Acórdão nº 967/21.5T8AVR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 29-01-2024

Data de Julgamento29 Janeiro 2024
Número Acordão967/21.5T8AVR.P1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo: 967/21.5T8AVR.P1
Juízo do Trabalho de Aveiro - Juiz 1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

AA, viúva, nascida em ../../1965, beneficiária da Segurança Social com o n.º ..., residente na Rua ..., ... Aveiro, com o patrocínio oficioso do Ministério Público, instaurou contra:
A... – Companhia de Seguros ..., S.A., com sede na Rua ..., ..., 3º dt, 1070-040 Lisboa, e
B..., Ld.ª, com sede na Travessa ..., ..., ... Aveiro, a presente acção declarativa com processo especial, emergente de acidente de trabalho, pedindo:
I - Que se reconheça à A. a qualidade de única beneficiária legal do sinistrado;
II - Que se declare que o acidente de trabalho se deveu a violação de normas de segurança no trabalho por parte da R. Empregadora;
III - Que, em consequência, seja a R. Empregadora condenada a pagar-lhe:
a) A pensão anual e vitalícia de € 11.577,80, com início no dia 20 de Março de 2021, agravada por força da actuação culposa - cabendo à R. Seguradora o pagamento da pensão (normal) de € 3.473,34, até perfazer a idade da reforma, e de € 4.631,12, a partir daí, sem prejuízo do direito de regresso sobre a R. Empregadora;
b) € 35.000,00, a título de indemnização/compensação por prejuízos não patrimoniais;
c) Juros de mora, à taxa legal, sobre todas as prestações.
IV - Que seja condenada a R. Seguradora a pagar-lhe, sem prejuízo do direito de regresso sobre a R. Empregadora:
a) O subsídio por morte, no montante de € 5.792,29, acrescido dos juros de mora legais;
b) O subsídio de despesas de funeral, no valor de € 1.930,76;
c) € 120,00, a título de título de reembolso pelas despesas que suportou com consultas de psicologia;
d) € 10,00, a título de despesas com as deslocações ao Tribunal; e) Juros de mora, à taxa legal, sobre todas as prestações.
V - Subsidiariamente, caso não resulte provada a responsabilidade agravada da R. Empregadora, que seja a R. Seguradora condenada a pagar à A.:
a) A pensão anual, obrigatoriamente remível, de € 3.473,34, até perfazer a idade da reforma; e a pensão anual de € 4.631,12, após a idade da reforma;
b) O subsídio por morte, no montante de € 5.792,29, acrescido dos juros de mora legais;
c) O subsídio de despesas de funeral, no valor de € 1.930,76;
d) € 120,00, a título de título de reembolso pelas despesas que suportou com as consultas de psicologia;
e) € 10,00, a título de despesas com as deslocações ao Tribunal; f) Juros de mora, à taxa legal, sobre todas as prestações.
A fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese:
É viúva do sinistrado BB que, no dia 19 de Março de 2021, em ..., Aveiro, foi vítima de um acidente de trabalho mortal, quando trabalhava como Pedreiro, sob as ordens, direcção, fiscalização da R. Empregadora, numa obra de recuperação, remodelação e alteração de uma moradia.
O acidente ficou a dever-se à violação de regras de segurança no trabalho por parte da R. Empregadora que não diligenciou pela avaliação de riscos para a específica actividade de remoção/demolição de telhados que o sinistrado executava, não lhe proporcionou formação específica adequada para a levar a cabo, não implementou na obra as medidas de segurança adequadas e necessárias, como a colocação de escoras e não forneceu ao sinistrado os meios de protecção necessários para prevenir as quedas em altura.
À data do acidente, o sinistrado auferia a remuneração anual ilíquida de € 11.577,80, com base na qual se encontrava transferida para a R. Seguradora a responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho.
Na sequência do acidente sofrido pelo sinistrado e da morte deste, sofreu danos de natureza não patrimonial e necessitou de acompanhamento psicológico, tendo comparecido a três consultas de psicologia, pelas quais despendeu a quantia global de € 120,00.
Pagou € 2.086,00, pelo funeral do sinistrado e despendeu em deslocações obrigatórias ao tribunal, na fase conciliatória dos autos, a quantia de € 10,00.
Requerendo a fixação de pensão provisória a cargo do Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT), nos termos do disposto no artigo 122.º do Código de Processo do Trabalho.
Efectuada a citação, ambas as RR contestaram.
A R. Seguradora alegou, no essencial, que:
O acidente resultou exclusivamente da falta de cuidado, grave e indesculpável, do sinistrado, uma vez que, com negligência grosseira, desrespeitando as indicações que lhe foram dadas e sem qualquer justificação, caminhou directamente sobre uma parede, altamente instável, insegura e com evidente risco de queda, tendo perfeito conhecimento dos perigos daí decorrentes e de que a sua actuação era proibida. Parede essa que colapsou, provocando-lhe a queda de uma altura aproximada de 3 metros, causando-lhe a morte.
O acidente mostra-se descaracterizado, nos termos do n.º 1 do artigo 14.º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro.
Caso assim não se entenda, sempre se dirá que o acidente ficou a dever-se à violação de regras de segurança e saúde no trabalho por parte da R. Entidade Empregadora, que não diligenciou pela avaliação de riscos específica para a actividade de remoção/demolição de telhados, não proporcionou ao sinistrado a formação específica adequada para a realização dessa actividade, não implementou na obra as medidas de segurança adequadas e necessárias, como a colocação e escoras, e não forneceu ao sinistrado os meios de protecção necessários para prevenir as quedas em altura.
Concluindo que a acção deve ser julgada improcedente, no que a si respeita.
E caso assim não se entenda, que deve ser condenada a R. Empregadora, nos termos do art. 18º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009 de 4 de Setembro, sendo a R. Seguradora condenada nos termos do disposto no art. 79º, n.º 3 da mesma lei, com direito de regresso.
A R. Empregadora aduzindo, em suma, que:
Empregou todas as providências necessárias a prevenir o risco de acidentes e o PSS que elaborou e que o sinistrado conhecia, cumpre todos os requisitos legais.
Disponibilizou aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos, equipamentos de protecção individual.
O sinistrado teve culpa grave na decisão de reiniciar os trabalhos nas concretas circunstâncias em que o fez, porque estava física e psicologicamente mal, cansado e com dor de dentes.
O sinistrado disse ao colega para se afastar, porque a empena do telhado poderia cair, o que significa que avaliou o risco em que se colocou a si próprio, mas apesar disso, permaneceu no local até à queda da parede.
Os barrotes já estavam todos cortados, pelo que o sinistrado não tinha necessidade nem devia ter subido à parede, mas sim iniciar a segunda tarefa que lhe tinha sido solicitada (destelhar a divisão contigua).
O sinistrado teve consulta de saúde agendada na empresa, a que não compareceu, o mesmo sucedendo às acções de formação a que era chamado.
Quanto à indemnização por danos não patrimoniais, mesmo que o acidente fosse imputável a omissão da R. Empregadora, deve ser reduzida por equidade, na medida em que a vítima contribuiu significativamente para o resultado.
Além disso, deve sempre abater-se o que a A. recebeu de subsídio de funeral, pago pela Segurança Social.
Concluiu, sustentando que a acção deve ser julgada improcedente, considerando-se o acidente descaracterizado, com a consequente absolvição do pedido.

A R. Empregadora respondeu à contestação da R. Seguradora, impugnando o alegado por esta, para fundamentar a existência de responsabilidade agravada da empregadora na produção do sinistro.

Foi deferida pensão provisória à A. no valor anual de € 3.473,34, a adiantar pelo FAT, até ao momento da fixação da pensão definitiva e da definição da responsabilidade pela reparação.
Foi proferido despacho saneador, onde se reconheceu a regularidade da instância, fixando-se os factos assentes, o objecto do litígio e os temas da prova.
Realizou-se audiência final, com observância do formalismo legal, no termo da qual foi proferida sentença com o seguinte
Dispositivo
Em face de todo o exposto e na parcial procedência da acção, decide-se:
I. Condenar a R. Seguradora a pagar à A.:
a) O capital de remição da pensão anual de € 3.473,34 (três mil, quatrocentos e setenta e três euros e trinta e quatro cêntimos), com efeitos desde 20/03/2021 - deduzido, porém, do que a A. já recebeu do FAT a título de pensão provisória.
b) € 5.792,29 (cinco mil, setecentos e noventa e dois euros e vinte e nove cêntimos), a título de subsídio por morte.
c) € 769,57 (setecentos e sessenta e nove euros e cinquenta e sete cêntimos), a título de subsídio por despesas de funeral.
d) € 120,00 (cento e vinte euros), de reembolso por despesas suportadas com consultas de psicologia.
e) € 10,00 (dez euros), de reembolso de despesas com deslocações ao Tribunal.
f) Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%), até integral pagamento, contados desde 20/03/2021, no que se refere às prestações referidas nas als. a) e b); e desde a citação da R. Seguradora, no que concerne às mencionadas nas als. c), d) e e).
II. No mais, absolver a R. Seguradora dos pedidos formulados pela A..
III. Absolver do pedido a R. Empregadora.
IV. Condenar a R. Seguradora a reembolsar o FAT da quantia por este paga à A. a título de pensão provisória.
Custas a cargo da A. e da R. Seguradora, na proporção dos respectivos decaimentos (art.º 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil) sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia a A..
Valor da acção: € 54.430,85 – art. 120º do Cód. de Processo de Trabalho.
Registe e notifique.”

Inconformada com a decisão, a R. Seguradora apresentou o presente recurso, finalizando a sua alegação com as conclusões que se transcrevem:

“1.ª - Vem o presente recurso impugnar a decisão proferida que, apurando a responsabilidade da seguradora, julgou parcialmente procedente a ação, condenando a seguradora nas quantias referidas na sentença, assim como a consideração do montante transferido.

2.ª - Provou-se que no dia do acidente, de manhã, o
...

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