Acórdão nº 557/22.5GBAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-05-02

Ano2023
Número Acordão557/22.5GBAVV.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes que integram a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I - Relatório

Decisão recorrida

No âmbito do Processo com a forma Sumária nº 557-22...., do Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo Local Criminal ..., foi proferida sentença[1], cuja parte decisória se transcreve:
“Decide-se julgar a acusação deduzida pelo Ministério Público totalmente procedente, por provada, e em consequência:
a) Condena-se o arguido AA pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multa, à taxa diária de 6,00 € (seis euros), o que perfaz o montante global de 450,00 € (quatrocentos e cinquenta euros).
b) Nos termos do artº 69º, nº1, al. a) do Código Penal a arguida AA vai, ainda, condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 (cinco) meses.
c) Mais vai o arguido AA condenado no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs, cfr. art.º 513º e 514º do C.P.P. e art.º 8º, n.º 9, por referência à tabela III, do R.C.P., reduzida a metade atenta a confissão integral e sem reservas (cfr. artigo 344.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal)”.
*
Recurso apresentado

Inconformado com tal decisão, o arguido AA veio interpor o presente recurso e após o motivar, apresentou as seguintes conclusões e petitório, que se reproduzem:

“I. O Tribunal “a Quo” fez errada aplicação do direito, por isso não pode o recorrente concordar com a sentença em apreço.
II. A sentença recorrida violou entre outros os art.º 40.º n.º 2, 69.º, 71.º e 292.º, todos do Código Penal.
III. O presente recurso visa unicamente o reexame da matéria de Direito, uma vez que apenas serão afloradas as questões relativas à medida da pena de multa e da sanção acessória da inibição de conduzir veículos motorizados, que o recorrente considera in casu exageradas e desproporcionais, tendo em conta as finalidades da punição, a culpa do agente e as exigências de prevenção geral e especial.
IV. O recorrente, em sede de audiência de Julgamento prestou uma confissão integral e sem quaisquer reservas, demonstrando profundo e sincero arrependimento, assumindo por inteiro a prática dos factos, tendo sido condenado numa pena de multa de 75 dias á taxa diária de 6,00€ e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 5 meses.
V. No caso vertente, afigura-se-nos desproporcionada a pena de 75 dias de multa aplicada ao arguido,
VI. Entendeu o legislador que a condenação em multa dentro de uma moldura que varia entre os 10 e os 120 dias satisfaz de forma cabal as exigências de prevenção geral de forma a restabelecer as expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida.
VII. E esse desiderato tanto é cumprido com uma punição de 10 dias de multa como com uma punição de 120 dias de multa.
VIII. Uma vez que a pena concreta varia em função da culpa do agente não podendo ir além desta.
IX. A pena concretamente aplicada ao arguido situa-se dentro do último terço da moldura penal prevista para o crime em causa, o que poderia indiciar um elevado grau de culpa, que, salvo o devido respeito, não se verifica.
X. No que se refere ao caso concreto, não foram alegados factos que permitam fazer um juízo de culpabilidade agravada por parte do arguido, de forma a justificar a punição dos factos com 75 dias de multa.
XI. Ademais, do art.º 294.º, n.º 3 em conjugação com o art.º 286.º ambos do Código Penal, resulta a possibilidade da dispensa da pena,
XII. Bem se sabe que a dispensa da pena, mesmo nos casos avulsamente previsto no Código Penal, está sujeita ao regime geral do art.º 74.º do mesmo Diploma, como expressamente resulta do n.º 3 de tal normativo, que dispõe que “quando uma outra norma admitir, com carácter facultativo, a dispensa de pena, esta só tem lugar se no caso se verificarem os requisitos contidos nas alíneas do nº 1”, ou seja, se a ilicitude do facto e a culpa do agente forem diminutas (alínea a)), se o dano tiver sido reparado (alínea b)) e se à dispensa de pena se não opuserem razões de prevenção, o que se verifica in casu.
XIII. Conclui-se assim face a todo o exposto, que a culpa do arguido é diminuta, e por isso devendo, nesta parte, a sentença ser revogada e substituída por outra que fixe a dispensa de pena,
XIV. Ou caso assim não se entenda, considera-se como justa e adequada a pena de 50 dias de multa.
XV. Não pode o arguido concordar também com o montante diário fixado, 6,00€, o qual, face aos factos considerados provados no que concerne ao rendimento e despesas do arguido, se afigura exagerado, impondo-se a sua redução, considerando-se como justo e adequado o montante de 5,00€.
XVI. Foi ainda aplicada ao arguido a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 5 meses, com a qual o arguido não concorda por se mostrar desadequada e excessiva face às necessidades de prevenção geral e especial, e à culpa do arguido.
XVII. Como pena acessória que é, a proibição de conduzir obedece, na determinação da sua medida concreta, essencialmente aos mesmos critérios que para o efeito são utilizados no que respeita à pena principal e que constam do art.º 71.º do Código Penal, visando principalmente censurar a perigosidade do agente e contribuir para a sua emenda, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral de intimidação, a funcionar exclusivamente dentro do limite da culpa.
XVIII. A pena acessória tem uma função preventiva adjuvante da pena principal, cuja finalidade não se esgota na intimidação da generalidade, mas dirige-se principalmente à perigosidade do agente, reforçando e diversificando o conteúdo penal sancionatório da condenação
XIX. Para que a pena acessória deva cumprir a finalidade que o ordenamento lhe confere e que temos por adequado, a sua medida deverá situar-se num plano que procure interiorizar a necessidade de conformação da conduta posterior do arguido à vigência da norma e servirá, certamente, como efeito redentor da conduta assumida, capacitando o arguido da necessidade de refrear qualquer impulso de ingestão de bebidas alcoólicas sempre que tenha de conduzir.
XX. À semelhança do que se verifica em relação à fixação da pena de multa, a culpa do arguido não pode deixar de se considerar diminuta, como diminutas são as necessidades de prevenção especial, atendendo a que se trata de um arguido primário, nada levando a crer que os factos de que vem acusado não se tenha tratado de um episódio único.
XXI. No entanto, em correspondência do que se verifica em relação à fixação da pena de multa, a culpa do arguido não pode deixar de se considerar diminuta.
XXII. Bem como são diminutas as necessidades de prevenção especial, atendendo a que se trata de um arguido primário, nada levando a crer que os factos de que vem acusado não se tenha tratado de um episódio único.
XXIII. Ademais, o arguido é condutor diligente, responsável e cumpridor do Código de Estrada, sendo que os factos de que vem acusado são uma exceção à sua normal condução e comportamento.
XXIV. Mais importa referir que o Arguido é empresário e pelo que detêm um estabelecimento comercial “Talho ...”, sito na Rua ..., ..., ...,
XXV. Face às suas obrigações profissionais o arguido necessita de se deslocar diariamente e recorrentemente de veículo automóvel de forma a dar cumprimento ao transporte de produtos e bens essenciais para clientes, inclusive idosos que precisam que o Arguido leve à sua casa os referidos produtos (cfr. Documento n.º ... que protesta juntar).
XXVI. Mais se diga que o arguido não dispõe de outra alternativa viável para a realização dos serviços que tem que prestar no âmbito da sua atividade profissional, pois como bem se compreende tais serviços não podem ser supridos através de transportes públicos, nem dispõe o arguido de capacidade financeira para os satisfazer de outro modo.
XXVII. Ou seja, o Arguido precisa de fazer transportes de viatura e determinados clientes precisam desse serviço, o que não terá sido relevado na determinação da medida da pena e que agora se requer que o seja.
XXVIII. Além disso, o arguido tem dois filhos menores, que embora estejam a cargo da mãe, é este que se ocupa de os levar e ir buscar à escola todos os dias, bem como a outras atividades lúdicas.
XXIX. Assim face ao exposto fica por demais evidente que o arguido necessita da carta de condução, bem como da viatura e respetiva utilização para a realização do seu trabalho, e única forma de subsistência, bem como necessita para assegurar o transporte dos filhos.
XXX. Deste modo, a sentença recorrida não andou bem na determinação da medida da pena acessória, pois que não ponderou que face a todos os factos dados como provados o que melhor se articula com a manutenção do emprego do arguido, e permite salvaguardar as expetativas de prevenção geral e especial que o ordenamento jurídico impõe, harmonizando a necessária punição do agente pela prática do ilícito, ao mesmo tempo que salvaguarda o direito ao trabalho (artigo 47.º, 1 da Constituição), bem como o dever de manutenção dos filhos (artigo 36.º, 5 da Constituição), nunca seriam a condenação em 5 meses de proibição de condução de veículos a motor
XXXI. O facto de necessitar do título de condução, para o exercício da sua atividade profissional, é, recorde-se fundamental para o arguido, de forma a garantir a sua subsistência e o seu direito ao trabalho.
XXXII. Entende-se que o mínimo de 3 meses, de pena de proibição de condução de veículos a motor, representarem para o arguido um verdadeiro e justo sacrifício, bem como satisfaz a integral realização das finalidades gerais das sanções criminais.
XXXIII. Assim, atento o grau de ilicitude do facto e as referidas exigências de prevenção, entendemos que a pena acessória de proibição de conduzir veículos...

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