Acórdão n.° 1/2010 de 3 de Dezembro de 2009 do Supremo Tribunal de Justiça

Processo n ° 216/09.4YFLSB

Acordam, no Plenário do Supremo Tribunal de Justiça:

1 - A 31 de Maio de 2006, Vodafone Portugal - Comunicações Pessoais, S. A., instaurou contra TRANSTÂNIA - Transportes Rodoviários, L.da, uma acção na qual pediu a sua condenação no pagamento de ¤ 12 717,72, acrescidos de juros de mora vencidos (no montante de ¤ 5158,10) e vincendos.

Para o efeito, e em síntese, alegou que, no exercício da actividade de prestação «de serviços telefónicos no âmbito da exploração do seu serviço móvel terrestre», prestou serviços à ré «na sequência da contratação do serviço efectuado pela ré em 1 de Junho de 2000», dos quais ficou por pagar a quantia de ¤ 6498,93; que celebrou com a ré três contratos, «ao abrigo da Proposta de Fidelização de Cliente»; que esses contratos previam penalidades para o caso de serem desactivados os serviços correspondentes antes de decorrido determinado período de tempo, o que veio a suceder, por falta de pagamento, ascendendo a ¤ 5672,79 a quantia a pagar por tal motivo; e que a ré se tinha constituído em mora, devendo suportar os juros correspondentes.

A ré contestou, sustentando nada dever. Reconheceu ter contratado com a autora a prestação de «serviço telefónico terrestre, cujo protocolo de cooperação foi assinado em 11 de Março de 1999 e do qual faziam parte integrante os anexos A e B, cujo prazo de duração era de 36 meses, tendo como número de conta 3762079 [...]»; mas que dois dos três contratos invocados eram nulos, por não terem sido assinados por dois gerentes, nos termos dos seus estatutos, antes por um só; alegou ter pago as quantias correspondentes a todas as facturas que lhe foram apresentadas; opôs a prescrição do direito ao pagamento dos serviços prestados; e impugnou a versão dos factos alegados pela autora, nomeadamente quanto à existência de um contrato datado de 1 de Junho de 2000, sustentando que «não há qualquer contrato datado de 1 de Junho de 2000, mas sim datado de 11 de Março de 1999, sendo os restantes dois pretensos contratos datados de 7 de Abril de 2000 e 22 de Setembro de 2000 [...], mas que são nulos [...]».

A autora replicou.

Na audiência preliminar, a mesma autora veio «precisar o que consta no artigo 2.° da petição inicial, no sentido de que, como se refere no artigo 15.° da contestação, o protocolo celebrado entre a autora e a ré é datado de 12 de Março de 1999, mas os serviços só foram activados na rede em 1 de Junho de 2000 e prestados a partir dessa data» (acta de fls. 100).

No despacho saneador, afastou-se a invalidade dos contratos oposta pela ré e remeteu-se para decisão final o conhecimento da excepção de prescrição.

Por sentença de fls. 121, a acção foi julgada parcialmente procedente. A ré foi condenada a pagar à autora a quantia de ¤ 6498,93, relativa a serviços prestados, acrescida de juros vencidos até 31 de Maio de 2006 (¤ 2780,99) e vincendos, à taxa legal, desde 1 de Junho de 2006 até integral pagamento.

Em síntese, o tribunal, citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Outubro de 2007 (disponível em www.dgsi.pt como processo n.° 07A2656), considerou ter sido «inteiramente respeitado o prazo para apresentação das facturas», previsto no n.° 5 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 381-A/97, de 30 de Dezembro; «que a ré deixou de pagar os serviços prestados a partir de 18 de Junho de 2001 [...] pelo que o prazo prescricional da dívida ocorreu cinco anos depois ou seja em 18 de Junho de 2006» e que, portanto, a acção entrou em juízo «ainda não estavam decorridos os cinco anos que o artigo 310.°, alínea g), do CC prevê para a extinção do direito».

Já quanto às penalidades invocadas, o pedido foi julgado improcedente, por «impossibilidade de determinação do valor da penalidade associada aos contratos celebrados com a ré».

A sentença foi confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de fls. 168, proferido em recurso de apelação interposto pela ré, e que aderiu à fundamentação ali exposta.

Novamente recorreu a ré, agora para o Supremo Tribunal da Justiça. O recurso foi recebido como revista, com efeito devolutivo.

Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões:

1.ª A autora moveu a acção já para além do prazo que lhe era facultado - até seis meses após as prestações dos serviços de telecomunicações; 2.ª É a Lei n.° 23/96, artigo 10.°, n.° 1, e o Decreto-Lei n.° 381-A/97 que devem ser aplicados ao caso dos autos e não o artigo 310.°, alínea g), do C. Civil.

3.ª Ao ser invocada pela ré a prescrição dos créditos a mesma deve proceder.

4.ª A prescrição invocada é uma prescrição extintiva e não presuntiva nos termos do artigo 10.°, n.° 1, da Lei n.° 23/96, aplicável ao serviço de telefone por força do seu artigo 1.°, n.° 2, alínea d), pelo que a ré ora recorrente nada deve pagar à autora ora Recorrida.

5.ª Tanto a sentença da primeira Instância como o douto Acórdão da Relação violaram o disposto na Lei n.° 23/96 e o Decreto-Lei n.° 381-A/97.

A recorrida contra-alegou, concluindo desta forma:

1 - A Lei n.° 23/96, de 26 de Julho, não se aplica aos serviços prestados pela recorrente que não são essenciais, nem tão pouco o legislador os considera como tais.

2 - Por força do artigo 1.° da Lei n.° 23/96, este diploma só se aplica à prestação de serviços públicos essenciais, nomeadamente os serviços de telefone prestados pela Rede fixa.

3 - Mesmo que a referida lei fosse aplicável aos serviços da Recorrida, o recurso não teria provimento já que o artigo 10.°, n.° 1, em causa, apenas impõe a necessidade de a Vodafone exigir o pagamento no prazo de seis meses, como sucedeu.

4 - Na verdade, a recorrida exigiu o pagamento das facturas em débito à Recorrente, muito antes do termo do prazo estipulado no artigo 10.°, n.° 1, da referida lei.

5 - Se assim não se entender, sempre se dirá que a prescrição só poderá ter natureza presuntiva.

6 - O decurso do prazo legal nas prescrições presuntivas não extingue a obrigação. Apenas faz presumir o pagamento. Findo o prazo prescricional, o direito do credor não se extingue.

7 - Exigido o pagamento das facturas em débito com a sua apresentação no prazo de seis meses e não tendo sido efectuado o pagamento, começa a correr o prazo prescricional previsto no artigo 310.°, alínea g), do Código Civil.

8 - Não existiu qualquer violação do disposto na Lei n.° 23/96 e no Decreto-Lei n.° 381-A/97.

9 - O prazo prescricional a aplicar-se ao caso sub judice é o de cinco anos, previsto no artigo 310.°, alínea g), do Código Civil.

3 - A matéria de facto que vem provada das instâncias é a seguinte (transcreve-se do acórdão recorrido):

1 - A autora é uma sociedade comercial que presta serviços telefónicos no âmbito da exploração do seu serviço móvel terrestre.

2 - A autora contratou com a ré a prestação de serviços por contrato datado de 11 de Março de 1999.

3 - A Ré, nos termos acordados, deveria pagar à autora o respectivo preço no prazo de 15 dias a contar da data das respectivas facturas.

4 - Nos termos da cláusula terceira das `Proposta[s] de Condições Particulares de Subscrição do Serviço Móvel Terrestre da TELECEL', subscritos em 7 de Abril de 2000 e 22 de Setembro de 2000 e constantes de fls. 14 e 15 dos autos, respectivamente:

3 - Se o signatário denunciar ou de qualquer modo fizer cessar a prestação do(s) serviço(s) antes de decorrido o prazo acordado, compromete-se a efectuar, de imediato, o pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo. Para este efeito considera-se o valor mensal do plano de tarifas associado ao(s) respectivo(s) serviço(s), de acordo com o indicado no ponto 1, tendo em conta as tarifas em vigor à data de assinatura deste aditamento.'

5 - Nos termos da cláusula 10.ª do `Protocolo de Cooperação', subscrito em 11 de Março de 1999, entre ré e Autora, como Primeira e Segunda outorgantes, respectivamente, e constante de fls. 10 e 11 dos autos:

"1 - A rescisão do presente protocolo por parte do Primeiro outorgante, antes de decorrido o prazo referido na cláusula 2.ª, implicará a obrigação de pagar de imediato à TELECEL as facturas vencidas e não pagas e ainda a totalidade das mensalidades ou `valores mensais' vincendos, por cada SMT subscrito no âmbito deste protocolo, até ao termo do referido prazo, tendo estas por base o valor da mensalidade ou `valor mensal' constante do ponto 7.1 do anexo A.

2 - No caso previsto no número anterior, o Primeiro outorgante deverá ainda pagar, de imediato, o valor correspondente aos consumos mínimos previstos no ponto 2 da cláusula 3.ª que seriam devidos até ao termo do prazo referido na cláusula 2.ª Se o consumo médio mensal efectivo tiver sido inferior ao previsto no ponto dois da cláusula 3.ª, o Primeiro outorgante deverá ainda proceder, de imediato, ao pagamento do valor correspondente ao respectivo diferencial, até à data da rescisão [...]"

6 - Os serviços referidos no contrato a que se alude em B) foram activados na rede pela autora em 1 de Junho de 2000, data a partir da qual a autora prestou à ré os seu serviços.

7 - A Ré, apesar de várias vezes instada para proceder ao pagamento, deve à autora o montante de ¤ 6498,93, relativo a serviços prestados.

8 - No exercício da sua actividade, a autora prestou ainda os seus serviços à ré na sequência de três contratos, ao abrigo da Proposta de Fidelização de Clientes, e em virtude dos referidos contratos foram-lhe atribuídos os equipamentos e serviços nele constantes.

9 - E, em contrapartida, a ré comprometia-se permanecer na rede Vodafone por um período ininterrupto de 36 meses, respectivamente.

10 - Os serviços foram desactivados a 15 de Maio de 2002 por falta de pagamento.

11 - A Ré, apesar de várias vezes instada para proceder ao pagamento, deve à autora o montante de ¤ 6498,93, relativo a serviços prestados.

12 - Mensalmente a autora enviou à ré as facturas correspondentes aos serviços prestados.

Foi ainda havido como...

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