44/2005, de 23 de Fevereiro — sendo este último preceito já desde a redacção dada pelo DL 265-A/2001, de 28 de Setembro — sem possibilitar ao condutor a sua recusa, está ferida de inconstitucionalidade orgânica.
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E consequentemente, a concreta recolha de sangue ao arguido ora recorrente que serviu de base para apurar o seu grau de alcoolemia, constitui prova ilegal, inválida ou nula, que não pode produzir efeitos em juízo.
XIII Pelo que deve revogada a decisão proferida nesta matéria, na douta sentença recorrida, e declarar-se a nulidade da referida prova.
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Sem a admissão e validação da recolha de sangue não se poderiam dar como provados factos, que serviram de base e fundamentação á condenação do arguido.
XV.Na verdade e atenta a nulidade supra invocada, que aqui se reproduz, jamais se poderia dar como provado que o arguido apresentava uma taxa álcool no sangue de 1,20g/I XVI. Aliás, também não se poderá como provado que no momento que o arguido embateu numa outra viatura, apresentava a taxa de álcool no sangue supra identificada, dado que consta dos autos e da prova produzida que no local do acidente não foi realizado qualquer exame ao arguido, para aferir de tal taxa.
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Nem existe nos autos qualquer elementos que identifique o momento em que foi realizada a recolha de sangue, ilegal, ao arguido, apenas se sabendo que foi em momento posterior ao referido embate.
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Do mesmo modo, jamais se poderia dar como provado o ponto 4 dos factos provados em face do único elemento de prova existente - as declarações do arguido, já anteriormente identificadas! XIX. Do mesmo modo e pelo que já foi supra referido — designadamente o estado de saúde do arguido após o acidente que sofreu, não se poderá aceitar que se tenha considerado como não provado, os pontos a) a c) dos factos não provados.
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Pelo que, forçosamente, terá a sentença recorrida ser revogada e rectificada em tais aspectos.
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Existindo inequivocamente uma contradição insanável na fundamentação da decisão e que resulta, expressamente, do texto da mesma.
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Tal é vício, gerador de nulidade da decisão, é previsto no artigo 41O n 2, alínea b) do Cód. Processo Penal e é fundamento para o presente recurso.
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Por outro lado, e atenta, a manifesta inadmissibilidade da única prova e dos argumentos legais e factos usados para sustentar tal fundamentação não admitida por lei, verifica-se que, toda a fundamentação legal e factual para a imputação do crime de condução em estado de embriaguez, inexiste! XXIV. Pelo que, obviamente, carece de sentido e fundamento tudo o que foi invocado para sustentar e justificar a condenação do arguido, e como tal estará forçosamente prejudicada toda a inerente fundamentação.
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Resulta que, em audiência de discussão e julgamento, todos os...
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