As práticas comerciais abusivas e o contrato de seguro

AutorFabiana SILVEIRA KARAM
CargoJuiz de Direito do Estado do Paraná no Brasil
1. Breve introdução

Considerada a evolução em matéria contratual ao longo dos tempos, pode-se dizer que não tem sido tarefa fácil a de inserir o contrato de seguro no sistema do direito do consumo. A começar por sua natureza jurídica, que é tema intrincado de dificuldades. Poder-se-ia qualificá-lo como prestação de serviço? Entraria nesta categoria a prestação de garantia ? A obrigação de pagar uma indenização, configurado o sinistro, não seria um dare ? É contrato aleatório ou comutativo?

Veja-se que o CoDeCon, em seu art. 3°, não se refere a contrato, mas sim a atividade, verbis: "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista" (grifos nossos).

E se considerarmos o significado de serviços, trata-se de "atividades, benefícios ou satisfações que são oferecidos à venda (exemplos: corte de cabelo, consertos)".

Mas como explicar a ação da seguradora que, tendo recebido o prêmio, não pagou qualquer indenização, porque não verificado o sinistro? A obrigação assumida pela seguradora é exigível se, e somente se verificado o risco.

Se analisarmos apenas por esta ótica, concluiremos que o contrato de seguro nem sempre se configura em prestação de serviços, eis que o "benefício" contratado pelo segurado somente é usufruído quando ocorrido o risco, podendo o contrato ser renovado por várias vezes sem que, todavia, tal se verifique.

Poderemos aceitar que existe uma efetiva prestação de serviços pela seguradora, que perdura durante todo o contrato, se partirmos de sua base econômica. E isso porque a ela incumbe fazer a administração dos prêmios, sem a qual o contrato de seguro seria impraticável.

Ademais, é claro que a seguradora presta a garantia de que cobrirá o dano, se ocorrer o sinistro.

A má gestão dos valores pagos pelo segurado poderia acarretar o descumprimento do contrato, eis que comprometeria o ativo da empresa.

Colocados estes pressupostos, pensamos que a administração destes valores pela seguradora e a garantia do interesse segurado constituem a prestação de um serviço aos segurados.

Ademais, o Código de Defesa do Consumidor, sabe-se, refere-se à relação de consumo.

A relação de consumo possui, basicamente, dois elementos, consumidor e fornecedor.

Para Othon Sidou, "consumidor é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que contrata, para utilização, a aquisição de mercadoria ou a prestação de serviço, independentemente do modo de manifestação de vontade, isto é, sem forma especial, salvo quando a lei expressamente a exigir" (Proteção ao consumidor, p. 2 Rio : Forense, 1972).

Podemos então concluir que o contrato de seguro se submete, sim, às disposições do Código de Defesa do Consumidor.

Aliás, observando o sistema especial instaurado pelo Código de Defesa do Consumidor, é lícito afirmar que a maior parte dos contratos de serviços a ele se submetem, sendo que uma outra parte fica adstrita ao direito comum.

Dentro desta ótica, ressaltando que o contrato de seguro encontra-se, de certo, sob a tutela do CoDeCon, passamos a examinar dois capítulos por ele regulados, em especial: o dever de informação, as práticas comerciais abusivas e as cláusulas abusivas.

2. Dever de Informação

Dentre os direitos básicos do consumidor, elencados no artigo 6° do CDC, está o direito à informação adequada sobre os produtos e serviços.

Podemos afirmar que o dever de informação, tratado de há muito pela doutrina e presente em inúmeras leis, no caso da lei consumeirista apresentas duas frentes: transparência, ademais apregoada pelo respectivo artigo 4 o., e ampla informação, no que se refere aos a) produtos e serviços oferecidos e b) quanto ao conteúdo das cláusulas contratuais a serem elaboradas pelas partes e que, posteriormente, serão por ambas observadas.

No contrato de seguro, as técnicas de venda pessoal estão submetidas ao dever de informar.

Se violado o direito à informação, o contrato firmado não obrigará o consumidor, conforme dispõe o artigo 46 do CDC.

No contrato de seguro, por exemplo, o segurado tem o direito de ser informado previamente pelo corretor do conteúdo da apólice e de ser devidamente alertado, quando necessária a inclusão de cláusulas especiais.

O direito de ser informado da possibilidade de não correspondência entre proposta e a apólice, sob pena de não se obrigar com a seguradora (art. 46 do CoDeCon).

Deve igualmente saber que o CoDeCon proíbe práticas abusivas (art. 39 do CoDeCon); que a proposta de seguro e a apólice devem obedecer aos parâmetros formais do artigo 54, §§ 3° e 4° do CoDeCon; e, ainda, que dentre as disposições legais de proteção ao consumidor está a proibição das cláusulas abusivas (art. 51).

3. Práticas comerciais abusivas

O tema das práticas comerciais abusivas possui extrema relevância. Todavia, poucos a ele atentam na prática...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT