Acórdão n.º 2/2002, de 26 de Novembro de 2002

Acórdão n.º 2/2002 Processo n.º 2869/2000 Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1 - Relatório. - Júlio de Jesus Romão requereu, em 19 de Julho de 1999, no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz, contra LACTOGAL - Produtos Alimentares, S. A., providência cautelar de suspensão de despedimento como preliminar da respectiva acção de impugnação, providência que foi indeferida por decisão de 18 de Agosto de 1999 daquele Tribunal (fls. 35 e 36).

Desta decisão agravou o requerente para o Tribunal da Relação de Coimbra (fls. 39 a 43).

Nas suas contra-alegações (fls. 50 a 55), suscitou a requerida questão prévia da inutilidade superveniente da lide já que, tendo a decisão de despedimento sido comunicada ao requerente em 9 de Julho de 1999, este, nos 30 dias posteriores, não propusera a correspondente acção de impugnação, o que, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, implicou ter ficado sem efeito o pedido de suspensão.

Por despacho de 11 de Novembro de 1999 (fl. 66), o juiz do Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz declarou sem efeito o pedido de suspensão por o autor ter recebido a comunicação do despedimento em 9 de Julho de 1999 e só em 16 de Setembro desse ano ter proposto a correspondente acção de impugnação, quando já havia decorrido o prazo de caducidade estipulado no artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho. Consequentemente, julgou extinto o recurso de agravo interposto da decisão de indeferimento da providênciarequerida.

Deste despacho interpôs o recorrente recurso de agravo (fls. 67 a 69), a que foi negado provimento pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 4 de Maio de 2000 (fls. 91 a 100), com a seguinte argumentação: 'B) A questão que se nos coloca no presente recurso consiste apenas em saber se o pedido de suspensão (que foi indeferido - fl. 36 - e de cuja decisão se agravou, ut fl. 39) ficou sem efeito, devido à circunstância de o requerente não ter proposto a competente acção de impugnação do despedimento no devido prazo, como se decidiu.

Vejamos, pois.

Sob a epígrafe 'Caducidade da providência' dispõe o artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho que 'O pedido de suspensão ou a suspensão decretada ficam sem efeito se o trabalhador, no prazo de 30 dias a contar da rescisão, não propuser a acção de impugnação do despedimento ou se esta for julgada improcedente'.

A problemática axial do presente caso analisa-se em saber se o referido prazo de proposição da acção, sendo contínuo, se suspende ou não durante as fériasjudiciais.

É fora de dúvida que se está perante um prazo de caducidade, de que aliás o Tribunal até conhece oficiosamente, como prescreve o n.º 2 do artigo 45.º do Código de Processo do Trabalho.

Como é sabido, o instituto da caducidade visa dar satisfação, por regra, a interesses de natureza/ordem pública e social.

Subjacente à norma do artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho estão essas mesmas razões, que lhe conferem, por isso, carácter imperativo, de tal ordem incisivas que a caducidade aí prevista se tem por estabelecida como sendo-o em matéria excluída da disponibilidade das partes, uma vez estabelecido o princípio do seu conhecimento oficioso - cf. Leite Ferreira, Código de Processo do Trabalho Anotado, 1989, pp. 186-187.

Como preceitua o artigo 298.º, n.º 2, do Código Civil, quando, por força da lei, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo são aplicáveis as regras da caducidade.

E o artigo 328.º do mesmo Código prescreve que 'O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine'.

Por via disso, não são aplicáveis a tal prazo as regras constantes do artigo 279.º (a que se deve recorrer 'apenas em casos de dúvida', sendo os princípios nele contidos de natureza supletiva e interpretativa, apud Pires de Lima e Antunes Varela em nota ao referido artigo, Código Civil Anotado, 4.' ed.

revista e actualizada, p. 256), que só se aplicam na falta de disposição especial em contrário - artigo 296.º do Código Civil.

Sendo o prazo em causa um prazo judicial, é expressamente um prazo de propositura de acção, não se suspendendo nas férias, sábados, domingos e feriados, como se vem entendendo nesta Secção - cf., entre outros, o Acórdão de 9 de Dezembro de 1993, sumariado no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 432, p. 443.

Mesmo relativamente aos prazos processuais, cuja regra geral é a da continuidade, dispõe a versão actual do artigo 144.º do Código de Processo Civil, no seu n.º 4, que 'os prazos para a propositura de acções seguem o regime dos números anteriores', (suspendendo-se, por isso, durante as férias [...]) [...] mas apenas os prazos de propositura de acções 'previstos neste Código'! Mantém-se assim a bondade e actualidade de entendimento oportunamente estabelecido nesta Secção, que se reitera.

A acção de impugnação não foi proposta nem até 6 (?) de Agosto, nem até 6 de Setembro, pelo que, nos termos sobreditos, não foi respeitado o prazo de caducidade a que alude o artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, razão por que, tendo caducado o referido pedido de suspensão do despedimento, como bem se decidiu, não merece qualquer censura a decisão impugnada.' Deste acórdão interpôs o agravante recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 678.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, qualificando-o como recurso de revista (fls. 102 a 104), tendo, a convite do relator neste Supremo, formulado as seguintes conclusões (fl. 118): '

  1. A presente decisão é recorrível, nos termos do artigo 678.º, n.º 4, do Código de Processo Civil (aplicável subsidiariamente ao Código de Processo do Trabalho), por se verificarem todos os requisitos legalmente exigíveis, desde logo haver contradição de acórdãos de Relações (n.º 4) sobre a mesma questão essencial de direito, estando a decisão recorrida em manifesta contradição com pelo menos dois outros acórdãos da Relação, nomeadamente o acórdão fundamento da Relação de Lisboa de 16 de Março de1982.

  2. Essa questão é a da validade de uma providência cautelar da propositura da acção principal no prazo de 30 dias a contar de certo facto e o problema que se põe é o da determinação da data em que termina esse prazo, se o mesmo ocorrer em férias judiciais.

  3. Não há lugar a recurso ordinário, por razão diferente da alçada, dado que é entendimento generalizado que o artigo 44.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho só admite recurso para a Relação, havendo nesse sentido jurisprudência assente (Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Maio de 1984, em Acórdãos Doutrinais, n.º 270, p. 790, de 28 de Novembro de 1986, em Acórdãos Doutrinais, n.º 304, p. 596, e de 8 de Abril de 1987, em Acórdãos Doutrinais, n.º 270, p. 790, e Acórdão da Relação de Coimbra de 10 de Março de 1987, na Colectânea de Jurisprudência, 1987, t. II, p. 125) que não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação em recursos nos termos do artigo 44.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho.

  4. O acórdão recorrido contradiz também flagrantemente o Assento n.º 8/94, de 3 de Maio (Diário da República, 1.' série-A), que expressamente diz que o cômputo destes prazos está submetido às regras do artigo 279.º do Código Civil. Assim, nos termos do artigo 678.º, n.º 4, a orientação do presente acórdão não está fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, antes pelo contrário, e a 4.' Secção do Supremo Tribunal de Justiça tem entendimento diverso do acórdão recorrido, a propósito do artigo 13.º, n.º 2, alínea a), da Lei dos Despedimentos, como se alcança do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Fevereiro de 1999, em que foi relator o Sr. Conselheiro Padrão Gonçalves e foi proferido na revista n.º 346/98, da 4.' Secção (cf. a propósito o site da Internet do STJ).

  5. É que o que está em causa é saber se o artigo 279.º do Código Civil que se refere ao termo dos prazos deve aqui ser aplicado, quando o acórdão recorrido entende com fundamento no artigo 328.º do Código de Processo Civil, o que significa que o acórdão recorrido não fez a distinção entre contagem dos prazos e termo dos prazos, matéria regulada por disposições legais diversas.

  6. No caso concreto o prazo para interpor a acção correu sem suspensão e correu durante as férias, pelo que, terminando no período de férias judiciais, é quanto a este termo que se põe o problema: devendo considerar-se que termina no 1.º dia útil depois das férias, isto é, no dia 15 de Setembro de 1999.

  7. Face à inexistência de norma expressa, que regule no Código de Processo do Trabalho o regime do termo dos prazos, é que se vem aplicar a norma subsidiária do Código Civil, uma vez que o Código de Processo Civil estabeleceu um regime próprio e exclusivo, que, quanto a esta matéria, resulta da combinação dos n.os 2 e 3 com o n.º 4 do artigo 144.º do Código de Processo Civil: quando o prazo para a propositura de acções previstas no Código de Processo Civil termina em dia que os tribunais estão fechados, mesmo em caso de tolerância de ponto, transfere-se para o 1.º dia útil seguinte.

  8. Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e formulado acórdão uniformizador de jurisprudência que decida interpretar o artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho no sentido de que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT