Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 494/2009, de 23 de Outubro de 2009

Acórdáo do Tribunal Constitucional n. 494/2009

Processo n. 595/06

Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:

I - Relatório

1 - Um grupo de Deputados à Assembleia da República requereu, ao abrigo do artigo 281., n. 2, alínea f), da Constituiçáo da República Portuguesa (CRP) e dos artigos 51., n. 1, e 62., n. 1, da Lei da Organizaçáo, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), a declaraçáo da inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas contidas no artigo 98., n.os 9

e 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) e no artigo 44., n.os 5 e 6, da Lei n. 60 -A/2005, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2006 - LOE -06), preceitos relativos ao pagamento especial por conta (PEC) por parte de pessoas colectivas isentas de tributaçáo em IRC.

7988 As normas em causa dispóem da seguinte forma:

Artigo 98.

Pagamento especial por conta

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

9 - O pagamento especial por conta a efectuar pelos sujeitos passivos de IRC que, no exercício anterior àquele a que o mesmo respeita, apenas tenham auferido rendimentos isentos corresponde ao montante mínimo previsto no n. 2, sem prejuízo do disposto no n. 3.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

11 - Ficam dispensados de efectuar o pagamento especial por conta:

a) Os sujeitos passivos totalmente isentos de IRC nos termos dos artigos 9. e 10. do Código do IRC e do Estatuto Fiscal Cooperativo;

b) Os sujeitos passivos que se encontrem com processos no âmbito do Código dos Processos Especiais de Recuperaçáo da Empresa e de Falência, aprovado pelo Decreto -Lei n. 132/93,de 23 de Abril, a partir da data de instauraçáo desse processo;

Artigo 44.

Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

5 - O disposto no n. 9 do artigo 98. do Código do IRC, na redacçáo dada pela presente lei, é aplicável aos pagamentos especiais por conta efectuados ou devidos pelos sujeitos passivos nele referidos nos períodos de tributaçáo iniciados em 2005.

6 - A entrega até 31 de Janeiro de 2006 do montante do pagamento especial por conta resultante do disposto no n. 9 do artigo 98. do Código do IRC, na redacçáo dada pela presente lei, pelos sujeitos passivos nele referidos extingue os procedimentos contra -ordenacionais respeitantes à falta da sua entrega.

Apesar de náo impugnadas, importa ter presentes as disposiçóes contidas nos artigos 9. e 10. do CIRC, pois só assim será possível ter uma ideia exacta do alcance das medidas legislativas objecto do presente controlo de constitucionalidade:

Artigo 9.

Estado, Regióes Autónomas, autarquias locais, suas associaçóes de direito público e federaçóes e instituiçóes de segurança social

1 - Estáo isentos de IRC:

a) O Estado, as Regióes Autónomas e as autarquias locais, bem como qualquer dos seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, compreendidos os institutos públicos, com excepçáo das entidades públicas com natureza empresarial;

b) As associaçóes e federaçóes de municípios e as associaçóes de freguesia que náo exerçam actividades comerciais, industriais ou agrícolas;

c) As instituiçóes de segurança social e previdência a que se referem os artigos 87. e 114. da Lei n. 17/2000, de 8 de Agosto;

d) Os fundos de capitalizaçáo administrados pelas instituiçóes de segurança social.

2 - Sem prejuízo do disposto no n. 4 do presente artigo, a isençáo prevista nas alíneas a) a c) do número anterior náo compreende os rendimentos de capitais tal como sáo definidos para efeitos de IRS.

3 - Náo sáo abrangidos pela isençáo prevista no n. 1 os rendimentos dos estabelecimentos fabris das Forças Armadas provenientes de actividades náo relacionadas com a defesa e segurança nacionais.

4 - O Estado, actuando através do Instituto de Gestáo do Crédito Público, está isento de IRC no que respeita a rendimentos de capitais decorrentes de operaçóes de swap e de operaçóes cambiais a prazo, tal como sáo definidos para efeitos de IRS.

Artigo 10.

Pessoas colectivas de utilidade pública e de solidariedade social

1 - Estáo isentas de IRC:

a) As pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;

b) As instituiçóes particulares de solidariedade social e entidades anexas, bem como as pessoas colectivas àquelas legalmente equiparadas;

c) As pessoas colectivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, beneficência, solidariedade social ou defesa do meio ambiente.

2 - A isençáo prevista na alínea c) do número anterior carece de reconhecimento pelo Ministro de Estado e das Finanças, a requerimento dos interessados, mediante despacho publicado no que define a respectiva amplitude, de harmonia com os fins prosseguidos e as actividades desenvolvidas para a sua realizaçáo, pelas entidades em causa e as informaçóes dos serviços competentes da Direcçáo -Geral dos Impostos e outras julgadas necessárias.

3 - A isençáo prevista no n. 1 náo abrange os rendimentos empresariais derivados do exercício das actividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários, bem como os rendimentos de títulos ao portador, náo registados nem depositados, nos termos da legislaçáo em vigor, e é condicionada à observância continuada dos seguintes requisitos:

a) Exercício efectivo, a título exclusivo ou predominante, de actividades dirigidas à prossecuçáo dos fins que justificaram o respectivo reconhecimento da quali-dade de utilidade pública ou dos fins que justificaram a isençáo, consoante se trate, respectivamente, de entidades previstas nas alíneas a) e b) ou na alínea c) do n. 1; b) Afectaçáo aos fins referidos na alínea anterior de, pelo menos, 50 % do rendimento global líquido que seria sujeito a tributaçáo nos termos gerais, até ao fim do 4. exercício posterior àquele em que tenha sido obtido, salvo em caso de justo impedimento no cumprimento do prazo de afectaçáo, notificado ao director -geral dos Impostos, acompanhado da respectiva fundamentaçáo escrita, até ao último dia útil do 1. mês subsequente ao termo do referido prazo;

c) Inexistência de qualquer interesse directo ou indirecto dos membros dos órgáos estatutários, por si mesmos ou por interposta pessoa, nos resultados da exploraçáo das actividades económicas por elas pros-seguidas.4 - O náo cumprimento dos requisitos referidos nas alíneas a) e c) do número anterior determina a perda da isençáo, a partir do correspondente exercício, inclusive.

5 - Em caso de incumprimento do requisito referido na alínea b) do n. 3, fica sujeita a tributaçáo, no

4. exercício posterior ao da obtençáo do rendimento global líquido, a parte desse rendimento que deveria ter sido afecta aos respectivos fins.

Importa ainda referir que o regime jurídico do PEC se encontra regulado, nos seus aspectos essenciais, no artigo 98. do CIRC, o qual está inserido no capítulo VI, relativo ao pagamento, e, de forma mais específica, na secçáo I, sob a epígrafe «Entidades que exerçam, a título principal, a actividade comercial, industrial ou agrícola».

Além deste preceito, integram também o regime do PEC os artigos 83., n.os 2 e 7 (relativos ao procedimento e forma de liquidaçáo - o primeiro refere as várias deduçóes previstas e o segundo estabelece que das deduçóes realizadas de acordo com o n. 2 náo pode resultar um valor negativo), e 87. («Pagamento especial por conta»), ambos do CIRC.

Saliente -se, finalmente, que o regime jurídico do PEC tem de ser lido à luz de outros preceitos infraconstitucionais, como é o caso dos artigos 33. da lei geral tributária (LGT) e o artigo 114. do Regime Geral das Infracçóes Tributárias (RGIT):

Artigo 33. [LGT]

As entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos passivos no período de formaçáo do facto tributário constituem pagamento por conta do imposto devido a final.

Artigo 114. [RGIT]

1 - A náo entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos náo constituam crime, ao credor tributário, da prestaçáo tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestaçáo em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.

2 - Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da náo entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 10 % e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

5 - Para efeitos contra -ordenacionais sáo puníveis como falta de entrega da prestaçáo tributária:

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestaçáo tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situaçóes de pagamento especial por conta.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

2 - Os requerentes motivam o pedido do seguinte modo:

A administraçáo fiscal notificou, durante os meses de Outubro e Novembro de 2005, um grande número de entidades licenciadas para operar no Centro Internacional de

Negócios da Madeira (CINM) no sentido de estas procederem «ao pagamento de coimas devidas pelo náo pagamento do pagamento especial por conta (PEC), relativamente ao ano em causa [2005]». O legislador veio dar cobertura a esta actuaçáo administrativa ilegal com as normas cuja fiscalizaçáo de constitucionalidade se pretende.

Neste quadro e em síntese, os requerentes invocam a violaçáo dos seguintes princípios constitucionais:

  1. A violaçáo do princípio da legalidade da criaçáo de impostos (artigo 103., n. 2, CRP) decorrerá da circunstância de a exigência do PEC...

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