Acórdão do Tribunal de Contas n.º 1/2010, de 16 de Fevereiro de 2010

Acórdáo do Tribunal de Contas n. 1/2010

Recurso extraordinário n. 2/09 Uniformizaçáo de jurisprudência

Acordam em Plenário Geral do Tribunal de Contas:

I - Relatório

1 - O Ex.mo Magistrado do Ministério Público interpôs recurso extraordinário, para fixaçáo de jurisprudência, do Acórdáo n. 21/09, de 2 de Junho, proferido pela 1.ª Secçáo do Tribunal de Contas, em plenário, invocando, como fundamento, os Acórdáos n.os 18/05, de 5 de Julho, e 21/05, de 27 de Setembro, ambos proferidos pela 1.ª Secçáo do Tribunal de Contas, também em plenário, nos Recursos Ordinários n.os 9/2005 e 5/2005, respectivamente, e alegando ter aquele aresto perfilhado soluçáo jurídica oposta à que foi consagrada por estes últimos, relativamente à mesma questáo fundamental de direito.

2 - No seu requerimento de interposiçáo de recurso, o magistrado do Ministério Público alegou que o Acórdáo n. 21/09, de 2 de Junho, proferido pelo plenário da

  1. Secçáo deste Tribunal - negando provimento ao recurso que interpusera do Acórdáo n. 19/08, proferido em 8 de Fevereiro, pela mesma 1.ª Secçáo, em Subsecçáo -, manteve a decisáo de concessáo de visto, com recomendaçóes, ao contrato de empreitada de «Reabilitaçáo da Antiga Fábrica dos Leóes - Complexo de Arquitectura e Artes Visuais da Universidade de Évora», celebrado entre a Universidade de Évora e a sociedade Arlindo, Correia & Filhos, S. A.

Para chegar a essa soluçáo jurídica - sustenta o Magistrado recorrente -, o acórdáo recorrido perfilhou o entendimento de que a omissáo de um item da lista de preços unitários do mapa de quantidades, prevista na alínea b) do n. 1 do artigo 73. do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março, náo configura a falta de um elemento essencial e, por isso, náo é geradora de nulidade, motivo por que náo origina o fundamento de recusa de visto estabelecido no artigo 44., n. 3, alínea a), da Lei n. 98/97, de 26 de Agosto.

Ora, segundo o Ministério Público, a orientaçáo jurisprudencial constante desse acórdáo é oposta à que foi perfilhada pelos Acórdáos n.os 18/05 e 21/05, acima referidos, de 5 de Julho e de 27 de Setembro, respectivamente, arestos estes que assentaram no entendimento de que a omissáo de um item na lista de preços unitários viola o disposto no artigo 73., n. 1, alínea b), do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março, e, porque consubstancia algo de essencial, invalida a proposta, traduzindo -se a graduaçáo desta, com tal omissáo, numa situaçáo de favor relativamente ao concorrente faltoso, violadora dos princípios fundamentais da contrataçáo pública. (1)

3 - Notificada a Universidade de Évora para se pronunciar, de acordo com o disposto no artigo 99., n. 2, da Lei n. 98/97, de 26 de Agosto (LOPTC), aplicável ex vi do artigo 101., n. 3, do mesmo diploma legal, nada veio dizer.

4 - Notificado o Ex.mo Magistrado do Ministério Público, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 102., n. 2, da LOPTC, veio o mesmo a emitir parecer no sentido de se verificar oposiçáo de julgados, e, propendendo para a

orientaçáo constante dos acórdáos fundamento, a formular a seguinte proposta de fixaçáo de jurisprudência:

A omissáo de um 'item' e, consequentemente, do respectivo preço unitário, que deva constar da respectiva lista de preços unitários, segundo o caderno de encargos, viola o disposto no artigo 73. n. 1, alínea b), do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março.

Tal ilegalidade, porque também violadora dos princípios da legalidade, transparência, igualdade, concorrência e imparcialidade, previstos nos artigos 7. a 11. do Decreto -Lei n. 197/99, de 8 de Junho (aplicável às empreitadas por força do seu artigo 4.), constitui a preteriçáo de algo de essencial, que conduz à invalidade da respectiva proposta.

Aceitar a possibilidade de avaliaçáo e graduaçáo, de uma tal proposta, significaria a consagraçáo de uma situaçáo de favor, injusta e injustificada, em relaçáo ao concorrente em tais circunstâncias e, consequentemente, violadora dos princípios fundamentais da contrataçáo pública.

Assim sendo, deverá ser recusado o 'visto' a um contrato, celebrado com um concorrente, onde ocorreu a referida ilegalidade essencial, com fundamento em nulidade do procedimento, por força das disposiçóes conjugadas da alínea a) do n. 3 do artigo 44. da Lei n. 98/97, de 26 de Agosto, e dos artigos 133., n. 1, e 134., n. 2, do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

5 - Colhidos os vistos, cumpre conhecer e decidir.

II - Sobre a oposiçáo de julgados

1 - Nos termos do disposto no artigo 101., n. 1, da Lei n. 98/97, de 26 de Agosto (LOPTC), e no que respeita à 1.ª Secçáo do Tribunal de Contas, é pressuposto, para a admissibilidade de recurso extraordinário para fixaçáo de jurisprudência, que tenham sido proferidas no plenário da 1.ª Secçáo, em processos diferentes, duas decisóes, em matéria de concessáo ou recusa de visto, que, no domínio da mesma legislaçáo, e relativamente à mesma questáo fundamental de direito, assentem sobre soluçóes opostas.

2 - O acórdáo recorrido, equacionando a questáo das consequências jurídicas da omissáo de um item da lista de preços unitários do mapa de trabalhos e de quantidades, da proposta adjudicatária (2) - lista prevista nos artigos 22. e 73., n. 1, alínea b), do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março -, concluiu no sentido de que essa falta náo constitui a omissáo de um elemento essencial, que conduza à nulidade do acto de adjudicaçáo e à recusa do visto ao contrato, nos termos do disposto na alínea a) do n. 3 do artigo 44. da LOPTC.

3 - Por seu lado, os acórdáos fundamento (Acórdáos n.os 18/05, de 5 de Julho, e 21/05, de 27 de Setembro) - tirados por maioria, o primeiro (com um voto de vencido e uma declaraçáo de voto), e por unanimidade, o segundo - consideraram que a omissáo de um item e, consequentemente, de um preço unitário, na lista de preços unitários, do mapa de quantidades, viola, para além do mais, o disposto no citado artigo 73., n. 1, alínea b), do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março, e, porque consubstancia algo de essencial, invalida a proposta - que deve ser excluída -, sendo que a graduaçáo de uma proposta com tal omissáo traduziria uma situaçáo de favor em rela-

462 çáo ao concorrente faltoso, violadora dos princípios fundamentais da contrataçáo pública.

4 - Resulta do que acaba de ser exposto, que as decisóes atrás mencionadas, além de recaírem sobre a mesma questáo fundamental de direito, foram proferidas no domínio da mesma legislaçáo e sáo de sentido oposto.

Efectivamente, quer o acórdáo recorrido, quer os acórdáos fundamento, incidem na questáo das consequências jurídicas da omissáo de um item na lista de preços unitários do mapa de quantidades, sobre a proposta, e, ulteriormente, sobre a concessáo ou recusa do visto ao contrato, em cujo procedimento prévio ocorreu aquela omissáo.

Por outro lado, enquanto o acórdáo recorrido propendeu para considerar que a omissáo do referido item, do mapa de quantidades, náo tipifica a omissáo de um elemento essencial, pelo que náo conduz à nulidade da adjudicaçáo e, consequentemente, do contrato, motivo por que náo constitui fundamento de recusa de visto, já os acórdáos fundamento se orientaram no sentido oposto, ou seja, consideraram constituir tal omissáo a falta de um elemento essencial, cuja consequência é a da invalidade da proposta, com repercussáo no acto de adjudicaçáo e no contrato, e, nessa sequência, constituiria fundamento de recusa de visto.

Verifica -se, pois, a existência de oposiçáo de julgados, que constitui pressuposto para que o presente recurso possa prosseguir, com vista a solucionar tal conflito jurisprudencial.

III - Da uniformizaçáo de jurisprudência

1 - Como resulta do que se disse acima, a questáo fundamental a resolver, no caso sub judice, é a de saber qual a consequência jurídica que, sobre a proposta, deriva da omissáo de um item da lista de preços unitários do mapa de quantidades de trabalho, que a instrui.

2 - Nos termos do artigo 22. do Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março (3), os concorrentes, nos casos de empreitadas de obras públicas, por preço global ou por série de preços (4), devem apresentar, com as suas propostas, as listas de preços unitários que lhes hajam servido de base.

Por seu turno, e ao tratar dos documentos que instruem a proposta, estabelece o artigo 73., n. 1, alínea a), do mesmo Decreto -Lei n. 59/99, de 2 de Março, o seguinte:

Artigo 73.

Documentos que instruem a proposta

1 - Sem prejuízo de outros exigidos no programa de concurso, a proposta é instruída com os seguintes documentos:

a) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

b) Lista dos preços unitários (5), com o ordenamento dos mapas -resumo de quantidades de trabalho;

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