Acórdão nº 03P1528 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2003

Magistrado ResponsávelHENRIQUES GASPAR
Data da Resolução04 de Junho de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. O Ministério Público acusou em processo comum (NUIPC-1095/97.8TDPRT - Tribunal de Círculo do Porto - 4ª Vara Criminal) os arguidos A, B, C, D, E e F da prática de um crime de burla agravada, previsto e punido nos artigos 313º, nº 1, e 314º, alínea c), do Código Penal (versão de 1982), e nos artigos 217º,nº 1, e 218º, nº 2, alínea c), na versão de 1995. Na 1ª sessão da audiência de julgamento, o Exmº. Magistrado do Mº. Pº. requereu a extinção do procedimento criminal por considerar ter decorrido o prazo de prescrição, invocando, em resumo, que a acusação, acolhida inteiramente pela decisão instrutória que pronunciou os arguidos, refere que os cheques, em que se substanciaria o prejuízo patrimonial da lesada, foram entregues aos arguidos em 6 de Fevereiro de 1991, sendo nesta data que os assistentes abriram mão de tais títulos, mesmo dos previamente datados de 31 de Julho de 1991, não se imputando «na acusação a qualquer dos arguidos facto gerador que os faça incorrer em responsabilidade criminal, nessa data de 31.7.1991». No requerimento ditado para a acta, o Mº Pº considera que «da acusação (bem como dos documentos que a suportam [...]), resulta que a obrigação assumida pelos contratantes começou a ser cumprida [no] dia "2.2.1991", com a assinatura do contrato de compra e venda (precedente de anterior "contrato de promessa" [...]), mediante o pagamento de preço contra a correlativa entrega das acções. A transmissão dos mencionados cheques, datados de "6.2.1991" e "31.7.1991", constituiu o pagamento de parte do preço acordado, ainda que com diferimento no tempo quanto a estes e conforme a vontade expressamente manifestada pelas partes, que nele outorgaram». «Tal declaração de vontade foi determinante para os termos em que o contrato foi assinado em "2.2.1991" e consequente consumação do crime de burla que aos arguidos se imputa». Termina por salientar que, na perspectiva que sustenta, «relativamente a cada um dos arguidos (...) não se vislumbra que tenha ocorrido qualquer causa de suspensão ou interrupção do procedimento criminal e até àquela data, que [reputa] como de consumação do imputado crime» - artigos 119º e 120º do Código Penal. O Tribunal Colectivo, pronunciou-se sobre a questão suscitada, aceitando «as razões de facto e de direito expendidas» pelo Mº Pº, e julgou extinta em 2 de Fevereiro de 2002 a «responsabilidade e o procedimento criminal de cada um dos seis arguidos, pronunciados em 7/2/01, pela co-autoria material, em 2/2/91, de factos constitutivos de um crime (doloso) de burla então agravada, p. e p. nos art°s 313°, n° 1, e 314°, alínea c), do CP 82, e desde 01.10.95 burla qualificada p. e p. aos arts 217º, nº 1, e 218°, nº 2, alínea a), do CP/95, com a consequente preclusão da continuação da audiência da apreciação do pedido civil», determinando o arquivamento. 2. Não se conformando com o assim decidido, a assistente interpôs recurso para o Supremo Tribunal, que motivou terminando com as seguintes conclusões: - Tratando-se de um crime de burla qualificada, pela extensão do prejuízo, p. e p. nos arts. 313° e 314°, alínea c), do Código Penal de 1982, e 217° e 218,° n° 2, alínea a), ambos do Código Penal actual, integra o tipo de ilícito o conhecimento integral do dano causado, consubstanciado nas diversas transferências patrimoniais tituladas pelos correspondentes cheques entregues pela assistente aos arguidos; - Porque tais transferências se consubstanciaram em 6 cheques, com datas diversas, só a partir da movimentação do último, após 31/07/91, se inicia a contagem do prazo de prescrição do procedimento criminal; - Ainda que assim se não entenda, e entendendo-se pelo contrário que as transferências patrimoniais ocorridas posteriormente à primeira, coincidente com o 1° cheque, não relevam para efeitos de consumação do crime, que se consuma com aquela, sempre teriam que relevar para efeitos de avaliação da extensão do prejuízo da vítima e correspondente enriquecimento dos arguidos, razão porque o prazo de prescrição só corre a partir do dia em que aquele resultado se verificar, ou seja, após 31/7/91 (art.119° n° 4, do Código Penal); - Consequentemente, e tendo em atenção a data da última deslocação patrimonial (31/7/91), conclui não ter ocorrido prescrição do procedimento criminal, o que só teria ocorrido (a não ter havido interrupção) em 31/7/01. A recorrente entende, assim, que ao não decidir em conformidade com o exposto, a decisão recorrida violou o disposto nos arts. 313°e 314°, alínea c), e 118°, n° 4, ambos do Código Penal de 1982, atenta a data de prática dos factos, e arts. 217°, 218°, n° 2, alínea a), e 119°, n° 4, do Código Penal actualmente em vigor. Termina pedindo que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que decida não ter ocorrido a prescrição, determinando o prosseguimento do processo com a designação de data para julgamento. O Mº Pº e os arguidos responderam à motivação, pronunciando-se pelo não provimento do recurso. 3. No tempo processual adequado, foi interposto pelos arguidos recurso da decisão instrutória que os pronunciou e desatendeu a então invocada prescrição do procedimento criminal, restrito à questão da prescrição. Este recurso, interposto para o Tribunal da Relação, foi admitido com efeito devolutivo, com subida diferida, devendo subir com o recurso que eventualmente pusesse termo à causa. 4. Neste Supremo Tribunal, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, na intervenção processual a que se refere o artigo 416º do Código de Processo Penal, considerou nada obstar ao conhecimento do recurso da assistente, e emitiu opinião no sentido de não ser conhecido o recurso dos arguidos interposto da decisão instrutória. Colhidos os vistos, o processo foi apresentado à Conferência (artigo 419º, nº 4, alínea c), do Código de Processo Penal), cumprindo decidir. No que respeita ao recurso dos arguidos, não há que dele conhecer, uma vez que os arguidos não têm legitimidade para recorrer da decisão que pôs termo ao processo (artigo 401º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Penal) e, assim, não podia ser cumprido o disposto no artigo 412º, nº 5, do mesmo diploma, por falta de interesse em agir. Há, assim, que conhecer apenas do recurso interposto pela assistente e da questão nele suscitada, que é a de saber se, considerando os factos constantes da acusação, aceites pela pronúncia, ocorreu a prescrição de procedimento criminal. Da acusação deduzida contra os arguidos, constam os seguintes factos: - Entre os anos de 1990 e 1991, os arguidos A e B eram, simultaneamente, sócios e gerentes da sociedade por quotas, denominada "I"; -A arguida D exercia, também, as funções de gerente da mesma sociedade, em representação de "J", terceira sócia da referida I; - Por sua vez, o arguido E era, na mesma data, sócio da sociedade por quotas "L", sendo as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
8 temas prácticos
8 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT