Acórdão nº 69/20.1GCFIG-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 24-01-2024

Data de Julgamento24 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão69/20.1GCFIG-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (COIMBRA (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE COIMBRA – J2))

Acordam os Juízes da 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. RELATÓRIO

1. No âmbito do processo comum coletivo, com o NUIPC69/20.1GCFIG, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, no Juízo Central Criminal ... (Juiz ...), por despacho datado de 13-09-2023 [referência 92088738] foi decidido rejeitar, por extemporâneo, o pedido de indemnização civil deduzido pelos únicos e universais herdeiros do falecido AA, entre os quais figura BB.

2. Inconformada com a decisão, interpôs recurso a mencionada BB.

Na sequência das respetivas alegações termina apresentando as seguintes conclusões e petitório (transcrição):

«I - No dia 11.04.2023 por carta registada foi a BB notificada na qualidade de parente próxima do falecido AA, de que foi deduzida acusação no inquérito, podendo deduzir o pedido de indemnização civil até 20 dias depois de ao arguido ser notificado o despacho de acusação – art. 77º n.º3 do CPP.

II - A presente notificação à BB considera-se efetuada no 5º dia posterior ao seu depósito na caixa de correio do destinatário, constante do sobrescrito (notificação por via postal simples com prova do depósito).

III - Sabe-se que a notificação da acusação foi depositada na caixa do correio do arguido no dia 11 de abril de 2023.

IV - O dia 08.05.2023 é o último dia do prazo para a recorrente deduzir o pedido de indemnização

civil.

V - No dia 08.05.2023 a recorrente apresentou junto dos Serviços da Segurança Social pedido de proteção jurídica na modalidade de dispensa de taxa de justiça, demais encargos com o processo e nomeação de patrono e juntou aos autos de processo requerimento e comprovativo do pedido de apoio judiciário.

VI - Nos termos do n.º4 do art. 24º da Lei n.º34/2004 de 29 de Julho, quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso INTERROMPE-SE com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento

administrativo.

VII - À evidência se verifica, que o prazo interrompeu-se no dia 08.05.2023 e segundo a alínea a) do n.º5 daquele artigo 24º da Lei n.º34/2004 de 29 de Julho o prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação.

VIII - Em 14.06.2023 a Ordem dos Advogados notificou eletronicamente via email o Sr. Dr. CC da sua nomeação como Patrono da requerente BB;

Por ofício do ISS ... datado de 14.06.2023 foi a aqui apelante BB notificada da concessão do apoio judiciário.

Atendendo à data da notificação supra e da decisão do deferimento do apoio judiciário que a apelante rececionou datada de 14.06.2023 deu-se início a contagem do prazo de 20 dias que havia sido interrompido.

XIX - Ora, contando 20 dias, prazo de que dispunha a apelante para apresentar o pedido de indemnização nos termos do art. 77º n.os 2 e 3 do CPP, com início naquele dia 14.06.2023 o prazo terminou em 04.07.2023. E com o período de três dias úteis para a prática de ato fora do prazo do art. 139º do CPC terminou em 07.07.2023.

X - O pedido cível foi apresentado em 03.07.2023, ou seja, no penúltimo dia do prazo para o efeito. À evidência se prova, que o pedido de indemnização civil é tempestivo.

XI - Considerou o Meritíssimo Juiz a quo no seu despacho que “..o prazo para dedução do pedido de indemnização deve ser contado a partir da notificação do despacho de acusação.” E que o dia 08.05.2023 era o último dia do prazo, sendo que, depois ocorreu a interrupção do prazo com a apresentação do requerimento de proteção jurídica no próprio dia 08.05.2023.”

XII - É doutamente e jurisprudencialmente unanime que a interrupção do prazo em curso resultante de comprovação nos autos de apresentação de pedido de apoio judiciário nos termos em que o foi, resulta na interrupção imediata do prazo em curso, começando a correr de início após a notificação da nomeação ao patrono nomeado.

XIII - O Exmo. Advogado Dr. CC foi nomeado patrono à requerente BB, por via eletrónica no dia 14.06.2023.

Uma vez que o mandatário nomeado foi notificado eletronicamente, é aplicável ao recorrente o disposto no artigo 248º n.º1 do Código de Processo Civil, ex vi ao artigo 4º do Código de Processo Penal, pelo que se presume a notificação feita no terceiro dia posterior ao seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. Vide Ac. STJ de 24.06.2020 – proc. 8/19.2TRGMR.S1

XIV - Assim sendo, o Patrono Nomeado presume-se notificado em 17.06.2023, sábado, dia não útil, transferindo-se o prazo para o dia útil seguinte, considerando-se legalmente notificado no dia 19.06.2023, pelo que o prazo de 20 dias, para a dedução do pedido de indemnização civil, terminou no dia 10.07.2023 e com os três dias úteis de multa, terminaria em 13.07.2023

XV - Nesse sentido, veja-se a posição do TRG no acórdão datado de 30/11/2016, que refere que “Para determinar o início do prazo da contestação, a nomeação do patrono feita por email do Conselho Regional da Ordem dos Advogados, presume-se efetuada no 3º dia posterior, aplicando-se analogicamente o art. 248º do CPC (não se considerando efetuada na data vertida no email em causa).”

XVI - A razão de ser do preceito visa garantir a tramitação processual da acção judicial a prazo certos e definidos e ainda, a garantia de acesso ao direito, por parte daquele que se encontrando numa situação de insuficiência económica carece de nomeação de patrono para promover a sua defesa na acção - artigos 20.º e 13º da Constituição da República Portuguesa.

XVII - Quer a contagem se inicie no próprio dia da notificação do Patrono Nomeado quer se inicie nos termos do artigo 248º do CPC, certo é, que tendo o pedido de indemnização sido apresentado no dia 03.07.2023 é manifestamente tempestivo.

XVIII - De harmonia com o disposto no artº 326º, nº 1, do Código Civil, a interrupção inutiliza todo o tempo do prazo em curso decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, ou seja, a partir da notificação ao patrono da sua designação.

XIX - O despacho de que se recorre é nulo quando refere relativamente ao dia 08.05.2023: “Aquele dia correspondia ao último dia do prazo para deduzir o pedido de indemnização civil. Uma vez que o patrono nomeado bem como BB foram notificados da concessão de apoio judiciário através de carta enviada a 23.06.2023 e o pedido de indemnização foi apresentado a 03 de Julho de 2023, nesta data já havia decorrido todo o prazo de vinte dias para deduzir o pedido de indemnização civil.”

XX - Se o Meritíssimo Juiz a quo considera que tanto o Patrono Nomeado como a BB foram notificados no dia 23.06.2023 então contando os 20 dias após essa notificação teriam até dia 13/07/2023 para deduzir o pedido de indemnização.

XXI - Com o devido e usual respeito, cremos que o Meritíssimo Juiz a quo, confundiu os efeitos da interrupção do prazo, com os efeitos da suspensão do prazo e consequentemente proferiu decisão errónea e prejudicial à apelante, que apresentou o seu pedido de indemnização civil dentro do prazo que dispunha, sendo o mesmo tempestivo.

XXII - O despacho recorrido é manifestamente ilegal e nulo, é contrário ao direito ao acesso à Justiça (Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional Efectiva), previsto na Convenção Europeia dos Direitos do Homem na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e no Artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.

XXIII - O douto despacho recorrido violou, por incorrecta interpretação, as normas constantes dos artigos e 326.º do Código Civil, artigos 24.º, n.ºs 4 e 5 e 31º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho e artigos 138.º, 142.º, 242.º, n.º 2 e 248.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

XXIV – Pelas razões expostas, deve o despacho proferido em 13.09.2023 ser revogado e substituído por outro, que admita a pedido de indemnização civil deduzido e apresentado no dia 03.07.2023 pela recorrente BB, por legal e tempestivo, com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA!»

3. Ao recurso interposto, respondeu o Ministério Público pela seguinte forma (transcrição):

«Ora, entendemos que assiste inteira razão à recorrente.

Compulsados os autos, tendo em conta o teor de fls. 282 (junção, a 08.05.2023, do requerimento de protecção jurídica), fls. 295 (ofício do ISS, datado de 14.06.2023, onde se dá conta da nomeação de patrono à requerente), fls. 341 (PIC apresentado a 03.07.2023) e fls. 371 (informação do ISS de que a requerente foi notificada do deferimento do requerimento de protecção jurídica e da nomeação de patrono por carta remetida a 23.06.2023), podemos concluir que o PIC foi...

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