Decreto-Lei n.º 188/2009, de 12 de Agosto de 2009

Decreto-Lei n. 188/2009

de 12 de Agosto

Em Portugal as doenças cardiovasculares constituem um dos problemas de saúde mais graves para a populaçáo, representando a principal causa de morte. A maioria das mortes evitáveis associa -se à doença coronária e ocorre fora dos hospitais. A evidência empírica permite afirmar que, em mais de metade dos casos de paragem cardio-respiratória, as vítimas náo chegam com vida aos hospitais. Por outro lado, a maior parte dos episódios de morte súbita cardíaca resulta da ocorrência de arritmias malignas, nomeadamente de fibrilhaçáo ventricular.

O único tratamento eficaz na paragem cardíaca devida a fibrilhaçáo ventricular é a desfibrilhaçáo eléctrica, demonstrando a experiência internacional que a utilizaçáo de desfibrilhadores automáticos externos em ambiente extra -hospitalar por pessoal náo médico aumenta significativamente a probabilidade de sobrevivência das vítimas.

Registe -se, no entanto, que essa experiência positiva está sempre associada à utilizaçáo de desfibrilhadores automáticos externos em locais públicos de elevada frequência, onde a paragem cardio -respiratória pode ser testemunhada e onde os diferentes elementos da cadeia de sobrevivência podem ser activados, a começar pela chamada dos meios de emergência. A desfibrilhaçáo automática externa (DAE) deve ser sempre considerada como complemento dessa cadeia de sobrevivência e náo em sua substituiçáo.

O presente decreto -lei visa regular, pela primeira vez na ordem jurídica portuguesa, a utilizaçáo de desfibrilhadores automáticos externos por náo médicos em ambiente extra -hospitalar, no âmbito, quer do Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM), quer de programas de acesso público à desfibrilhaçáo.

Pretende -se desta forma facultar o acesso generalizado a meios de socorro adequados às necessidades de um significativo número de vítimas, visando assim uma diminuiçáo das mortes evitáveis por eventos cardiovasculares. Para a melhor concretizaçáo deste propósito seráo ainda reforçadas iniciativas complementares já em curso visando a melhoria da cadeia de sobrevivência, designadamente, o investimento na formaçáo em suporte básico de vida (SBV) e o incremento da quali-dade organizacional e operacional dos meios de socorro, adequando -os à diversidade das realidades geográficas do todo o território nacional.

A disciplina normativa que agora se introduz assenta na ideia, actualmente consensual na comunidade médica nacional, de que o acto de desfibrilhaçáo, ainda que realizado através de desfibrilhadores automáticos, só pode ser realizado por náo médicos por delegaçáo de um médico e sob a sua supervisáo.

De facto, os equipamentos de DAE, apesar de muito seguros, náo sáo imunes ao erro humano e carecem de integraçáo em processos organizativos adequados e sob supervisáo permanente, para que os seus benefícios possam ter verdadeira expressáo.

Ao contrário do que acontece noutros países, nos quais existe uma verdadeira cultura de emergência médica enraizada na sociedade, em Portugal ainda náo estáo reunidos os pressupostos para a adopçáo de um sistema que permita a utilizaçáo relativamente livre de desfibrilhadores automáticos externos pela populaçáo em geral. Atendendo a que, por um lado, a nossa cultura de emergência médica é incipiente e o desconhecimento das técnicas de suporte básico de vida é generalizado na populaçáo e, por outro, os riscos da má utilizaçáo de equipamentos de DAE aumentam na proporçáo do desconhecimento do utilizador, julgou -se mais adequado começar pela implementaçáo de um sistema de super-visáo. Assim, o sistema agora criado integra a DAE em ambiente extra -hospitalar num contexto organizativo estruturado e com rigoroso controlo médico, com o objectivo de minimizar, tanto quanto possível, os riscos de utilizaçáo indesejável dos equipamentos.

Neste sistema, o papel central na regulaçáo da actividade de DAE em ambiente extra -hospitalar cabe ao Instituto Nacional de Emergência Médica, I. P. (INEM, I. P.), na qualidade de entidade responsável pela definiçáo, organizaçáo, coordenaçáo e avaliaçáo das actividades de emergência médica, nomeadamente no que diz respeito ao sistema de socorro pré -hospitalar, que lhe é atribuída pelo Decreto -Lei n. 220/2007, de 29 de Maio, que aprova a respectiva orgânica.

Ao INEM, I. P., compete, nomeadamente, licenciar a utilizaçáo de desfibrilhadores automáticos externos, quer no âmbito do SIEM, quer em locais de acesso público, bem como monitorizar e fiscalizar o exercício da DAE, com o objectivo de garantir que, em condiçóes normais, cada acto de DAE é realizado por um operador treinado e certificado, actuando por delegaçáo médica, com recurso a equipamento em adequadas condiçóes de

5248 funcionamento e correctamente integrado na cadeia de sobrevivência.

Num claro incentivo à rápida difusáo da DAE em ambiente extra -hospitalar, os custos do funcionamento do sistema sáo, em grande parte, assumidos pelo Estado e pelo próprio INEM, I. P., uma vez que os procedimentos previstos no presente decreto -lei náo ficam sujeitos a taxas.

No mesmo sentido, o INEM, I. P., é incumbido da aprovaçáo de um Programa Nacional de Desfibrilhaçáo Automática Externa, que serve de base à expansáo de uma rede de DAE à escala nacional e que se espera possa vir a contribuir para a elevaçáo da cultura nacional de emergência médica.

O presente decreto -lei foi antecedido de uma participada discussáo pública, no qual se pronunciaram as mais importantes entidades públicas e privadas do sector da saúde, com destaque para a Ordem dos Médicos, a Coordenaçáo Nacional para as Doenças Cardiovasculares, o Conselho Português de Ressuscitaçáo, o INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P., a Fundaçáo Portuguesa de Cardiologia, a Associaçáo Portuguesa de Cardiopneumologistas e a Associaçáo Portuguesa de Medicina de Emergência, bem como um número muito significativo de entidades privadas de fim solidário e de cidadáos.

Foram ouvidos os órgáos de governo próprio das Regióes Autónomas.

Assim:

Nos termos da alínea a) do n. 1 do artigo 198. da Constituiçáo, o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposiçóes gerais

Artigo 1.

Objecto

O presente decreto -lei estabelece as regras a que se encontra sujeita a prática de actos de desfibrilhaçáo automática externa (DAE) por náo médicos, bem como a instalaçáo e utilizaçáo de desfibrilhadores automáticos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT