Decreto-Lei n.º 109-E/2021

ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/109-e/2021/12/09/p/dre/pt/html
Data de publicação09 Dezembro 2021
Número da edição237
SeçãoSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros
N.º 237 9 de dezembro de 2021 Pág. 21-(19)
Diário da República, 1.ª série
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS
Decreto-Lei n.º 109-E/2021
de 9 de dezembro
Sumário: Cria o Mecanismo Nacional Anticorrupção e estabelece o regime geral de prevenção
da corrupção.
No Programa do XXII Governo Constitucional foi conferido um lugar de destaque às políticas
anticorrupção, enquanto instrumento de construção de uma sociedade mais justa, igualitária e
inclusiva e do restabelecimento de laços de confiança sólidos entre os cidadãos, as comunidades
e as suas instituições democráticas.
As democracias comportam uma vasta complexidade na sua organização, designadamente no
que concerne à regulação das atividades económicas e às interações entre as diferentes esferas
de atividade, pública e privada.
O fenómeno da corrupção ofende a essência da democracia e os seus princípios fundamentais,
designadamente os da igualdade, transparência, livre concorrência, imparcialidade, legalidade,
integridade e a justa redistribuição de riqueza.
Por outro lado, os bens jurídicos individuais, por tradição, são mais facilmente identificáveis e
protegidos, ao contrário do que sucede com os bens jurídicos macrossociais, que possuem uma
natureza abstrata e, por conseguinte, de maior dificuldade na sua identificação, reclamando um
superior nível de proteção.
Considerando estes fatores foi constituído, sob a égide da área governativa da justiça, um
grupo de trabalho multidisciplinar tendo por missão avaliar as diferentes dimensões do fenómeno
e apresentar uma proposta de Estratégia Nacional Anticorrupção.
Em 18 de março de 2021, na sequência de um longo período de reflexão e de extensa audição
pública, envolvendo a academia, as magistraturas, profissionais do direito e de outros ramos do
saber, o Governo aprovou a versão final da Estratégia Nacional Anticorrupção 2020 -2024 (Estra-
tégia), nos termos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 37/2021, de 6 de abril.
A Estratégia, perspetivando com o mesmo grau de importância e necessidade a prevenção,
a deteção e a repressão da corrupção, erige sete prioridades: i) melhorar o conhecimento, a for-
mação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade; ii) prevenir e detetar
os riscos de corrupção na ação pública; iii) comprometer o setor privado na prevenção, deteção e
repressão da corrupção; iv) reforçar a articulação entre instituições públicas e privadas; v) garantir
uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria de repressão da corrup-
ção, melhorar o tempo de resposta do sistema judicial e assegurar a adequação e efetividade da
punição; vi) produzir e divulgar periodicamente informação fiável sobre o fenómeno da corrupção;
e vii) cooperar no plano internacional no combate à corrupção.
Nas últimas décadas, assistiu -se a um esforço considerável na harmonização dos enqua-
dramentos legais em todo o mundo, através da adoção de convenções multilaterais. Estas con-
venções, todavia, versaram maioritariamente sobre a repressão da corrupção, e não sobre a sua
prevenção.
Em percurso idêntico, Portugal veio prevendo um vasto leque de crimes relativos a práticas
de corrupção ou práticas similares, quer no Código Penal (por exemplo, recebimento indevido de
vantagem, corrupção passiva, corrupção ativa, peculato, participação económica em negócio e
concussão), quer em leis penais avulsas, como a que determina os crimes da responsabilidade de
titulares de cargos políticos, a que prevê os crimes de corrupção cometidos no comércio interna-
cional e na atividade privada, ou a que pune comportamentos antidesportivos.
Contudo, a par da concretização das medidas propostas no âmbito da repressão, mostra -se
imprescindível a existência de um sistema eficaz de prevenção de fenómenos de corrupção.
A fonte da presente iniciativa legislativa é, por conseguinte, a Estratégia, e o seu objetivo é o
de concretizar a proposta de criação de um regime geral da prevenção da corrupção.
N.º 237 9 de dezembro de 2021 Pág. 21-(20)
Diário da República, 1.ª série
Este regime geral da prevenção da corrupção retira do domínio da soft law a implementação
de instrumentos como os programas de cumprimento normativo, os quais deverão incluir os planos
de prevenção ou gestão de riscos, os códigos de ética e de conduta, programas de formação, os
canais de denúncia e a designação de um responsável pelo cumprimento normativo.
São previstas sanções, nomeadamente contraordenacionais, aplicáveis quer ao setor público,
quer ao setor privado, para a não adoção ou adoção deficiente ou incompleta de programas de
cumprimento normativo.
Este regime determina também a implementação de sistemas de controlo interno que asse-
gurem a efetividade dos instrumentos integrantes do programa de cumprimento normativo, bem
como a transparência e imparcialidade dos procedimentos e decisões, prevendo -se igualmente
um regime sancionatório próprio.
Procede -se, igualmente, a alterações ao regime jurídico da atividade de inspeção da admi-
nistração direta e indireta do Estado, por forma a adequá -lo à filosofia subjacente ao presente
decreto -lei.
Com vista à adaptação de todas as entidades abrangidas por este regime, estabelece -se a
sua entrada em vigor e produção de efeitos de forma faseada.
Por outro lado, tal como previsto na Estratégia, é criado o Mecanismo Nacional Anticorrupção,
que assume a natureza de entidade administrativa independente, com personalidade jurídica de
direito público e poderes de autoridade, dotada de autonomia administrativa e financeira, e que
tem por missão a promoção da transparência e da integridade na ação pública e a garantia da
efetividade de políticas de prevenção da corrupção e de infrações conexas.
A criação de um mecanismo com este tipo de funções encontra -se igualmente prevista no ar-
tigo 6.º da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, de 31 de outubro de 2003, ratificada
pelo Decreto do Presidente da República n.º 97/2007, de 21 de setembro.
Nos termos do referido artigo, os Estados Partes devem assegurar a existência de um órgão
independente, dotado dos recursos materiais e humanos necessários ao desenvolvimento de
políticas de prevenção da corrupção e ao melhoramento da informação e conhecimentos sobre a
prevenção da corrupção.
O Tribunal de Contas foi consultado tendo as suas sugestões sido acolhidas na sua grande
maioria.
O disposto no presente decreto -lei em nada prejudica — em qualquer circunstância as
competências do Tribunal de Contas, em particular, e, em geral, as competências previstas na lei
para os tribunais e para o Ministério Público.
Foram ouvidos o Tribunal de Contas, a Associação Nacional de Freguesias, a Associação
Nacional de Municípios Portugueses, a Comissão de Coordenação das Políticas de Prevenção e
Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo, a Comissão Nacional
de Proteção de Dados, a Confederação Empresarial de Portugal, o Conselho Nacional de Supervi-
sores Financeiros, o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público,
o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, a Ordem dos Advogados e os órgãos
de governo próprio das regiões autónomas.
Foi promovida a audição da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o se-
guinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto -lei:
a) Cria o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), entidade administrativa independente,
com personalidade jurídica de direito público e poderes de autoridade, dotada de autonomia admi-
nistrativa e financeira, que desenvolve atividade de âmbito nacional no domínio da prevenção da
corrupção e infrações conexas;

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