Acórdão nº 73/20.0PCAMD.L1-3 de Tribunal da Relação de Lisboa, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão73/20.0PCAMD.L1-3
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam em conferência na 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – relatório
1. Por decisão transitada em julgado, foi o arguido EM condenado pela prática, em 10 de Fevereiro de 2020, de um crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143° n.°1 do Código Penal na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multa à taxa diária de €5 (cinco euros) no total de €375 (trezentos e setenta e cinco euros), a que correspondem 50 (cinquenta) dias de prisão subsidiária.
2. Posteriormente, em 20 de Fevereiro de 2023, foi considerado extemporâneo o pedido de pagamento da multa em prestações e a pena de multa imposta foi convertida em dias de prisão subsidiária.
3. Inconformado, veio o condenado interpor o presente recurso, pedindo a revogação de tal despacho e a sua substituição por outro que determine a audição presencial do arguido.
4. O recurso foi admitido.
5. O Mº Pº respondeu ao recurso, pronunciando-se pela sua parcial procedência, pedindo a sua revogação e substituição por outro que determine a notificação ao arguido nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 49.º, n.º 3 do Código Penal.
6. Neste tribunal, o Exº PGA emitiu parecer, remetendo para a resposta do seu Exº Colega de 1ª instância.
II – questão a decidir.
Processamento da conversão de pena de multa em dias de prisão.
III – fundamentação.
1. O despacho ora em apreciação tem o seguinte teor:
Uma vez que o arguido não requereu o pagamento da pena de multa em prestações no prazo de 15 dias após a notificação para o pagamento da mesma, indefere-se o requerido a por extemporâneo, nos termos do artigo 489° do CPP.
*
O arguido foi condenado nestes autos por sentença já transitada em julgado na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de €5.
Até hoje, porém, o arguido não efectuou o pagamento da multa, não obstante ter sido notificado para o fazer.
Como bem afirma o MP, não se descortina possível a cobrança da multa aplicada ao arguido, pelo que tem aplicação o disposto no n° 1 do art.º 49° do Código Penal, convertendo-se a multa não paga em prisão subsidiária pelo tempo correspondente, reduzido a dois terços.
Pelo exposto, determino a conversão da multa aplicada ao arguido em 50 dias de prisão.
Notifique o arguido e o seu defensor.
Após trânsito, passe mandado de detenção, o qual deverá ser cumprido até 17.06.2026, no qual se deve fazer expressa referência ao disposto no art.º 49°, n° 2 do Código Penal, devendo a detenção ser de imediato comunicada a este tribunal.
Nos termos do artigo 491°A do CPP consigna-se que cada período ou fracção em que o arguido esteja detido corresponde a €7,5.
2. O recorrente aduz as seguintes conclusões, em discórdia quanto ao decidido:
1.O Arguido não foi ouvido, nem contactado directa e pessoalmente.
2. Assim, e porque as oportunidades são diferentes em cada ser humano de acordo com a sua experiência de vida, e estado de saúde, deve ser dada a oportunidade ao Arguido de ser trazido a Tribunal para que possa esclarecer o seu alheamento e/ou desinteresse, ou se pelo contrário, existe motivos muito fortes e atendíveis para o sucedido.
3. Não existiu um contacto directo com o Arguido que assegure a compreensão do mesmo para o cumprimento da pena de prisão e o exercício do contraditório do próprio Arguido.
4. Devem ser emitidos mandados de detenção para assegurar e conhecer o seu paradeiro, e a sua audição para efeitos de contraditório. E não a emissão de mandados para assegurar o cumprimento da pena, sem antes conhecer os verdadeiros motivos de não cumprimento dos deveres e regras de conduta impostos.
5. Os princípios do contraditório e da audição prévia devem ser assegurados na decisão que aprecie os pressupostos da revogação da suspensão da execução da pena de prisão, de modo a que o mesmo não constitua surpresa contra o arguido, a quem assiste o direito de impugnar não só os factos iniciais já conhecidos, mas quaisquer outros que surjam e que o tribunal pretenda levar em consideração.
6. Bem como requerer a produção de meios de prova, sob pena de se quebrar a reciprocidade dialéctica entre o Tribunal e o condenado e de se postergar as garantias de defesa deste, na dimensão dos aludidos princípios, acolhidos no art.º 32° da Constituição e art.º 61°, n° 1, b), do CPP.
7.O condenado tem de ser presencialmente ouvido em todos os casos que possa estar em causa a conversão da multa aplicada ao Arguido, mesmo quando essa causa se circunscreve ao condenado infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos, constituindo a sua preterição uma nulidade insanável, prevista no artigo 119.°, al. c) do Código de Processo Penal.
8.A conversão da multa aplicada ao Arguido, nunca é consequência automática da conduta do condenado, representa uma real modificação do conteúdo decisório do despacho, devendo por isso ser posta ao mesmo nível desta no que respeita ao exercício do contraditório no seu grau máximo, que passa pela audição presencial do arguido (a não ser nos casos em que a audição não seja possível por motivo que lhe é imputável).
9. Só dessa forma se efetiva o direito de defesa consagrado no artigo 32.°, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, já que também no caso em concreto, o artigo 56.°, n.º 1, al. b) do Código Penal impõe que se indague se as finalidades que estavam na base da suspensão ficaram irremediavelmente comprometidas pelo cometimento do Arguido.
3. O MºPº apresenta as seguintes conclusões, na sua resposta:
1) Veio o Arguido recorrer do Douto Despacho que procedeu à conversão da multa em que aquele foi condenado em prisão subsidiário, alegando que aquele não foi ouvido, nem contactado directa e pessoalmente.
2) Mais alega que o condenado tem de ser presencialmente ouvido em todos os casos que possa estar em causa a conversão da multa aplicada ao Arguido, mesmo quando essa causa se circunscreve ao condenado infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos, constituindo a sua preterição uma nulidade insanável, prevista no artigo 119.º, al. c) do Código de Processo Penal.
3) Nesta matéria não assiste razão ao arguido.
4) Efectivamente, aquele não solicitou o pagamento a prestações da multa, o cumprimento da pena através da realização de trabalho a favor da comunidade ou invocou a impossibilidade de pagar a multa.
5) Nunca aquele veio invocar quaisquer condições socioeconómicas que o impedissem, sem culpa sua, de proceder ao pagamento da multa, o que podia e deveria ter feito, pois tinha pleno conhecimento da pena de multa por pagar e da conversão que iria ocorrer caso não realizasse o pagamento, sendo certo que de tal tomou conhecimento, e avertido nesse sentido, em sede de audiência de discussão e julgamento, na qual esteve presente, como resulta da Acta ref.ª 137616816, de 18/05/2022.
6) Neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24/11/2020 – Processo n.º 781/17.2S6LSB.L1-5 in www.dgsi.pt que refere que “ Não é necessária a audição presencial do arguido, antes de convertida a multa em prisão subsidiária e quanto à realização de relatório social, nada na lei o impõe e no caso não se justificava quando a arguida esteve presente na audiência de discussão e julgamento e aí foram discutidos os factos relativos às suas condições pessoais, como consta da
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