Acórdão nº 615/23.9T8PDL.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-11-08

Ano2023
Número Acordão615/23.9T8PDL.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa



AA, intentou[1] acção com processo comum, contra EDA – Electricidade dos Açores, SA, com sede na Rua ..... ..... ....., nº..., P___ D___.
Pede o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado a vincular as partes, bem como a declaração de nulidade da cláusula que prevê o período experimental e a declaração de ilicitude do seu despedimento.
Também solicita a condenação da Ré a reintegrá-lo, com a mesma categoria e sem perda de antiguidade, bem como a pagar-lhe as retribuições intercalares, vencidas desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença e ainda uma indemnização a título de danos não patrimoniais.
Alega, em suma, que, em 2 de Março de 2022, foi admitido pela Ré para, no interesse e sob as ordens, direcção e fiscalização desta exercer funções de “escriturário”’.
Em 8 de Setembro seguinte, a Ré comunicou-lhe a cessação deste contrato.
Alegou fazê-lo dentro do período experimental.
Todavia, tal período já tinha decorrido.
A cessação do contrato consubstancia um despedimento ilícito.
Em 31 de Março de 2023, realizou-se audiência de partes.[2]
A Ré contestou.[3]
Alegou, em síntese, que o Autor foi admitido para o exercício de funções de escriturário de gestão financeira, tendo o contrato um período experimental de 180 dias.
O contrato esteve suspenso por oito dias, durante o mês de Maio de 2022.
O contrato veio a cessar por iniciativa sua, mas dentro do período experimental que lhe era aplicável.
Assim, cessou de forma lícita.
Finaliza sustentando a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Em 11 de Abril de 2023[4], dispensou-se a realização de audiência prévia.
Saneou-se o processo.
Fixou-se o valor da causa em € 6.000,00.
Realizou-se julgamento, em duas sessões, que foi gravado. [5]
Em 23 de Junho de 2023, foi proferida sentença que logrou o seguinte dispositivo:
«
Pelo referido, atentas as orientações atrás explanadas, e ponderados todos os princípios e normas jurídicas que aos factos apurados se aplicam, julga o Tribunal a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos:
a) declara a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, celebrado entre o Autor, e a Ré, EDA – Electricidade dos Açores, SA;
b) declara que o período experimental aplicável a este contrato de trabalho é de 90 dias;
c) declara ilícito o despedimento do Autor, realizado pela Ré;
d) condena a Ré a proceder à reintegração do Autor, com a mesma categoria, antiguidade e direitos;
e) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 3969,00, a título de compensação por despedimento (vencida desde o trigésimo dia anterior à propositura da acção até hoje), com acréscimo das retribuições vencidas desde a presente data até ao trânsito em julgado da sentença, incluindo as prestações devidas a título de retribuição do período de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, mas sem prejuízo do disposto no art. 390º, nº 2, alíneas a) e c), do Código do Trabalho;
f) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 800,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, com acréscimo dos juros de mora devidos sobre esta prestação, calculados à taxa legal, vencidos desde a data da citação até definitivo e integral pagamento.
*
Custas a cargo do Autor e da Ré, na proporção de 1/6 a cargo do primeiro e de 5/6 a cargo da segunda.
*
Registe e notifique. » - fim de transcrição..

As notificações da sentença foram expedidas em 23 de Junho de 2023, data em que o MºPº também foi notificado.[6]
Em 11 de Julho de 2023 , a Ré recorreu.[7]
Concluiu que:
«
a)- O presente recurso versa sobre matéria de facto e de direito, sendo interposto da douta sentença que julgou a ação parcialmente procedente, declarando:
(I) Que o período experimental aplicável ao contrato de trabalho celebrado entre a recorrente e o A é de 90 dias;
(II) A ilicitude do despedimento do Autor, realizado pela Recorrente;
(III) A condenação da Recorrente a proceder à reintegração do Autor, com a mesma categoria, antiguidade e direitos;
(IV) A condenação da Recorrente a pagar ao Autor a quantia de € 3969,00, a título de compensação por despedimento (vencida desde o trigésimo dia anterior à propositura da ação até hoje), com acréscimo das retribuições vencidas desde a presente data até ao trânsito em julgado da sentença, incluindo as prestações devidas a título de retribuição do período de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, mas sem prejuízo do disposto no art. 390º, nº 2, alíneas a) e c), do Código do Trabalho;
(V) A condenação da Recorrente a pagar ao Autor a quantia de € 800,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, com acréscimo dos juros de mora devidos sobre esta prestação, calculados à taxa legal, vencidos desde a data da citação até definitivo e integral pagamento;
b)-A douta sentença recorrida apenas considerou provado no seu ponto 1 que a Recorrente “EDA – Electricidade dos Açores, SA tem como “objecto principal (…) a produção, a aquisição, o transporte, a distribuição e a venda de energia eléctrica”.
Ora, salvo o devido respeito, no ponto 1 deve constar ainda que a apelante é a concessionária exclusiva do transporte e distribuição de energia elétrica para as nove ilhas do Arquipélago dos Açores, conforme alegado em 9 da contestação e resulta do contrato de concessão outorgado em respeito pela Resolução n.º 181/00, de 12 de outubro, publicada no Jornal Oficial, I Série, n.º 41/2000, fazendo parte integrante do setor público empresarial (sendo, portanto, uma empresa pública) por força do disposto no Decreto Legislativo Regional n.º 7/2008/A, de 24.03 [em virtude do facto da maior parte do seu capital social ser detido por uma pessoa coletiva pública (a Região Autónoma dos Açores)], conforme resulta da certidão permanente da apelante (cujo código de acesso é descrito na contestação);
c)-Por essa razão, toda a atividade financeira e contabilística da Recorrente é sujeita à jurisdição/fiscalização do Tribunal de Contas [al. b) n.º 2 do artigo 2º, da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas], sendo ainda uma atividade regulada pela ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, razão pela qual o ponto 1 dos factos dados como provados deve ser alterado, passando a constar, para além do respetivo objeto social, todo o restante descrito acima referido por resultarem (concretamente) do ordenamento jurídico em vigor;
d)-No facto dado como provado no ponto 3, da sentença recorrida, o Tribunal a quo descreve o teor de parte do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrente e o A. Porém, tal como referido nesse mesmo ponto e, ainda, conforme alegado em 5 da contestação, a categoria profissional para a qual o A foi contratado é a de Escriturário de Gestão Financeira que consta do Anexo II, do Acordo de Empresa celebrado entre a R e os sindicatos representativos dos seus trabalhadores (SINDEL - Sindicato Nacional da Indústria e da Energia, SIESI - Sindicato das Indústrias Elétricas do Sul e Ilhas, SINERGIA - Sindicato da Energia, SINDESCOM - Sindicato dos Profissionais de Escritório, Comércio, Indústria, Turismo, Serviços e Correlativos da Região Autónoma dos Açores, SE - Sindicato dos Economistas, SERS - Sindicato dos Engenheiros e SNEET - Sindicato Nacional dos Engenheiros, Engenheiros Técnicos e Arquitetos) - Convenção Coletiva de Trabalho n.º 2/2021, de 19 de janeiro de 2021, Jornal oficial, II Série, n.º 12; e) A alínea d) n.º 1 do artigo 2º, do Anexo I, do acordo de Empresa em vigor, estabelece que as funções exercidas pelo A são executadas por “profissionais qualificados”, por corresponderem ao nível SP, RL
f)-Razão pela qual deve passar a constar no ponto 3 dos factos dados como provados, ou em ponto distinto, que as funções exercidas pelo Autor são de natureza qualificada atendendo ao teor do Acordo de Empresa em vigor e publicado no Jornal Oficial da Região Autónoma dos Açores (Convenção Coletiva de Trabalho n.º 2/2021, de 19 de janeiro de 2021, Jornal oficial, II Série, n.º 12);
g)-O que apenas está em causa nestes autos é determinar se o período experimental do contrato de trabalho sem termo celebrado entre a Recorrente e o Autor é de 180 ou de 90 dias.
Salvo o devido respeito, andou mal a sentença recorrida quando entende que não é possível concluir dos factos provados a complexidade das funções desenvolvidas pelo Autor, fazendo ainda alusão ao montante do vencimento auferido por este;
h)-A complexidade das funções exercidas pelo Autor resulta da especificidade da contabilização de cerca de duas mil faturas mensais, em sistemas próprios e complexos, a sua classificação, gestão, confirmação e aplicação da taxa de IVA adequada e diferenciada a cada uma dessas faturas numa empresa pública que fatura milhões, concessionária do transporte e distribuição de energia, regulada pela Entidade Reguladora do Setor Energético, sob jurisdição do Tribunal de Contas e sujeita a mecanismos de auditoria específicos, tal como resulta dos esclarecimentos das testemunhas arroladas, e, bem assim, daquilo que os sindicatos representativos de todos os trabalhadores da apelante acordaram em sede de Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho [alínea d) n.º 1 do artigo 2º, do Anexo I e Anexo II, da Convenção Coletiva de Trabalho n.º 2/2021, de 19 de janeiro de 2021, Jornal oficial, II Série, n.º 12] i) Andou mal a sentença recorrida quando entende que o prazo de duração do período de experimental aplicável ao contrato de trabalho celebrado entre a Recorrente e o Autor é de 90 dias, que é referente à generalidade dos trabalhadores indiferenciados.
O Autor não era um trabalhador indiferenciado e às suas funções deve corresponder um prazo de duração do período experimental de 180 dias, por serem qualificadas, tecnicamente complexas e pressupõem um elevado grau de responsabilidade, tendo
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