Decreto-Lei n.º 69/2023

Data de publicação21 Agosto 2023
ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/69/2023/08/21/p/dre/pt/html
Data06 Janeiro 2030
Número da edição161
SeçãoSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros
N.º 161 21 de agosto de 2023 Pág. 10
Diário da República, 1.ª série
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS
Decreto-Lei n.º 69/2023
de 21 de agosto
Sumário: Estabelece o regime jurídico da qualidade da água destinada ao consumo humano,
transpondo diversas diretivas.
A qualidade da água destinada ao consumo humano tem vindo a apresentar, nas últimas
décadas, uma evolução muito significativa em Portugal. Esta evolução resulta, não só, do quadro
legislativo que, desde os anos 90, assegura a transposição das diretivas europeias relativas à
qualidade da água para consumo humano, mas também do modelo de regulação da qualidade da
água que tem vindo a ser aperfeiçoado e que tem permitido a melhoria contínua do controlo dos
valores paramétricos da água fornecida aos consumidores, bem como a deteção e correção de
situações que comportem risco para a saúde humana.
Na sequência da conclusão da iniciativa de cidadania europeia sobre o direito à água («inicia-
tiva Right2Water»), a Comissão lançou uma consulta pública à escala da União Europeia e realizou
uma avaliação da adequação e da eficácia da Diretiva n.º 98/83/CE. Esse exercício tornou evidente
a necessidade de introduzir melhorias, em particular nos domínios da definição da lista de valores
paramétricos baseados na qualidade da informação a prestar aos consumidores, bem como no
âmbito das disparidades existentes entre sistemas de aprovação de materiais e produtos que entram
em contacto com a água destinada ao consumo humano e das consequências que têm sobre a
saúde humana e, bem assim, a necessidade de promover a consciencialização para as perdas de
água decorrentes do subinvestimento na manutenção e renovação das infraestruturas.
Por outro lado, a iniciativa Right2Water identificou que parte da população, em particular os
grupos mais marginalizados, não tinham acesso a água destinada ao consumo humano, sendo
a garantia desse acesso um compromisso assumido no âmbito do Objetivo de Desenvolvimento
Sustentável 6 da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. Foi neste
contexto que foi adotada a Diretiva (UE) n.º 2020/2184, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
16 de dezembro de 2020 [Diretiva (UE) n.º 2020/2184], que ora se transpõe, a qual, mantendo o
objetivo de proteger a saúde humana de qualquer contaminação da água destinada ao consumo
humano, assegurando a sua salubridade e limpeza, vem preconizar a melhoria do acesso à água
destinada ao consumo humano para todos na União Europeia. Para o efeito, estabelece um con-
junto de requisitos mínimos a que está sujeita a água destinada ao consumo humano, impondo aos
Estados -Membros a adoção de todas as medidas necessárias para garantir que a água destinada
ao consumo humano não contém quaisquer microrganismos e parasitas, nem substâncias que, em
quantidades ou concentrações, em determinadas circunstâncias, constituam um perigo potencial
para a saúde humana, e que essa água satisfaz os referidos requisitos mínimos.
No que concerne à lista de valores paramétricos, destaca -se a introdução de novos parâmetros
como a Legionella, outros subprodutos da desinfeção, como os ácidos haloacéticos ou o desregu-
lador endócrino bisfenol A, aos quais são acrescentados outros compostos na lista de vigilância a
publicar pela Comissão Europeia e, ainda, as substâncias perfluoroalquiladas (PFAS). Na revisão
da lista de valores paramétricos salienta -se, igualmente, a definição de valores paramétricos mais
restritivos para o crómio ou para o chumbo, embora com a previsão de períodos de transição que
permitem a adoção de medidas corretivas para garantir a observância dos mesmos.
Relativamente à implementação da abordagem de avaliação e gestão do risco, prevê -se
que a mesma deve ser completa, abrangendo toda a cadeia de abastecimento, desde a bacia de
drenagem, a captação, o tratamento da água, o armazenamento e a distribuição, até ao ponto de
conformidade. Assim, a avaliação e gestão do risco passa a incidir sobre os três componentes
principais da cadeia de abastecimento: as bacias de drenagem dos pontos de captação de água
destinada ao consumo humano, os sistemas de abastecimento públicos e os sistemas de distribui-
ção predial, com particular incidência nas instalações prioritárias.
Prevê -se, ainda, que as avaliações do risco sejam periodicamente revistas, nomeadamente
em resposta a ameaças decorrentes de fenómenos meteorológicos extremos relacionados com
o clima, de alterações conhecidas das atividades humanas na zona de captação ou em resposta
a incidentes relacionados com a origem da água, devendo, igualmente, ser assegurado um inter-
câmbio permanente de informações entre as autoridades competentes e as entidades gestoras
dos sistemas de abastecimento de água.
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A existência de diferentes sistemas de aprovação dos materiais e produtos em contacto com
a água destinada ao consumo humano no espaço da União Europeia é outro dos aspetos a que
iniciativa Right2Water confere especial relevo. Assim, a referida diretiva estabelece requisitos míni-
mos aplicáveis aos produtos que entram em contacto com a água destinada ao consumo humano,
com o intuito de alcançar um nível de proteção da saúde humana idêntico para todos os europeus e
um melhor funcionamento do mercado interno. Neste enquadramento, o presente decreto -lei esta-
belece um conjunto de princípios e requisitos que decorrem da referida diretiva, relacionados com
o processo de seleção dos produtos a utilizar no tratamento da água e dos materiais a aplicar nas
infraestruturas novas ou naquelas que sejam objeto de manutenção ou renovação, a fim de garantir
que não comprometem a saúde humana direta ou indiretamente, não afetam negativamente a cor,
o cheiro ou o sabor da água, não promovem o crescimento microbiano na água ou não causam
a migração de contaminantes para a água a níveis mais elevados do que o necessário, tendo em
conta o fim a que se destinam.
Estes princípios e requisitos devem ser desenvolvidos pela Entidade Reguladora dos Serviços
de Águas e Resíduos (ERSAR) através da aprovação, sob a forma de regulamento, de um sistema
de aprovação nacional para os produtos em contacto com a água, quer sejam substâncias e pro-
dutos químicos utilizados no tratamento da água ou materiais existentes nas instalações, desde a
captação, o tratamento, a rede de adução, a rede de distribuição e no sistema de distribuição pre-
dial até à torneira do utilizador ou ao ponto de utilização de água destinada ao consumo humano.
Quanto à melhoria das condições de acesso à água para consumo humano, que constitui uma
condição essencial para cumprir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, assume particular
relevância a identificação de todos os que não têm acesso ou têm acesso limitado, designadamente
os grupos mais vulneráveis e marginalizados, e a adoção de medidas que mitiguem as razões que
impedem ou dificultam este acesso.
Importa, ainda, sublinhar que, tendo em vista tornar os utilizadores mais conscientes das
consequências do consumo de água, a Diretiva (UE) n.º 2020/2184, em linha com o 7.º Programa
Geral de Ação da União para 2020 em matéria de ambiente, veio reforçar o direito de acesso à
informação sobre a qualidade da água, tornando obrigatória a disponibilização desta informação
online, de forma fácil e personalizável, podendo ser solicitado o acesso a esta e outras informações
por outros meios, mediante pedido devidamente justificado.
Neste contexto, o presente decreto -lei procede à alteração do Decreto -Lei n.º 194/94, de 20 de
agosto, na sua redação atual, que estabelece o regime jurídico dos serviços municipais de abas-
tecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos,
e do Decreto -Lei n.º 114/2014, de 21 de junho, na sua redação atual, que consagra a obrigação
da faturação detalhada relativamente aos serviços públicos de abastecimento público de água, de
saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos, prevendo a obrigação de divul-
gação no sítio na Internet das entidades gestoras de informação sobre, designadamente, métodos
de produção de água, incluindo informações gerais sobre as formas de tratamento e desinfeção da
água utilizada, informações relevantes sobre a avaliação do risco e a gestão do risco do sistema
de abastecimento e recomendações sobre possíveis formas de reduzir o consumo de água e evitar
riscos para a saúde devido a águas estagnadas.
Faz -se notar que estas obrigações passam a ser impostas, igualmente, às entidades gestoras
dos serviços de abastecimento de água de titularidade estatal, através da alteração ao Decreto -Lei
n.º 92/2013, de 11 de julho, na sua redação atual, que define o regime de exploração e gestão dos
sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de
recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos.
Por fim, importa referir que, sendo inegável que o indicador água segura tem tido uma evolu-
ção assinalável, não pode ser descurada a necessidade crescente de utilização mais racional dos
recursos hídricos e de manutenção e renovação das infraestruturas, pelo que a avaliação das perdas
de água nos sistemas de abastecimento se revela essencial. O processo de avaliação das perdas
de água já se encontra em curso em Portugal desde o início do século චචඑ, com a implementação
do sistema de avaliação da qualidade do serviço pela ERSAR mas, no atual quadro legal europeu,
esta avaliação torna -se obrigatória, bem como a comunicação à Comissão Europeia dos resultados
da avaliação efetuada e do plano de ação para a redução de perdas.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, a Associação Nacional
de Municípios Portugueses e a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos.
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Diário da República, 1.ª série
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o se-
guinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
1 — O presente decreto -lei estabelece o regime jurídico da qualidade da água destinada ao
consumo humano, transpondo para a ordem jurídica nacional:
a) A Diretiva n.º 2013/51/EURATOM, do Conselho, de 22 de outubro de 2013, que estabe-
lece requisitos para a proteção da saúde do público em geral no que diz respeito às substâncias
radioativas presentes na água destinada ao consumo humano;
b) A Diretiva (UE) n.º 2020/2184, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de de-
zembro de 2020, relativa à qualidade da água destinada ao consumo humano (Diretiva (UE)
n.º 2020/2184).
2 — O presente decreto -lei procede, ainda:
a) À terceira alteração ao Decreto -Lei n.º 194/2009, de 20 de agosto, alterado pelo Decreto-
-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e pela Lei n.º 12/2014, de 6 de março, que estabelece o regime
jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas
residuais e de gestão de resíduos urbanos;
b) À terceira alteração ao Decreto -Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, alterado pelos Decretos-
-Leis n.os 72/2016, de 4 de novembro, e 16/2021, de 24 de fevereiro, que define o regime de ex-
ploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água
para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento
de resíduos sólidos;
c) À segunda alteração ao Decreto -Lei n.º 114/2014, de 21 de junho, alterado pela Lei
n.º 41/2018, de 8 de agosto, que estabelece os procedimentos necessários à implementação do
sistema de faturação detalhada relativamente aos serviços públicos de abastecimento público de
água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 — O presente decreto -lei aplica -se às águas destinadas ao consumo humano, com exce-
ção das:
a) Águas minerais naturais, abrangidas pelo regime jurídico decorrente da Lei n.º 54/2015,
de 22 de junho;
b) Águas de nascente abrangidas pelo Decreto -Lei n.º 156/98, de 6 de junho, na sua re-
dação atual, exceto no que se refere aos valores estabelecidos nas partes B e C do anexo I ao
presente decreto -lei e do qual faz parte integrante, para os parâmetros fixados pela entidade
licenciadora;
c) Águas que são produtos medicinais, na aceção da alínea kk) do n.º 1 do artigo 3.º do
Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, na sua redação atual;

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