Acórdão nº 3988/05.1TTLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução21 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Doutrina: - Luís Miguel Monteiro e Pedro Romano Martinez, in Código do Trabalho Anotado, 6ª edição, 311.

Legislação Nacional: - CÓDIGO DO TRABALHO : - ARTIGOS 10.º, 97º, 98.º, 99.º, N.º4, 105.º, 127.º. - CÓDIGO CIVIL : - ARTIGO1152º.

Sumário : I - O contrato de trabalho representa o acordo negocial segundo o qual uma pessoa se obriga a prestar a sua actividade, mediante retribuição, a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta, tendo-se como elementos concretizadores do mesmo: (i) a emissão confluente de vontades entre o empregador e o trabalhador; (ii) que a vontade do trabalhador seja expressada no sentido de ele assumir a obrigação de prestar uma dada actividade a outrem, pautando esta de acordo com as ordens, instruções e indicações que lhe forem transmitidas pelo empregador, submetendo-se, assim, à autoridade deste último; (iii) que o empregador assuma a recepção da actividade prestada pelo trabalhador, segundo os parâmetros supra indicados, e se obrigue a prestar a este uma contrapartida por tal recepção.

II - O dever ou os especiais deveres de informação consagrados nos artigos 97.º e 98.º do Código do Trabalho que se acobertam no princípio da boa fé, quer nos preliminares, quer na formação dos contratos, não têm directa projecção na caracterização do contrato firmado ou firmando, em termos de, sem o seu cumprimento, se concluir que eles são necessários para o desenho dessa específica forma negocial.

III - Estando demonstrado que a R., no âmbito de um processo de selecção que levou a efeito, e após ter realizado entrevistas individuais com alguns candidatos, convocou o A para uma reunião, no dia 27 de Setembro de 2004, onde o Presidente do Conselho de Administração comunicou ao A que era o candidato escolhido e lhe apresentou uma proposta de emprego, oferecendo-lhe esta empresa, como contrapartida, um determinado vencimento mensal ilíquido; serviço gratuito de cantina; integração no plano automóvel da companhia, com acesso a viatura e plafond anual de combustível; telemóvel da empresa e integração no plano médico da companhia, tendo, então, sido acordado que o A. começaria a trabalhar na R. no dia 21 de Outubro de 2004, e que teria de realizar exames médicos, é de afirmar que se estabeleceu entre o A. e a R. um verdadeiro contrato de trabalho, embora sujeito a uma condição e a termo suspensivo inicial.

IV - O art. 127.º do Código do Trabalho/2003 quando comanda que ao contrato de trabalho pode ser aposta, por escrito, condição suspensiva nos termos gerais, não exige que esse escrito seja firmado pelo trabalhador.

V - Estando demonstrado que o A., em 8 de Outubro de 2004, efectuou testes médicos na R., efectivação que constituía condição para a sua admissão na mesma, e não tendo esta provado que desses exames resultaram condições de saúde do A. não permissoras da realização da actividade para que fora contratado, sendo assim de concluir que, aquando daquela data, o contrato se encontrava já a produzir os seus efeitos.

VI - Assim, ao comunicar a R., ao A., em reunião ocorrida entre 9 a 20 de Outubro de 2004, que a sua admissão ao seu serviço, não se podia concretizar já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer, é de concluir que procedeu à cessação do contrato de trabalho por motivos que não foram fundados na faculdade prevista para o período experimental (art. 105º CT/2003), nem numa conduta do A. justificativa dela, pelo que, tal cessação, tem de ser considerada como um despedimento ilícito.

VII - Sendo o despedimento ilícito está a R. obrigada a indemnizar o A. pelos danos sofridos, nos termos gerais.

Decisão Texto Integral: 1.

No 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa instaurou o Licº AA contra BB…., S.A.

, acção de processo comum, solicitando a condenação da ré a pagar-lhe € 48.190 e juros desde a citação.

Para tanto, invocou que: – – em 27 de Setembro de 2004, ele, autor, foi convocado pelo presidente do conselho de administração da CC… […], S.A.

, o qual lhe comunicou que ele tinha sido o candidato escolhido para exercer o cargo de director financeiro daquela empresa, tendo-lhe sido apresentada uma proposta de emprego baseada em determinadas condições, entre as quais as de aceitar o lugar proposto até ao fim de Setembro daquele ano, de modo a começar a trabalhar em 21 de Outubro seguinte, proposta essa posteriormente confirmada por e-mail; – após o autor expressar a sua anuência à proposta, cujos proventos e regalias eram superiores em cerca de mais de € 23.190 anuais relativamente aos auferidos na empresa DD…, Ldª, na qual, então, desempenhava as funções de director financeiro, apresentou a renúncia deste cargo, no qual laboraria até 20 de Outubro de 2004; – em 13 de Outubro do referido ano, o autor foi convocado pela direcção de recursos humanos da CC, tendo-lhe, no dia seguinte, sido dito que, por se verificarem mudanças na política daquela empresa para o sector de gás, ficava sem efeito o seu processo de admissão, já que ela estava prestes a ser vendida à ré; – a decisão, súbita e injustificada, da CC causou enormes prejuízos patrimoniais ao autor, que renunciou às funções que desempenhava no DD…, Ldª, e causou-lhe também enorme dano não patrimonial devido aos sofrimentos e angústias de que padeceu por se ver em tal situação, dano este que deve ser ressarcido por uma indemnização não inferior a € 25.000; – o DD…, Ldª, veio a readmitir o autor, embora impondo-lhe diversas condições penosas.

Contestou a ré, que sustentou a sua absolvição, impugnando parte do articulado pelo autor e defendendo, em súmula, que na reunião para que o autor foi convocado em 27 de Setembro de 2004 foi-lhe, desde logo, transmitido que era plausível que todo o negócio do gás da CC poderia, a nível mundial, ser alienado, o que poderia influenciar o processo de admissão do mesmo autor, sendo que este, não obstante, reiterou o seu interesse na contratação, assumindo o risco e ficando sujeito a um período experimental de 180 dias, e sendo ainda que o autor não chegou a despedir-se do DD…, Ldª, e a CC propôs-lhe toda a ajuda de que carecesse, incluindo serviços de outplacement, o que foi recusado.

Prosseguindo os autos seus termos, dispensando-se a elaboração da selecção da matéria de facto, após julgamento veio, em 14 de Agosto de 2008, a ser proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a ré do pedido.

Inconformado, apelou o autor para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por acórdão de 25 de Março de 2009, julgando parcialmente procedente a apelação, condenou a ré a pagar ao autor € 16.271 e juros desde a citação até integral pagamento.

  1. Desta feita, a irresignação provém da ré, que pediu revista.

    Tendo ela rematado a alegação adrede produzida com mui extensas «conclusões», que, praticamente, reproduziam o que constava do «corpo alegatório», não sendo sequer feita qualquer das indicações a que se reporta o nº 2 do artº 690º do Código de Processo Civil (na redacção anterior à emergente do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto) determinou o relator que a mesma viesse a formular «conclusões» de harmonia com o que se prescreve nos números 1 e 2 daquele artigo.

    Na sequência, a ré, veio a apresentar o seguinte quadro conclusivo: – “

    1. Como refere Monteiro Fernandes in Direito do Trabalho, 13ª Edição, Almedina, pág. 296, ‘a formação de qualquer contrato resulta de duas declarações negociais: a proposta e a aceitação. Conforme se conclui, além do mais, do disposto nos arts, 233º e 234º do Cód. Civil, da proposta – que exprime a iniciativa de um dos sujeitos – devem constar todos os elementos do negócio, de modo que para a sua conclusão, baste a pura e simples aceitação do seu destinatário’.

    2. Conforme resulta da factualidade dada como provada e que aqui se dá por integralmente reproduzida, tal como referiu a Meritíssima Juiz do Tribunal de 1ª instância, in casu, a proposta formulada pela Recorrente previa apenas as condições retributivas e a categoria profissional, não compreendendo elementos essenciais para a formação de um contrato de trabalho, como o seja, o objecto concreto da prestação de trabalho, o local de trabalho e os próprios períodos de trabalho.

    3. A proposta dirigida pela Recorrente ao Recorrido não consubstanciava, portanto, uma proposta contratual completa onde estivessem contemplados todos os aspectos essenciais caracterizadores da relação laboral e que integram um contrato de trabalho.

    4. Aliás, conforme bem referiu a Meritíssima Juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, verifica-se que do único elemento escrito existente (email de dia 28 de Setembro) não consta a intenção incondicional da ‘CC’ celebrar o contrato definitivo e, por outro lado, não consta a manifestação de vontade por banda do próprio Recorrido.

    5. Assim, na data em que a Recorrente comunicou ao Recorrido a impossibilidade da sua admissão ao seu serviço, já que a função que lhe estava destinada iria desaparecer, estava-se, ainda, numa fase de contactos preliminares, ou seja, em que depois de escolhido o candidato final, as partes procuram conhecer-se, identificar-se, manifestam as suas condições e mantém conversações tendentes a obter um consenso sobre a regulação a verter no contrato a celebrar (vide Prof. Menezes Cordeiro in Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1991, págs. 556 e 557).

    6. Acresce que não pode a Recorrente conformar-se com o entendimento vertido no douto Acórdão recorrido segundo o qual se verificou um despedimento ilícito já que, tendo sido celebrado um contrato a termo suspensivo, ainda não se verificava a liberdade de desvinculação prevista no art. 105º do Cód. Trabalho.

    7. Desde logo porque, conforme cabalmente demonstrado, não foi celebrado qualquer contrato de trabalho e, muito menos, um contrato a termo suspensivo, sendo certo que[,] para existir termo suspensivo, exige-se que a competente cláusula conste de documento escrito assinado por ambas as partes, o que no caso em apreço não...

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