Acórdão nº 08A2259 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução30 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - AA instaurou, no Tribunal da Comarca de Espinho, acção declarativa, de condenação com processo comum sob a forma ordinária, contra BB, peticionando a condenação dos RR. a: a) nas fachadas, proceder à demolição da cimalha em madeira e picar os rebocos e; b) proceder à reconstrução da cimalha e rebocos exteriores; c) proceder à total renovação do telhado, tanto ao nível da estrutura como do revestimento em telha; d) proceder à substituição do tecto da cozinha e reparação da parede dessa divisão, que deverá ser picada, sendo-lhe posteriormente aplicados novos revestimentos; e) proceder à substituição dos tectos do quarto interior, da sala e da instalação sanitária; f) proceder à reparação e limpeza das paredes do quarto interior, da sala e instalação sanitária; g) proceder à reparação e/ou substituição das portas e janelas; h) proceder à substituição da rede eléctrica; i) pagar à A. a título de cláusula pecuniária compulsória a quantia de € 50, por cada dia decorrido desde o 30.º dia seguinte ao da citação até efectiva eliminação dos vícios que padece o locado atrás enumerados; j) pagar à A., a título de compensação por danos morais, a importância de € 500; l) pagar as custas e uma procuradoria condigna.

Para tanto alega, em síntese: É arrendatária de um prédio que descreve e de que os RR. são senhorios, sendo a renda mensal actual de € 7,67, pagando, porém, apenas € 2,31, por virtude do desconto de 70% a que tem direito, por obras que efectuou; O arrendado, que é uma construção muito antiga e frágil, padece dos vícios que descreve, os quais põem em causa a sua normal utilização.

Devidamente citados, contestou o Réu, impugnando a versão dos factos trazida aos autos pela A., designadamente quanto aos vícios do locado e alegando que a A. actua em claro abuso de direito, já que não têm possibilidade de custear as obras devido aos seus parcos rendimentos, vivendo inclusivamente em piores condições económicas que a A., sendo que quinhentos anos de rendas e 25 anos de rendimento de todo o agregado familiar são insuficientes para custear as obras; Replicou a autora, dizendo que apesar de as obras implicarem encargos elevados, sendo significativa a desproporção do valor do seu custo e o da renda mensal, o certo é que o imóvel chegou ao estado em que se encontra devido ao desmazelo e incúria do R.

Foi proferido despacho saneador, no qual se organizou a matéria de facto assente e a base instrutória, de que não houve reclamação.

Procedeu-se a julgamento, com observância de todas as formalidades legais, tendo-se respondido à matéria de facto, sem reclamações.

Foi proferida, de seguida, sentença, que julgou a acção totalmente improcedente.

Inconformada, apelou a A. para a Relação do Porto, recurso que foi admitido.

A Relação veio a negar provimento ao recurso, confirmando a decisão da 1.ª instância.

De tal acórdão, veio novamente a A. interpor recurso de revista, recurso que foi admitido como tal.

A A. sintetizou o seu recurso nas seguintes conclusões: 1. Ao subscrever a decisão da primeira instância e, em consequência, ao não atender a que os RR. de forma continuada desde a celebração do contrato de arrendamento - 1959 - sempre se abstiveram de proceder às obras de manutenção do arrendado, por pequenas que fossem, a que estavam obrigados, o acórdão recorrido violou, especialmente, a previsão do n.º 1, do art. 12.º, nos termos da alínea c), do n.º 2, do art. 11.º, ambos do DL n.º 321-B/90, de 15 de Outubro e, concomitantemente, a do art. 1031.º, alínea b), do Código Civil; 2. o douto acórdão em causa, ao não considerar que a invocação da desproporção entre a renda actual e o custo das obras necessárias foi culposamente provocada pela abstenção dos RR. no seu dever de manter a coisa locada em condições de ser gozada para os fins do contrato livremente celebrado e ao não, em consequência, considerar que os recorridos pretendem agora abusivamente eximir-se às suas responsabilidades, violou, sobretudo, o disposto no art. 334.º do Código Civil; 3. as decisões ora postas em crise, ao não valorizarem que o mau estado actual do arrendado se deve, exclusivamente, a que os RR. foram, ao longo dos anos, faltando culposamente ao cumprimento da sua obrigação de proceder às obras de manutenção que o mesmo ia, de ano para ano, exigindo, desrespeitaram, em especial, o teor dos art.ºs 798.º e 799.º do Código Civil; 4. o douto acórdão de que se recorre e a sentença que o mesmo confirma, ao valorarem a actual situação sócio-económica dos RR. para aferir da sua alegada impossibilidade de executarem as obras requeridas, sem cuidarem de ponderar a sua abstenção de manter o prédio desde o início e ao longo da vigência do contrato de arrendamento, agrediram, nomeadamente o disposto no art.º 801.º do Código Civil.

O R. contra-alegou, defendendo a bondade do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação II.A.

De Facto É a seguinte de facto fixada pela 1.ª instância, que a Relação manteve: 1 - Por forma verbal, o falecido marido da A., de nome CC, tomou de arrendamento para habitação, pelo prazo de um ano prorrogável, à então proprietária, que aceitou dar de arrendamento o fogo, com anexos no quintal, sito à Rua ..., com o n.º ..., em Espinho, pela renda mensal de 200$00, que, por força das legais e sucessivas actualizações, neste momento, é de 1.537$00 (€ 7,67); 2 - Mercê de obras anteriormente efectuadas no fogo referido em "1", nomeadamente de reparação dos soalhos, passou a A., ao abrigo do art. 18.º do R.A.U., a descontar na renda vigente o montante de 70%, pelo que, de momento, a importância mensal que a A. entrega ao R., a título de...

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