Acórdão nº 43/09.9TCFUN.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | LOPES DE REGO |
Data da Resolução | 13 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.AA e mulher, BB, intentaram acção de despejo, sob a forma ordinária, contra a arrendatária CC, Lda, com fundamento na realização pela R. de obras estruturais e não autorizadas no locado, destinado a funcionar como estabelecimento no ramo hoteleiro, pedindo ainda a condenação na reposição do imóvel no estado em que o recebera do senhorio.
A R. contestou, invocando a excepção de caducidade e defendendo-se por impugnação, ao sustentar, nomeadamente, que não executou nenhumas obras em bloco, nem procedeu à demolição de paredes ou outros elementos construtivos existentes: na verdade, as intervenções operadas pela Ré limitaram-se à substituição de materiais já existentes e que, por se terem degradado, tiveram de ser substituídos, ao nível do sistema eléctrico, canalização, da alimentação energética; e, no âmbito da recepção, à colocação de acessibilidades para deficientes cuja, adaptação foi feita com materiais amovíveis, à colocação de sistema de prevenção de incêndios e sistema de segurança que obriga à existência de saídas de emergência, à acomodação de botijas de gás com maior segurança. Não fossem as intervenções levadas a cabo pela Ré e o imóvel locado não estaria apto ao fim do arrendamento , já que o estabelecimento teria de ser encerrado. Essas intervenções aumentaram o valor do edifício, pelo que o património dos Autores resultou enriquecido, sendo que as benfeitorias efectuadas foram impostas pela degradação dos elementos construtivos existentes, por imposição legal e por imposição de mercado, de modo a manter o imóvel apto ao fim a que se destinava.
Os AA. replicaram, opondo-se às excepções invocadas.
Realizada audiência final, foi proferida sentença que: - Julgou improcedentes por não provadas as excepções da caducidade, da aceitação das obras pelos Autores e da obrigatoriedade das obras realizadas pela Ré no locado; - Julgou procedente por provada a acção e, em consequência: Decretou a resolução do contrato de arrendamento identificado no artigo Ioda petição inicial; Condenou a Ré a despejar o locado de pessoas e das coisas que, de acordo com o contrato, não pertencem ao prédio e a restituí-lo aos Autores; Condenou a Ré a efectuar as obras necessárias para eliminar as alterações realizadas e acima consideradas ilícitas e a repor o locado no estado interior e exterior em que ele se encontrava à data da celebração do contrato, sem prejuízo da manutenção das restantes obras, dentro do prazo de três meses; 2. Inconformada, a R. apelou, tendo a Relação – após julgar improcedente o recurso deduzido quanto ao quadro factual em que assentara a decisão recorrida - começado por fixar a seguinte matéria de facto: Io. Em escritura pública celebrada a 13 de Abril de 1965, no Quarto Cartório da Secretaria Notarial do Funchal, intitulada de "Arrendamento", DD e esposa, EE, aí designados como "primeiros outorgantes", declararam dar de arrendamento à sociedade ora Ré, "todo o alto" (exceptuados o rés-do-chão e a cave) do prédio urbano situado na Rua ..., n°s … e …, freguesia de ..., concelho do Funchal.
2o. Pelo prazo de cinco anos, a contar de 1 de Outubro de 1964, sucessivamente renovável por períodos de um ano.
3o. Mediante a renda mensal de quinze mil e quinhentos escudos, que actualmente é de€1.004,06, a pagar no domicílio do senhorio.
4o. E com destino a "pensão residencial (...) ou o que melhor convier à arrendatária dentro da utilidade turística, e seja legalmente permitido".
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Mais declararam os "primeiros outorgantes", que das "INSTALAÇÕES" pertencem ao prédio: a) A instalação eléctrica, para iluminação e para outros fins, que está completa (lustres, "apliques ", com suas lâmpadas) e inclui todos os esquentadores; b) A instalação para águas, quente e fria, completas de torneiras e de tudo o mais que lhe é acessório normalmente; c) As instalações sanitárias de casas de banho, e ainda outras fora destas; d) A instalação do "bar", incluindo balcão, prateleiras e banquetas fixas; e) E a instalação da "recepção " com o balcão e tudo o mais que a constitui (não são compreendidos, e pertencem à arrendatária, a secretária aparafusada ao balcão, e os maples " e demais móveis) ".
6o. Os "primeiros outorgantes" especificaram quanto às "OBRAS JA EFECTUADAS PELA ARRENDATÁRIA", que "fica ratificada a autorização verbalmente concedida para as que foram executadas no sexto andar e declarado que, findo o contrato (quando porventura se verifique a entrega da chave) a arrendatária fará a reposição, no estado anterior, daquele pavimento e levantará todos os materiais resultantes de tal reposição e ainda todas as peças de casa de banho que ela ali instalou ".
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Os "primeiros outorgantes" discriminaram quanto a "OBRAS A EFECTUAR", que "ficam autorizadas as que a arrendatária se propôs realizar e que constam da construção de duas casas de banho, com a respectiva instalação completa, e a terem lugar nos quartos ou compartimentos que actualmente têm os números vinte e dois e três; e mais ficam autorizadas as necessárias para transformar os quartos ou compartimentos números vinte e três e vinte e quatro num só compartimento -para tanto demolindo a respectiva divisória.
Estes trabalhos, as peças sanitárias e todas as instalações, ficarão integrados no prédio e não serão indemnizáveis".
8o. E estipularam quanto a "OUTRAS OBRAS", que "só com consentimento, escrito, do senhorio, poderão ser executadas, ficarão fazendo parte do prédio e não serão pagas à arrendatária, salvo se no escrito que autorizar e condicionar tais obras, também conste a obrigação de pagar, e como, quando e quanto".
9o. Nessa mesma escritura, FF, GG, e HH, aí designados como "segundos outorgantes ", em representação da sociedade ora Ré, declararam aceitar para esta o arrendamento, nos termos exarados.
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A 28 de Setembro de 1964, a Câmara Municipal do Funchal havia atribuído ao prédio o alvará de licença de utilização para "hotel" n° …, em nome de DD, após vistoria realizada a 21 desse mês.
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O licenciamento dessa utilização fora solicitado pelo DD, através de requerimento apresentado à Câmara Municipal do Funchal, a 24 de Junho de 1964, acompanhado de projecto de adaptação da construção à finalidade de unidade hoteleira e de memória descritiva deste.
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Nos termos dessa "Memória Descritiva'', o "hotel comporta vinte e três quartos e duas suites, num total de quarenta e nove camas; ocupa os andares superiores do edifício, distribuindo-se os quartos e respectivos serviços pelos pisos seguintes: RÉS-DO-CHAO - Situa-se em parte deste piso, a entrada e recepção, e acessos aos andares.
Io, 2o e 3o ANDARES - Seis quartos com duas camas, W.C. e banho privativos em cada piso, cozinha para pequenos almoços.
4o ANDAR - Quatro quartos de duas camas, W. C. e banho privativos; dois quartos de uma cama, sendo um destinado à empregada da noite, copa para pequenos-almoços e roupeiro.
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ANDAR - Duas "suites ", com quartos de duas camas, kitchenete e sala.
6o ANDAR - Neste último piso, situa-se um conjunto de dependências, destinadas a economato ".
13°. Em escritura pública lavrada a 22 de Março de 1975, no Cartório Notarial da Ponta do Sol, intitulada de "Compra e Venda", DD, aí identificado como "primeiro outorgante", por si e em representação da sua esposa, declarou vender aos ora Autores, então representados por procurador, aí identificado como "segundo outorgante ", que nessa qualidade declarou aceitar, o prédio urbano referido no artigo Io.
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Por carta registada e com aviso de recepção expedida a 6 de Maio de 2008, o Autor avisou a Ré de que pretendia examinar o locado no dia 11 desse mês.
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Foram introduzidas no prédio modificações ao projecto licenciado pela Câmara Municipal do Funchal, alterações essas que nunca foram submetidas a licenciamento.
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Essas modificações consistiram em alteração das divisórias; alteração dos elementos de revestimento do prédio e supressão de elementos construtivos, nomeadamente, as portas nos corredores de acesso aos quartos e referidas nos artigos 31° e sefiuintesdap.i., instalações sanitárias existentes nos corredores, entre outras.
17o. O espaço arrendado à Ré e que lhe foi entregue em 1 de Outubro de 1964, foi o que consta da Memória Descritiva a que alude a M) dos factos assentes como afectoao hotel, incluindo rés-do-chão e os andares superiores, com a composiçãodiscriminada naquela alínea, com excepção da cozinha para pequenos almoços nos Io,2o e 3o andares e da copa para pequenos almoços no 4o andar.
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À data da celebração do contrato, a parte arrendada do rés-do-chão e o Io, 2o, 3o, 4o e 5o tinham a configuração e a disposição internas representadas nas respectivas plantas do referido "Aditamento ao Projecto do Edifício", apresentado na Câmara Municipal a 24 de Junho de 1964, sendo que a parte arrendada do rés-do-chão é a delimitada a cor-de-rosa na planta de fls.2, com excepção da cozinha para pequenos almoços nos Io, 2o e 3o andares e da copa para pequenos almoços no 4o andar.
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E na mesma data, a cobertura e a configuração e aspecto exteriores do edifício eram os representados, respectivamente na planta, no corte "EE" e no alçado constantes do mesmo Aditamento ao Projecto.
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Durante o mês de Abril de 2008, o Autor foi alertado por terceiros para que a Ré estava a movimentar materiais de construção no local arrendado.
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Em visitas efectuadas em 13 de Maio de 2008 e em data não apurada desse mesmo mês, com a assistência de um técnico, o Autor constatou a existência de várias obras feitas pela Ré no locado.
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No rés-do-chão, a Ré construiu, junto à entrada, um compartimento com 4 portas, em alumínio verde, fixo ao pavimento e à parede do edifício, com cerca de l,90m de largura, por l,39m de altura para servir e que serve de abrigo a garrafas de gás industrial.
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Quem entra no locado vê necessariamente esse compartimento de alumínio.
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O dito compartimento está mal integrado.
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O pavimento da parte arrendada do rés-do-chão desenvolvia-se originalmente em dois níveis, o hall de...
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