Acórdão nº 07S3790 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Janeiro de 2008
Magistrado Responsável | PINTO HESPANHOL |
Data da Resolução | 16 de Janeiro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
Em 31 de Março de 2006, no Tribunal do Trabalho do Porto, AA instaurou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra BB, L.da, em que pediu a condenação da ré a pagar-lhe: a) € 25.274,68 respeitante à integração da média do trabalho suplementar prestado na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal referentes aos anos de 1985 a 2005; b) € 11.022,14, a título de trabalho prestado em dias de descanso compensatório não gozados nos anos de 1985 a 2005; c) juros de mora, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.
Alega, em suma, que foi admitido ao serviço da ré, em 1 de Agosto de 1984, na qualidade de motorista de veículos pesados de transporte de mercadorias, funções que exerceu até 30 de Setembro de 2005, data em que passou à situação de reforma por velhice, sempre tendo prestado, diariamente, trabalho suplementar, que lhe foi pago pela ré, mas que esta não considerou as quantias pagas a esse título no cálculo da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, referentes aos anos de 1985 a 2005, acrescendo que a ré não lhe pagou qualquer suplemento remuneratório a título de trabalho prestado em dias de descanso compensatório não gozados.
A ré contestou, excepcionando a prescrição dos créditos vencidos até 30 de Setembro de 2001, sustentando que não tinha que considerar as quantias pagas pelo trabalho suplementar prestado nas retribuições de férias, subsídio de férias e de Natal e que os dias de descanso compensatório não eram gozados por vontade do autor, a fim de auferir maior retribuição, tendo deduzido, ainda, pedido reconvencional.
O autor respondeu, concluindo como na petição inicial.
No despacho saneador, julgou-se improcedente a invocada excepção de prescrição e não foi admitido o pedido reconvencional.
Realizado julgamento, exarou-se sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor: (a) a quantia de € 23.919,56, a título de diferenças salariais relativas a retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal entre 1985 e 2005; (b) a quantia de € 11.022,14, a título de dias de descanso compensatório não gozados e não pagos, relativo a trabalho suplementar prestado entre 1985 e 2005; (c) juros de mora, desde 2001, à taxa legal, sendo os já vencidos no montante de € 1.454,23 e os vincendos a partir da citação e até integral pagamento.
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Inconformada, a ré apelou, tendo a Relação julgado o recurso de apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida, sendo contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: «1. As normas do Código do Trabalho, os usos e o costume da Empresa limitam o conceito de retribuição à remuneração base; 2. Existem complementos regulares que acrescem à retribuição base, tais como, subsídio de férias, subsídio de Natal e gratificações de diversa natureza, mas para tal, têm que revestir uma dupla qualidade: a regularidade e independência em relação ao trabalho efectivamente produzido; 3. O quantitativo a receber por força da realização de trabalho suplementar depende da prestação efectiva de trabalho nessa qualidade; 4. Traduz, nessa medida e pela sua própria natureza, prestação irregular, variável, não integrando o conceito de retribuição para efeitos de cálculo do valor remuneratório de férias e respectivo subsídio; 5. O cálculo da remuneração pelo período de férias e do pertinente subsídio é feito com base numa ficção de prestação de trabalho, nada se presumindo quanto à prestação de trabalho, nada se presumindo quanto à prestação efectiva do mesmo a título de trabalho suplementar; 6. No período de férias, a inexistência de trabalho efectivo, em regime de trabalho suplementar, torna insustentável a contabilização e pagamento de qualquer quantia a esse título, por ausência dos respectivos pressupostos materiais que serviram de base a tal contabilização; 7. Dos usos e costumes das empresas do sector ao longo do tempo resulta inequívoco o entendimento que o subsídio de Natal seria definido por um cálculo assente na remuneração base; 8. O subsídio de Natal não pode ter um valor superior à denominada "remuneração de base", devendo contabilizar-se "apenas a remuneração certa ou mesmo de base"; 9. Para a atribuição do subsídio de Natal, não existe qualquer ficção de prestação de trabalho que justifique a contrapartida directa desse valor, pois que este apenas é atribuído e legitimado pelo facto de, nesta época, existir um acréscimo de despesas em relação às correntes; 10. O direito e gozo ao descanso compensatório não se efectivaram na sequência do pedido dirigido à entidade patronal nesse sentido pelo próprio recorrido; 11. O recorrido na vigência de todo o seu contrato de trabalho jamais manifestou qualquer intenção de gozo daquele direito; 12. O recorrido, apesar de lançar mão daquele direito, sempre foi devidamente remunerado e compensado pela sua entidade patronal; 13. Pelo que a injusta reclamação de tais valores deveria ser atentamente ponderada pela inércia do recorrido durante 20 anos de trabalho, que apenas pretende, com a sua actuação apunhalar indevidamente uma relação de confiança efectivamente consolidada no âmbito da sua relação laboral, cujo desfecho, nesta questão, poderia ser outro.» O recorrido contra-alegou, defendendo a manutenção do julgado.
Neste Supremo Tribunal, verificando-se que não constavam das conclusões da alegação do recurso as especificações previstas no n.º 2 do artigo 690.º do Código de Processo Civil, mormente as normas jurídicas violadas, a recorrente foi convidada a completar aquelas conclusões, sob pena de não se conhecer do recurso.
Respondendo àquele convite, a recorrente aduziu o seguinte: «A) A recorrente considera que no Acórdão da Relação do Porto se faz uma incorrecta aplicação do direito e que viola as normas infra mencionadas no que concerne à integração da média do pagamento do trabalho suplementar na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal: - O número 2 do artigo 82.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 1969, LCT, estabelecia: "A retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou espécie"; e no número 3 do mesmo preceito: "Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador"; - Actualmente, estipula o número 2 do artigo 249.º do CT: "Na contrapartida do trabalho inclui-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie"; e o número 3 do mesmo artigo: "Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador"; - Ora, a recorrente entende que o conceito de "retribuição" deve ser entendido como o pagamento, em dinheiro ou em espécie, que a entidade patronal confere ao trabalhador, de forma a compensar o trabalho efectivamente prestado; - Por conseguinte, terá de existir necessariamente a reciprocidade entre as prestações, pois o contrato de trabalho caracteriza-se por ser sinalagmático; - Assim sendo, a ser considerada a integração da média [d]o pagamento do trabalho suplementar na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, pergunta-se, neste caso, qual a contrapartida da entidade patronal? - Pelo que a recorrente considera que o Acórdão [d]a Relação do Porto viola as normas supra referidas, pois a lei não inclui no conceito de retribuição a integração da média do pagamento do trabalho suplementar na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; - Mais, o douto Acórdão contraria de forma indubitável o que consagrava o número 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro: "A retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e deve ser paga antes do início daquele período"; e o número 2 do mesmo preceito: "Além da retribuição mencionada no número anterior, os trabalhadores têm...
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