Acórdão nº 958/07.9TVPRT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução08 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Indicações Eventuais: WWW.DGSI.PT Legislação Nacional: - ARTº 26º DA LEI 3/99, DE 13-01; - ARTºS 712.º, N.º2, 722.º, N.º2, 729º, N.ºS 1E 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Jurisprudência Nacional: - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 9.11.90 (Pº 079205); - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 25.09.1996 IN ADSTA, 420º- 1467. Sumário : I- Constitui Jurisprudência uniforme, em plena consonância com a Lei, que não cabe, nos poderes de censura deste Supremo Tribunal, sindicar a matéria de facto apurada pelas Instâncias, salvo nos casos expressamente previstos na lei, como comanda o artº 722º, nº 2 do Código de Processo Civil.

II- Contudo, dada a frequência de casos em que se visa, de forma directa ou indirecta a alteração da matéria factual julgada pelas Instâncias, nunca é demais repetir que tal não cabe nos poderes do STJ.

Por isso mesmo se diz que o Supremo Tribunal de Justiça é um Tribunal de revista, isto é, conhece apenas da matéria de direito, o que, aliás, está consignado no artº 26º da Lei 3/99 de 13/01, onde se prescreve que «fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece da matéria de direito» e ipsis verbis, também no artº 33º da Lei 52/2008, de 28/08.

III- Nesta conformidade, essa Jurisprudência uniforme deste Tribunal tem sido no sentido de que «de harmonia com o artigo 722º, nº 2 do CPC, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista (nem de agravo como decorre do artº 755º, nº 2, do CPC), salvo havendo ofensa de uma disposição expressa na lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto, em que fixa a força de determinado meio de prova», como sentenciou, entre tantos outros, o Ac. STJ, de 25.09.1996 in ADSTA, 420º- 1467.

Já em 1990, este Supremo Tribunal, no seu Acórdão de 9.11.90 (Pº 079205), de que foi Relator, o Exmº Conselheiro Brochado Brandão, havia sentenciado que « o erro da Relação na apreciação das provas e na fixação dos factos provados materiais só é sindicável com a ofensa expressa de lei probatória ( artº 722º, nº 2 do CPC) » ( disponível em www.dgsi.pt ), entendimento este plenamente em vigor.

IV- Ao Supremo Tribunal cabe apenas verificar a conformidade legal da subsunção dos factos, definitivamente fixados pelas Instâncias, na lei, vale dizer, a integração dos conceitos legais por matéria factual pertinente.

Nisto se traduz o que o nº 1 do artº 729º dispõe, ao estatuir que «aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado».

Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA e BB, residentes na R…, n.° …, …, instauraram contra a Ré CC - Companhia de Seguros, S.A., com sede na R…, n.° …, …, a presente acção de condenação, na qual pedem que se declare que o condutor do veiculo de passageiros, marca BMW, de matrícula …-…-XV, como único e exclusivo culpado do acidente ocorrido no dia 11 de Abril de 2006, na R…, …, em que foi interveniente também o veiculo …-…-RA e, com base na responsabilidade contratual da Ré, que esta seja condenada a pagar-lhes, com juros legais, desde a citação, à taxa de 4 % ao ano e até efectivo e integral pagamento, a quantia de € 15.221,74, a título de danos patrimoniais, e € 8.130,00, a título de danos não patrimoniais.

A Ré contestou imputando ao A., enquanto condutor, por conta e no interesse da sua proprietária, aqui 1a A., do veículo de matrícula …-…-RA, a culpa exclusiva pela ocorrência do acidente, impugnando, quanto aos danos, os montantes peticionados e que o valor do aluguer de um veículo automóvel com as características do RA é inferior ao mencionado pelos AA. e, ainda, que a quantia peticionada a título de taxa de justiça não pode ser reclamada já que será levada em conta a final, sendo também da responsabilidade dos AA. o pagamento dos honorários.

Após os trâmites legais foi realizado o julgamento e proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo a Ré do pedido.

Inconformados, interpuseram os Autores recurso de Apelação da mesma para o Tribunal da Relação do Porto, não obtendo ganho de causa, pois foi mantida a decisão recorrida.

Novamente inconformados, os mesmos vieram interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES 1. O presente recurso vem interposto do Ac. da Relação do Porto que julgou improcedente o recurso para alteração da matéria de facto e/ou para consideração da velocidade do veículo automóvel BMW e concorrência de culpas, confirmando assim, a decisão do Tribunal da Primeira Instância.

  1. O Tribunal da Primeira Instância julgou a acção totalmente improcedente por ter considerado os aqui recorrentes como únicos e exclusivos culpados pelo acidente, em virtude de ter descuidado os deveres do artigo 44º do Código da Estrada, no momento em que vai alterar a marcha.

  2. No recurso de apelação, na parte da alteração da matéria de facto, pugnou-se pela alteração dada aos QUESITOS: 1º, 2º, 3º, 4º, 6º, 13º, 21º, 31º, 32º, 33º, 34º e 36º.

  3. Os recorrentes não ignoram que os poderes de cognição do STJ estão limitados à análise da matéria de direito.

  4. Porém, consideram que muito embora o presente recurso esteja intimamente ligado à matéria de facto, o verdadeiro problema que levantam constitui matéria de direito, porquanto se refere à violação da lei de processo por parte da Relação, cabendo assim esta matéria na sindicância deste Tribunal.

  5. Relativamente à distinção daquilo que constitui matéria de facto da matéria de direito, o Ac. do STJ relativo ao processo n.º 464/08, de 3 de Abril de 2008, in Colectânea de Jurisprudência, do ano XVI, tomo II, dita o seguinte: «Tanto o uso como o não uso pela relação dos poderes que lhe conferem o art. 712º, n.º 2, podem constituir matéria de direito (por poderem integrar violação das leis de processo) e, em consequência, podem ser censurados pelo STJ».

  6. Passemos então a uma breve análise da matéria de facto resultante dos autos.

  7. Assim, relativamente aos QUESITOS 1º e 2º resulta do depoimento das testemunhas que os factos inerentes se devem considerar provados.

  8. Relativamente ao depoimento do condutor do veículo BMW, diremos o seguinte: 9.1. Das respostas dadas pelo condutor do veículo BMW, resulta que o mesmo não viu o veículo automóvel JIPE a flectir para a esquerda e não sabe, nem se recorda a quantos metros estava este quando efectuou essa manobra de mudança de direcção, nem se fez pisca ou se fez a perpendicular, muito embora repita que vinha a olhar para a frente e sabe que arrancou 200 metros atrás, em aceleração.

    9.2. Desde logo, este depoimento vale o que vale, porquanto indicia um interesse directo na causa, e, por isso, não devia ter sido valorado, tanto mais que é contraditório e ao condutor do JEEP não foi dada possibilidade de depoimento.

  9. Por sua vez, do depoimento da testemunha DD, retira-se o seguinte: 10.1. A mesma refere que se encontrava no local para atravessar a faixa de rodagem, e que, quando ouviu uma travagem muito grande viu que o Sr. BB, o condutor do JEEP, estava para entrar para o Pingo Doce ou, melhor ainda, quando se apercebe da travagem, olha e vê o JEEP parado para fazer a manobra para entrar para o parque do Pingo Doce perto da rampa, a terminar a manobra de mudança de direcção e não a iniciar a manobra.

    Acrescenta que viu o condutor do JEEP a iniciar a manobra para entrar para o parque, pois já estava no seu acesso, e que esse foi o local preciso do embate.

    10.2. Quanto às precauções tomadas pelo condutor do JEEP, a testemunha afirmou: “Penso que sim, ele tomou as devidas precauções” e, concretiza, “Porque quando ele passou por mim, depois há aquele espaço de 40, 50 metros e vi que ele estava a tomar (…) que ia ali um veículo a tomar as precauções devidas para entrar para o parque”.

    10.3. Ora, apenas se pode concluir que essas precauções são, no caso, dar pisca, aproximar-se do eixo da via, verificar visualmente que na faixa contrária não vem em circulação qualquer veículo, não se meter à frente de veículos que vêm em sentido contrário, fazendo as manobras permitidas pelo Código da Estrada.

    10.4. De igual modo, facilmente se conclui, que “O condutor do veículo RA respeitou todos os cuidados gerais e especiais da condução para se assegurar que poderia fazer a manobra em segurança e sem embaraço para o trânsito, dado que, antes de iniciar a sua manobra de mudança de direcção, olhou para a hemifaixa contrária dessa via e constatou que não vinha em circulação qualquer veículo nessa hemifaixa”, cumprindo o disposto no Código da Estrada.

  10. Por fim, também a testemunha EE, referiu expressamente, sem margem para dúvidas, que o local exacto do embate foi junto à rampa de acesso ao supermercado Pingo Doce, a 1 metro ou a 1 metro e tal, impondo-se assim, que o quesito 2º tivesse sido dado como provado.

  11. Quanto ao depoimento da testemunha FF, destaca-se o seguinte: 12.1. Ao arrepio do que foi dado como não provado (Quesito 1º), e que devia ter sido ser dado como provado (a aproximação ao eixo da via do veiculo JEEP), do depoimento da testemunha FF, da brigada de acidentes, no que a respeito se provou em relação à via / faixa de rodagem com uma largura de 7,90m, bem andou a Exma. Juiz a quo, ao aprovar o depoimento da testemunha em conjugação com o auto de participação de acidente de viação, ou seja, que “no local do embate existe uma única via em traçado rectilíneo que se configura numa largura com cerca de 7,90m, ao que acresce, o facto de estarem “veículos estacionados junto do passeio da hemi-faixa de rodagem por onde circulava o RA, o que fazia com que a via de 7,90m se encontrasse assim reduzida por tal ocupação e na respectiva proporção”.

    12.2. Mas, por outro lado, salvo o devido respeito, mal ajuizou e decidiu a Exma. Juiz a quo, pois, se cada...

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