Acórdão nº 6/22.9T8SRT.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2022-11-09

Ano2022
Número Acordão6/22.9T8SRT.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DA SERTÃ DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO)

Processo nº 6/22.9T8SRT.C1– Conferência

Relator: Maria João Areias

1º Adjunto: Paulo Correia

2º Adjunto: Helena Melo

Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

Pelo Juiz relator foi proferido o seguinte despacho de não admissão do recurso de Apelação interposto pela recorrente:

“Admissibilidade do recurso de apelação interposto da decisão proferida em 1.ª instância já em sede recursória de decisão dos Julgados de Paz

As decisões proferidas nos processos cujo valor exceda metade do valor da alçada do tribunal de 1ª instância podem ser impugnadas por meio de recurso a interpor para a secção competente do tribunal de comarca em que esteja sediado o julgado de paz (artigo 62º da Lei nº78/2001, de 13 de julho, na redação da Lei nº 54/2013, de 31 de julho).

Tal norma consagra um regime específico para a recorribilidade das decisões proferidas pelos Julgados de Paz:

i) prevê um alargamento processual quanto ao valor da recorribilidade – podem ser objeto de impugnação as decisões proferidas em processos cujo valor exceda metade do valor da alçada do tribunal da 1ª instancia (2.500,01 €);

ii) os recursos ordinários das decisões dos Julgados de Paz não dependem do valor da sucumbência;

iii) a impugnação é efetuada por meio de recurso a interpor para o tribunal judicial da comarca em que esteja sediado o julgado de paz, que funcionam como uma segunda instancia.

Não prevendo o artigo 62º a possibilidade de recurso para os Tribunais da Relação, a sua admissibilidade só se poderia colocar pela via do artigo 63º, que determina a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, no que não seja incompatível com o disposto na presente lei.

Pelas regras gerais, nas ações cujo valor não ultrapasse a alçada da Relação (30.000 €)[1] o recurso ordinário só é admissível, em regra, em um só grau: do Acórdão da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de justiça, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível recurso, independentemente do valor e da sucumbência (– artigo 629º, ns.1, 2 e 3, e artigo 671º, nº1, 1ª parte, do Código de Processo Civil).

Não se integrando o recurso em questão em qualquer um dos casos em que, independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso, tendo a causa o valor de 9.450,00 €, também pelas regras gerais do Código de Processo Civil seria inadmissível um terceiro grau de jurisdição.

Concluindo, pelo menos, fora dos casos em que, segundo as regras do Código de Processo Civil, é sempre admissível recurso independentemente do valor e da sucumbência, não é admissível recurso para o Tribunal da Relação da decisão proferida em 1ª instância em recurso interposto de sentença proferida num Julgado de Paz[2].”

Não se conformando com tal decisão, veio o recorrente requerer que sobre a mesma recaia Conferência, com os seguintes fundamentos que assim se sintetizam:

1. Entende-se que o despacho de qua agora se reclama padece de erro de atividade, porquanto fez errada interpretação e aplicação das normas processuais.

2. O recurso interposto pelo recorrente de sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, não foi admitida, pelo Tribunal a quem.

3. Pois, entendeu o Tribunal a quem, que não é admissível recurso para o Tribunal da Relação da decisão proferida em 1ª instância em recurso interposto de sentença proferida num Julgado de Paz.

4. Entende-se que a decisão ora reclamada não tem qualquer suporte legal.

5. O art. 62º da Lei 78/2001 de 13 de julho, fixa que as decisões proferidas nos processos cujo valor exceda metade do valor da alçada do tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas por meio de recurso a interpor para a secção competente do tribunal de comarca em que esteja sediado o julgado de paz.

6. Porém, tal diploma nada refere, quanto às decisões proferidas em sede de recurso pelo Tribunal de Comarca.

7. E nada diz, pois, tal extravasa a Lei dos Julgados de Paz, na medida em que a tramitação processual dos Tribunais de 1ª Instância, é regulada pelo Cód. de Processo Civil, e não pela Lei 78/2001 de 13 de julho.

8. No caso concreto, o valor da causa é de € 9.450,00, tendo o Tribunal de Comarca, revogado a sentença proferida pelo Julgado de Paz.

9. Fixa, o art. 63º da Lei 78/2001 de 13 de julho, que é subsidiariamente aplicável, no que não seja incompatível com a presente lei e no respeito pelos princípios gerais do processo nos julgados de paz, o disposto no Código de Processo Civil, com exceção das normas respeitantes ao compromisso arbitral, bem como à reconvenção, à réplica e aos articulados supervenientes.

10. Pelo que, de acordo com o citado art. 63º, as decisões proferidas pelo Tribunal de Comarca, seguem os procedimentos do Cód. Proc. Civil.

11. Fixa o art. 629º do Cód. Proc. Civil, que as decisões proferidas em 1ª instância, são passiveis de recurso, quando a causa tenha valor superior à alçada do Tribunal de que se recorrem e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse Tribunal.

12. O valor da alçada do Tribunal de 1ª instância é de € 5.000,00 (art. 44º nº 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto), tendo a presente ação tem o valor de de € 9.450,00.

13. No caso concreto, nem se verifica a dupla conforme, pois, o Tribunal de comarca (1ª instância) revogou a decisão proferida pelo Julgado de Paz.

14. Atendendo ao fixado no art. 63º da Lei 78/2001 de 13 de julho; ao art. 629º do Cód. Proc. Civil e ao art. 44º nº 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, no caso concreto, é passível, de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra.

15. Aliás, em conformidade, a 1ª Secção do STJ decidido, de forma inequívoca, decidiu recentemente, no Proc. nº 18049/19.8T8PRT.P1.S1, de 03-11-2020, in www.dgsi.pt, tal admissibilidade de recurso.

16. Entendendo que, as decisões proferidas pelos julgados de paz poderão ser reponderadas em recurso pelos tribunais judiciais de 1ª instância e as destes pelas relações, verificando-se os requisitos atinentes ao valor das respetivas alçadas (e grau de sucumbência).

17. A decisão singular, viola assim, entre outros, o art. 63º da Lei 78/2001 de 13 de julho; o art. 629º do Cód. Proc. Civil e o art. 44º nº 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto.

18. Sendo, a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, no caso concreto, passível de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, deverá ser admitido o recurso, a fim de o mesmo ser conhecido.


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Ouvida a parte contraria, nada veio dizer.

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Cumpre apreciar em Conferência a questão da admissibilidade de tal recurso, ao abrigo do disposto no nº3 do artigo 652º, do CPC.

Não se discute aqui que, referindo o artigo 62º da Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz[3], unicamente a possibilidade de recurso das decisões proferidas pelos Julgados de Paz junto dos tribunais de comarca, a admissibilidade de recurso das decisões por estes proferidas em sede de recurso só pela via da aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, prevista no...

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