Recomendação n.º 4/2023

Data de publicação11 Dezembro 2023
Gazette Issue237
SeçãoSerie II
ÓrgãoEducação - Conselho Nacional de Educação
N.º 237 11 de dezembro de 2023 Pág. 72
Diário da República, 2.ª série
PARTE C
EDUCAÇÃO
Conselho Nacional de Educação
Recomendação n.º 4/2023
Sumário: Torna-se pública a recomendação sobre a inovação pedagógica nas escolas.
Preâmbulo
No uso das competências que por lei lhe são conferidas, e nos termos regimentais, após
apreciação do projeto de Recomendação elaborado pelo(as) Conselheiro(as) Relator(as) Flávia
Vieira, Jesus Maria Sousa, Leonor Santos e Nuno Ferro, o Conselho Nacional de Educação, em
reunião plenária de 30 de outubro de 2023, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo assim a
primeira Recomendação do ano de 2023, a qual integra o Referencial para a Inovação Pedagógica
nas Escolas apresentado em anexo e disponível em www.cnedu.pt.
Introdução
A inovação pedagógica nas escolas constitui um campo amplo de reflexão, intervenção e
investigação, de fronteiras pouco definidas e em constante evolução, cujos contornos dependem,
sobretudo, da visão de educação que a orienta e das circunstâncias, desafios e aspirações que a
cada momento marcam as sociedades e, no seu seio, as práticas educativas. Embora a inovação
possa assumir diversas configurações, a sua finalidade central é melhorar a qualidade da vida nas
escolas e o sucesso educativo dos educandos, supondo a existência de profissionais informados,
reflexivos e capazes de promover a mudança.
Num mundo globalizado, marcado pela velocidade dos avanços científicos e tecnológicos, mas
também pelas desigualdades, pelos riscos ambientais e pela incerteza do presente e do futuro, são
inúmeros os desafios que conferem à escola uma missão multifacetada e exigente. Construir um mundo
mais solidário, justo e sustentável é um desafio ao qual a escola não está indiferente e que deve refletir-
-se nas finalidades, natureza e efeitos das práticas pedagógicas. Promover o sucesso educativo dos
educandos não significa apenas garantir bons resultados académicos, mas também criar ambientes de
aprendizagem inclusivos e capazes de educar para a complexidade, a diversidade e a incerteza que
caracterizam as sociedades de hoje e do futuro. Assim, a inovação pedagógica assume propósitos que
vão muito além da utilização de novos métodos e recursos, podendo ser definida como um processo
fundamentado, situado e intencional de conceção, desenvolvimento e avaliação de mudanças nas
práticas educativas, focando -as nos educandos e na aprendizagem, e orientando -as para a construção
de uma educação e de uma sociedade (cada vez mais) humanistas e democráticas.
Esta definição de inovação pedagógica integra o Referencial para a Inovação Pedagógica nas
Escolas apresentado em anexo, o qual se dirige às escolas enquanto organizações aprendentes
e sustenta as recomendações enunciadas. Tendo em consideração estudos e recomendações
produzidos por organismos internacionais que influenciam as políticas educativas nacionais, o
Referencial apresenta pressupostos ético -conceptuais e linhas de ação em três dimensões da
educação, com implicações nos processos de inovação:
Um sentido social, relativo a uma visão transformadora da educação;
Uma orientação local e sistémica, relativa aos contextos, condições, monitorização e avaliação
da inovação;
Uma focalização nos educandos e na aprendizagem, relativa à gestão do currículo e às abor-
dagens pedagógicas.
Estas dimensões estão conectadas entre si e a sequência pela qual se apresentam visa subli-
nhar que a focalização nos educandos e na aprendizagem pressupõe uma visão transformadora
da educação e uma compreensão crítica das circunstâncias em que ocorre a mudança educativa.
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Diário da República, 2.ª série
PARTE C
Conferir um sentido social à educação e à inovação pedagógica implica empreender esforços
para assegurar uma educação de qualidade para todos, assente em valores humanistas e democrá-
ticos como a liberdade, a responsabilidade social, a solidariedade, a inclusão, a justiça, a equidade e
a interculturalidade. Embora as iniciativas de inovação possam variar quanto ao seu âmbito, finalida-
des e modos de operacionalização, propõe -se que sejam orientadas por uma visão transformadora
da educação baseada nesses valores e que se traduz nas seguintes vertentes: educação inclusiva;
educação para uma cidadania democrática; educação para a sustentabilidade; educação digital; e
educação para a aprendizagem ao longo da vida. Estas vertentes respondem a desafios de diversa
ordem e representam imperativos da escola atual. Têm vindo a ser promulgadas através de estudos
e recomendações produzidos por organismos internacionais como a ONU, a UNESCO, a OCDE,
a Comissão Europeia e o Conselho da Europa (ver Referencial), tendo também uma expressão
significativa nas políticas educativas nacionais, as quais se baseiam em orientações transnacionais
e das quais podemos destacar as seguintes: Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória;
Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania; Orientações Curriculares para a Educação Pré-
-Escolar; Aprendizagens Essenciais para o Ensino Básico e para o Ensino Secundário; Autonomia
e Flexibilidade Curricular; e políticas de inclusão. É importante sublinhar, no contexto nacional, a
crescente importância conferida à flexibilização curricular em associação com a definição de planos
de inovação curricular e pedagógica nas escolas, assim como à natureza holística da formação dos
educandos, traduzida no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, onde se assume
uma visão humanista e democrática da educação, e que constitui uma matriz para processos de
decisão curricular e pedagógica por parte dos organismos responsáveis pelas políticas educativas e
das escolas. O Conselho Nacional de Educação tem tido também um papel de relevo na promoção
de uma visão humanista e democrática de educação, nomeadamente através de recomendações
incidentes na educação ambiental, numa educação para a cidadania e antirracista, no acolhimento de
migrantes para uma escola inclusiva, e na promoção da voz das crianças e dos jovens na educação
escolar. Presentemente, o seu programa de ação confere especial relevo à inovação pedagógica,
tanto no âmbito da 2.ª Comissão Especializada Permanente, como através de estudos e iniciativas
que procuram compreender e visibilizar o trabalho pedagógico das escolas.
A tónica dos discursos teóricos e políticos numa visão humanista e democrática da educação
abre caminho a iniciativas de inovação pedagógica que procurem aproximações a essa visão.
Contudo, a inovação pedagógica é um fenómeno situado, afetado por fatores de diversa ordem, o
que nos conduz à segunda dimensão considerada — a sua orientação local e sistémica. Por um
lado, a inovação deverá articular -se com variáveis situacionais como as políticas educativas e as
orientações curriculares nacionais, a cultura da escola e as comunidades em que esta se insere, a
diversidade dos educandos e as trajetórias e aspirações dos educadores; por outro lado, o âmbito, o
impacto e a sustentabilidade da inovação dependem, em grande medida, da existência de políticas
e medidas de incentivo e apoio à mudança nas escolas, das condições de trabalho dos educado-
res e da monitorização e avaliação da mudança. Os programas nacionais de incentivo à inovação
pedagógica tornaram -se evidentes no período que decorreu entre o segundo quinquénio dos anos
90 do século XX e os primeiros anos do século XXI. A criação do Instituto de Inovação Educacional
impulsionou iniciativas e medidas com a finalidade de incentivar, apoiar, estudar e divulgar a inovação
pedagógica. Entre elas constam as medidas 1 e 4 do SIQE — Sistema de Incentivos à Qualidade da
Educação, concretizadas, respetivamente, no Concurso “Inovar, Educando/Educar, Inovando” e na
“Organização de atividades de intercâmbio, entre as escolas, de projetos de inovação ou de inves-
tigação”, assim como o Programa Boa Esperança|Boas Práticas. Posteriormente, as medidas com
incidência nos incentivos à inovação, nomeadamente os financeiros, ou na discussão, valorização
e divulgação de práticas de inovação pedagógica, são o PO CH — Programa Operacional Capital
Humano, que tem como um dos eixos de ação a qualidade e a inovação do sistema de educação
e formação, e o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar. A par do fomento deste tipo
de programas, será necessário garantir condições nas escolas para o desenvolvimento da inovação
pedagógica, como a autonomia curricular e pedagógica, a desburocratização do trabalho docente e
a estabilização do corpo docente. Nas escolas, será necessário criar culturas de inovação assentes
na indagação das práticas, na colaboração e no desenvolvimento profissional, assim como desen-
volver comunidades de prática (multi)disciplinares e parcerias com o exterior (famílias, autarquias e
outros parceiros locais, outras escolas, instituições de ensino superior, organizações profissionais),

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