Acórdão nº 833/10.0TBBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-06-15

Ano2023
Número Acordão833/10.0TBBJA.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Processo n.º 833/10.0TBBJA.E1
Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo Local ... – J...
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Acordam na secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente execução proposta por “(…), SARL” contra AA, a pretérita encarregada de venda (“A..., SA”) veio interpor recurso da decisão que não lhe fixou honorários.
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“(…) Portugal, SA” foi habilitada como credora cessionária.
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A Exequente pediu o pagamento do capital em dívida e os juros de vencidos e vincendos, calculados à taxa de 16% acrescida da sobretaxa de mora de 4% e respectivo imposto de selo, até integral pagamento ao exequente, no montante global de € 25.037,88.
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Foi penhorado o prédio urbano, sito na Rua ..., na Freguesia ..., Concelho ..., descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...72 da referida Freguesia, e inscrito na matriz sob o artigo ...66, estando indicado no auto o valor de € 24.163,38.
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Na decisão de venda ficou exarado que seriam aceites propostas iguais ou superiores a 70% do valor de € 61.568,17. *
Foi realizada a entrega do bem imóvel com arrombamento e mudança da fechadura.
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Procedeu-se à substituição do agente de execução que inicialmente havia sido indicado.
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Após ter falhado a venda mediante propostas em carta fechada, em 08/08/2018, a nova Agente de Execução alterou a modalidade de venda para leilão electrónico.
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Terminado o leilão eletrónico sem terem sido apresentadas propostas para aquisição do bem de valor superior ao mínimo publicitado, foi determinada a venda mediante negociação particular, nos termos do artigo 832º, alínea f), do Código de Processo Civil.
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Em 28/09/2018, a executada disse que se oponha à adjudicação do imóvel pelo valor da proposta angariada pela encarregada de venda, no valor de € 15.000,00.
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Em 20/05/2021, a encarregada de venda “A..., SA” foi destituída de funções pela Agente de Execução.
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Aquela decisão da agente de execução foi justificada com o «(…) incumprimento de funções, atendendo a falta de diligência na obtenção de propostas e morosidade.
Sendo de prévio conhecimento o valor mínimo aceitável para a realização de venda do imóvel penhorado, não é razoável, salvo melhor entendimento, considerar que a apresentação de propostas com valores que requerem a intervenção do Douto Tribunal para aceitação das mesmas, ou de valores completamente fora dos parâmetros estabelecidos, seja considerado, que as funções exercidas por V. Exa., estejam a ser cumpridas com zelo e perseverança.
Não cabe, no âmbito da venda judicial ou em qualquer outra modalidade, a inércia demonstrada».
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A Encarregada de Venda “A..., SA” apresentou nota de honorários e despesas no valor total de € 5.845,58, sendo:
a) Serviço técnico, administrativo, jurídico e de consultor – € 760,00 (em conformidade com os artigos 529.º, n.ºs 1 e 3, 532.º, n.º 2 e para efeitos do artigo 533.º, n.ºs 2, alínea b) e 3, todos do Código de Processo Civil).
b) Deslocações – € 3.232,00 (de acordo com o artigo 17.º, n.º 6, do Regulamento de Custas Processuais)[1].
c) Cópias – € 10,50 (em conformidade com o artigo 17.º/2, 3, a) e b) e 4, do Regulamento de Custas Processuais).
d) 5% sobre o valor da proposta apresentada, ou seja 5% sobre € 15.000,00, o que resulta num valor de € 750,00.
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Notificadas as partes para se pronunciarem, nada foi dito.
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A “A..., SA” prestou esclarecimentos adicionais sobre a nota de honorários apresentada.
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Na parte que interessa para a impugnação recursal, a decisão tem o seguinte conteúdo:
«Não tendo havido qualquer venda/adjudicação, inexiste fundamento legal para a remuneração das encarregadas de venda em função da sua concretização, no que respeita aos honorários correlacionados (artigo 17.º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais, com idêntica redacção ao artigo 34.º, n.º 1, alínea e), a contrario, do Código das Custas Judiciais).
Por outro lado, inexiste qualquer fundamento legal para o pagamento da verba imputada a “Serviço técnico, administrativo, jurídico e de consultor” – alínea a) da nota de honorários.
Resulta dos relatórios juntos que a encarregada de venda exerceu funções durante cerca de três anos e nesse período realizou diversas diligências, o que necessariamente implicou a sua prévia promoção e divulgação.
(…)
E, no caso em apreço, a venda não se concretizou, pelo que não é devida qualquer remuneração em função de proposta apresentada (alínea d) da nota de honorários).
(…) quanto às despesas com deslocações são de excluir aquelas que constam do relatório como realizadas em 25.02.2015 e 27.05.2017, porquanto as mesmas não se revelam credíveis nem se mostram comprovadas.
As demais, tendo em consideração a identificação dos interessados e o que consta dos autos importam a remuneração das respectivas despesas, nos termos tabelares.
Assim, conclui-se que a encarregada de venda será remunerada apenas por 7 deslocações, computando-se os KM em 808/deslocação, a que se aplica o valor de € 0,40, nos termos do disposto no artigo 17.º, n.º 6. do Regulamento das Custas Processuais e tabela IV anexa.
Por outro lado, não é igualmente devido à encarregada de venda, a título de reembolso de despesas com cópias, o montante de € 10,50, porquanto as mesmas não encontram previsão legal, sendo que a alínea b) do artigo 17.º, n.º 3, do Regulamento das Custas Processuais alude a pareceres e relatórios de peritagens.
Atento o exposto:
- autorizo o pagamento das despesas de deslocação no valor total de € 2.262,40 (dois mil e duzentos e sessenta e dois euros e quarenta cêntimos);
- indefiro o pagamento das demais quantias descritas na nota de honorários e despesas.
Notifique».
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Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso e as suas alegações continham as seguintes conclusões, aliás extensas e prolixas na relação de proporcionalidade com o corpo do recurso apresentado e com repetições sucessivas do mesmo argumentário[2] [3] [4] [5] [6]:
«I – O despacho recorrido viola as obrigações contratuais advenientes do contrato celebrado entre os intervenientes processuais/autos e a Encarregada de Venda e as regras afectas à responsabilidade civil contratual. Aliás do próprio artigo 833.º do CPC decorre que “Ao determinar-se a venda por negociação particular, designa-se a pessoa que fica incumbida, como mandatário, de a efectuar”.
II – O despacho recorrido viola o previsto no artigo 833.º do CPC e 17.º/6, do RCJ.
III – A Encarregada de Venda foi devidamente contratada para o exercício das suas funções nos moldes contratualmente previstos e legalmente sustentados.
IV – Foi a … aqui recorrente notificada da sua nomeação enquanto Encarregada de Venda Judicial, para efeitos de promoção de diligência de venda de bem imóvel em acção com o valor de € 25.037,88.
V – Conforme jurisprudência diversa, de que se aduz apenas em exemplo o Acórdão do TRL de 03-12-2009 – “Na venda por negociação, sub-espécie da venda extrajudicial, o encarregado da venda é equiparado ao “mandatário” – artigo 905.º do CPC; A sua actuação pautar-se-á pelas regras do contrato de mandato civil, assim se justificando a sujeição da actuação do encarregado da venda às regras do mandato; No caso particular das vendas em processo executivo, o encarregado da venda actua mandatado pelo tribunal“.
V – Posto isto, o contrato de mandato desde logo nos termos da Lei presume-se oneroso e competindo só ao mandatado. A actividade da Encarregada de Venda é uma actividade de meios e não de resultados, e só assim pode ser compreendida sob pena desta inúmeras vezes se descapitalizar e despender recursos, vendo o objecto do seu trabalho invariavelmente postergado por acordo entre as partes ou até por remição, ou mesmo adjudicação dos próprios credores. Ou seja, quer os autos, o Tribunal, Agente de Execução, credores, etc. … beneficiavam e enriqueciam sem causa no que concerne ao trabalho alocado e recursos desenvolvidos pela Encarregada de Venda.
VI – Pelo que não só é exigível o ressarcimento de despesas havidas em nome e por conta do processo, como lhe são devidos honorários nos termos legais, os quais independentes de qualquer efectiva venda,
VII – A este propósito e a título de exemplo do quanto vem sendo entendimento generalizado da jurisprudência enuncia-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28-03-2019 in DGSI, quando expressa em resposta especifica à questão única a decidir que “consiste em saber se o encarregado da venda tem direito a receber a remuneração devida pela atividade que desenvolveu, apesar de não ter procedida à venda do bem penhorado”.
“A resposta à questão colocada prende-se com a interpretação e aplicação do n.º 1 do artigo 17.º do regulamento das Custas Processuais. O recorrente entende que estando prevista proposta de venda, o recebimento de 5% do valor da venda não é devido à encarregada da venda quando esta não procede a qualquer venda, sob pena de violação do n.º 1 do artigo 17.º do Regulamento das Custas. Em sentido oposto entendeu a decisão recorrida, considerando-se que “apesar de não ter sido concretizada a venda, a encarregada da venda tem direito a receber a remuneração devida pelo labor desenvolvido tendo em vista a venda, não podendo ignorar-se que a mesma deslocou-se ao local, elaborou uma brochura que divulgou na sua plataforma eletrónica e enviou a mesma para a sua carteira de clientes, realizando outras diligências e obtendo um total de 16 propostas”. Ora, é evidente que não podemos deixar de acompanhar a interpretação seguida pelo tribunal a quo. Com efeito, sob a epígrafe “Remunerações fixas”, reza, na parte que aqui importa, os n.ºs 1 e 6 do artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais: 1 – As entidades que intervenham nos processos ou que coadjuvem em quaisquer diligências, salvo os técnicos que assistam os advogados, têm direito às remunerações
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