Acórdão nº 9738/22.0T8LSB.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-10-25

Ano2023
Número Acordão9738/22.0T8LSB.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


П


1. Relatório
1.1. AA e BB intentaram a presente acção declarativa com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra TAP – Transportes Aéreos Portugueses, pedindo:
i. Seja considerada nula a aposição do termo certo nos mencionados contratos de trabalho;
ii. Sejam considerados os mencionados contratos de trabalho como tratando-se de contratos de trabalho sem termo;
iii. Seja decretada sem qualquer validade a declaração de caducidade remetida aos autores pela ré e, por conseguinte
iv. Sejam declarados ilícitos os despedimentos das autoras por não terem sido precedidos de processo disciplinar, nem integrarem qualquer uma das formas lícitas de resolução do contrato de trabalho.
Assim como se pretende obter declaração judicial que consigne a condenação da ré:
a) a reintegrar AA e BB nos respectivos postos de trabalho com efeitos à data em que se operou o despedimento considerado ilícito,
b) a fazer aplicar a cada uma das autoras as progressões de carreira e correspondentes aumentos salariais decorrentes da lei e do instrumento de regulamentação colectiva em vigor;
c) a pagar-lhes o valor de todas as remunerações ajudas de custo complementares e diferenças salariais e abonos complementares que lhes sejam devidas desde a acima referida data até à efectiva integração dos autores, tudo acrescido dos correspondentes juros de mora entretanto vencidos e,
d) a pagar às autoras uma indemnização, cujo valor deve ser fixado pelo Tribunal, por danos não patrimoniais sofridos pelos primeiros, que foram alegados e que tenham sido consequência do despedimento ilícito praticado pela ré, por considerarem-se provados e merecedores da tutela jurídica.
Alegaram para tanto, e em síntese: que cada uma das AA. iniciou a sua carreira na TAP exercendo funções como CAB /comissário/assistente de bordo, com contratos de trabalho a termo certo pelo prazo de doze meses que foram sendo renovados; que são nulos os termos apostos aos contratos de trabalho, uma vez que não concretizam o motivo justificativo para a contratação a termo, não indicando quais as novas rotas que originam a actividade excepcional da empresa e não mencionando factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado; que ré comunicou a cada uma das autoras a caducidade dos respectivos contratos, consubstanciando esta declaração um despedimento ilícito uma vez que o contrato de trabalho é sem termo e que, também por este motivo, a ré lhes deve reconhecer a categoria profissional de CAB I desde o início do contrato de trabalho, como resulta do instrumento de regulamentação colectiva. Alegaram ainda que deve considerar-se parte integrante do seu vencimento a denominada “garantia mínima”.
Realizada a audiência de partes, a R. apresentou contestação na qual alegou, em suma: que a petição inicial devia ter sido rejeitada por não indicar o valor da acção e a taxa de justiça ter sido paga em valor inferior ao devido; que os direitos das AA. prescreveram em 5 de Abril de 2022, na véspera da notificação judicial avulsa da R.; que as AA. receberam a compensação pela caducidade dos contratos de trabalho, pelo que se presume terem aceite o despedimento nos termos dos artigos 344.º e 366.º do Código do Trabalho; que se verifica a ineptidão da petição inicial quanto ao pedido de pagamento do valor de “todas as remunerações ajudas de custo complementares e diferenças salariais e abonos complementares que lhes sejam devidas desde a acima referida data até à efectiva integração” por falta de alegação de factos e por indeterminação dos pedidos e que se verifica a excepção inominada de não liquidação efectiva dos pedidos quanto a salários, férias, subsídios e ajudas de custo complementares. Alegou ainda que a justificação dos termos apostos nos contratos satisfaz as exigências legais e não é possível concretizá-la mais detalhadamente, bem como que não decorre do regime do AE aplicável que os trabalhadores contratados a termo ingressam directamente na categoria profissional CAB I quando passem a trabalhadores por tempo indeterminado, havendo mais requisitos a observar, e que a denominada “garantia mínima” não constitui retribuição, mas tem natureza sancionatória para o empregador quando viole a regra do planeamento equitativo.
As AA. responderam à contestação nos termos de fls. 46 e ss., defendendo a improcedência da matéria de excepção.
Findos os articulados, e uma vez ouvidas as partes sobre a possibilidade de emitir de imediato decisão, foi proferido despacho saneador-sentença que começou por julgar “parcialmente inepta a petição inicial quanto aos pedidos de reconhecimento de categoria e tudo o que é peticionado nas alíneas b) e c) (quanto a este último com a salvaguarda das retribuições vencidas e vincendas)”, absolvendo a R. da instância relativamente a estes pedidos. Após, assentando a matéria de facto pertinente e julgando de direito, terminou com o seguinte dispositivo:
«Nos termos e fundamentos expostos e atentas as disposições legais citadas, julgo a acção parcialmente procedente, e, em consequência, decido:
1– Declarar nulo o termo aposto nos contratos celebrados por cada uma das autoras - AA e BB - e a ré devendo os contratos serem considerados como contratos de trabalho por tempo indeterminado.
2- Condeno a ré Transportes Aéreos Portugueses, S.A. a reintegrar cada uma das autoras – AA e BB - sem prejuízo da sua antiguidade e categoria.
3- Condeno a ré Transportes Aéreos Portugueses , S.A. a pagar a cada uma das autoras – AA e BB, o valor das retribuições que deixaram de auferir desde trinta dias antes da propositura da acção – 14.04.2022 - até ao trânsito em julgado da presente sentença, e descontada compensação paga pela caducidade e os valores que tenham eventualmente recebido de subsídio de desemprego e em virtude da cessação do contrato (390º, 2, c) CT)
4- Custas da acção a cargo das autoras e ré na proporção de 40% e 60% respectivamente (artigo 527º Código Processo Civil).
Notifique.
Registe.»
1.2. A R., inconformada interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
A. Na contestação que apresentou em juízo, a Recorrente invocou e alegou que as Recorridas receberam a compensação devida pela caducidade dos contratos a termo que celebraram com a Recorrente e não procederam à sua devolução (artigos 35.º e 36.º daquele articulado), tendo, de seguida, alegado e sustentado que esse facto tem como consequência a aplicação da presunção de aceitação da cessação do contrato de trabalho ou, a assim não se entender, a aplicação do instituto do abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
B. A não devolução, por parte das Recorridas, das compensações, consubstancia uma questão essencial e relevante para a decisão do mérito da causa, em relação à qual o Tribunal a quo teria que se pronunciar e não se pronunciou, o que, nos termos do disposto naalíneaa),don.º1 doartigo615.ºdoC.P.C.,geraanulidadedasentença, nulidade esta que, desde já, se argui.
C. Por se tratar de facto oportunamente alegado (artigo 36.º da contestação), devidamente provado nos autos, por confissão das Recorridas (artigos 10.º e 11.º da p.i.) e com relevância para a decisão a tomar, deve ser aditado o seguinte facto à matéria defactodada como provada: As Recorridas não devolveram à Recorrente as compensações recebidas. (facto provado n.º 9).
D. Decorre do facto provado n.º 4 que os contratos de trabalho celebrados entre as partes cessaram no dia 17.03.2021, pelo que o prazo substantivo de 1 (um) ano (n.º 1 do artigo 337.º do CT), salvo alguma interrupção ou suspensão, terminaria às 24h00 do dia 17.03.2022.
E. Contudo, por decorrência da legislação especial motivada pela Pandemia COVID-19, os prazos de prescrição e caducidade estiveram suspensos entre, inclusive, 22.01.2021 e 05.04.2021.
F. Cessada a suspensão, os prazos de prescrição e caducidade passaram a ser calculados como se a suspensão não tivesse ocorrido, acrescentando-se uma dilação ao prazo final correspondente ao período de suspensão ocorrido, o que no caso se traduz numa suspensão de 19 (dezanove) dias.
G. Assim, atenta adata dacessação doscontratosde trabalho em causa nos presentes autos – 17.03.2021 -, os eventuais direitos das AA., a existirem, apenas poderiam ter sido exercidos até ao dia 05.04.2022, o que não aconteceu, uma vez que a Recorrente apenas foi notificada da eventual interrupção da prescrição, através de notificação judicial avulsa, no dia 06.04.2022 (facto provado n.º 7), quando a prescrição já se havia consumado e os alegados direitos de impugnação e de créditos laborais invocados pelas Recorridas já estavam prescritos.
H. Tendo em conta que a prescrição configura uma excepção peremptória que nos termos do n.º 3 do artigo 576.º do C.P.C. determina a absolvição de todos os pedidos,deveriao Tribunala quoter absolvidoa Recorrente dos pedidos formulados pelas Recorridas, conforme invocado pela Recorrente na sua contestação.
I. Por assim não ter entendido, a sentençarecorridaviolou o disposto no n.º 1 do artigo 337.º do CT e o n.º 3 do artigo 576.º do C.P.C..
J. De acordo com o regime previsto no artigo 366.º do CT, para o qual o artigo 344.º do CT remete, presume-se que o trabalhador aceita a caducidade do contrato quando recebe do empregador a compensação prevista na lei, competindo ao trabalhador que pretende ilidir a presunção proceder à devolução da compensação que lhe tiver sido paga.
K. As Recorridas não devolveram a compensação que lhes foi paga.
L. Conclui-se, assim, que as Recorridas, ao não procederem à devolução das compensações que lhes foram pagas pela Recorrente, aceitaram a cessação dos contratos de trabalho que as uniam à Recorrente e, consequentemente, ficaram impedidas de impugnar, judicialmente, essa mesma
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