Acórdão nº 5452/20.0T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-02-27

Ano2023
Número Acordão5452/20.0T8VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Procº nº 5452/20.0T8VNG.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1318)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

AA intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra A... Ldª e BB, esta litigando com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, pedindo que:
- se condene as Rés a pagar solidariamente à Autora a quantia de 7.550,08 € acrescida de juros de mora após citação.
- se condene as Rés a pagar-lhe solidariamente à autora a título de danos não patrimoniais a quantia nunca inferior a 5.000,00 € acrescida de juros de mora após a citação.
- se condene as Rés a pagar-lhe solidariamente a quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença, acrescida de juros de mora, relativa à diferença salarial relativa à categoria profissional desempenhada pela autora e o valor pago.
Alegou, para tanto, em suma, que foi admitida, por contrato de trabalho, para desempenhar para a A..., Ld.ª determinadas funções, contrato esse que veio a cessar por resolução do mesmo pela A. com invocação de justa causa.
A segunda Ré, sócia e única gerente da primeira Ré, após ser decretado o estado de emergência, por causa da Covid 19, não mais voltou à loja onde a autora desempenhava as suas funções, saiu de Portugal, deixando de comparecer na sede da primeira Ré, onde tinha o estabelecimento comercial.
No decurso da relação laboral, a 2ª Ré não a remunerou pelas funções de gerente que assumiu, retirou-lhe tais funções, acrescentou-lhe outras que nunca realizou, alterou-lhe o horário de trabalho, fazendo com que este não coincidisse com o horário de abertura do público do espaço onde se encontrava implantado o estabelecimento comercial no qual laborava, cancelou o seguro de saúde de que a A. beneficiava juntamente com os filhos, e não entregou a esta determinados quantitativos que recebeu do Estado a título de apoio social e que àquela se destinavam, facto que integram o conceito de assédio moral previsto no artigo 29.º n.º 1, do CT, reclamando das RR a indeminização de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
A A. passou a exercer as funções de gerente de loja em março de 2018, por determinação da Ré sociedade, cuja remuneração base é superior a 700,00 € que a Ré sociedade lhe pagou, pelo que, desde março de 2018 até à cessação do contrato em 4 de agosto de 2020 a A. tem direito a receber as diferenças salariais, cujo valor deve ser fixado em sede de liquidação em execução de sentença.
Reclama também o pagamento de 2.586,75 € relativa a férias e proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal, a quantia de 3.150,00 € a título de indemnização por resolução do contrato de trabalho com justa causa e as retribuições referentes aos meses de maio a julho de 2020, quantias essas acrescidas de juros demora.
A segunda Ré é solidariamente responsável pelo pagamento das quantias em dívida, reclamadas pela autora na presente ação, pois foi ela que recebeu o subsídio do Estado para a manutenção do posto de trabalho da autora durante o Estado de Emergência a que se refere a resolução da Assembleia da República 15-A/2020, desde 18 de março de 2020 a 30 de abril de 2020 e depois deste cessar, durante o Estado de Calamidade a que se refere a resolução do conselho de ministros n.º 33-A/2020, desde 30 de abril de 2020.
Quis a segunda Ré, à revelia da decisão societária e da lei, com o intuito de privar a autora do seu salário e desta forma dar causa a cessação do contrato de trabalho por justa causa, não pagar o salário fazendo seu o subsídio do Estado e, bem assim, quis a segunda Ré, à revelia da decisão da sociedade Ré, provocar a autora, assediando-a, com o objetivo de provocar-lhe o desespero perante a privação do seu salário, deixando-a doente e incapacitada para o trabalho.

Realizou-se a audiência de partes, na qual, conforme respetiva ata de 01.10.2020, estiveram presentes a A., a Ré BB, e também em representação da 1ª Ré, bem como os respetivos mandatários, tendo-se frustrado a tentativa de conciliação e sido nela, ata, consignado, para além do mais, o seguinte:
“Declarada aberta a audiência, no âmbito do cumprimento ao disposto no art. 55.º, n.º 1, do CPT, pela Autora foi reiterada a posição vertida na petição inicial, tendo sido dito pelas Rés que há alguns salários por pagar, mas que necessita de verificar com a sua contabilista os valores, pelo que não é possível obter neste momento entendimento.”

As RR contestaram: invocaram a “ilegitimidade passiva” da Ré A... Lda., por, à data da entrada em juízo da p.i., já ter sido dissolvida e liquidada, com registo do encerramento da liquidação no dia 16.08.2020, bem como a ilegitimidade passiva da 2ª Ré, por não ter a A. alegado que a sociedade extinta possuía bens e/ou valores e que os mesmos foram distribuídos pela sócia demandada BB e invocando ainda a ineptidão da p.i. Contestou também por impugnação, concluindo no sentido da inexistência de assédio e de justa causa de resolução do contrato de trabalho e deduziu pedido reconvencional, pedindo a condenação da A. a pagar-lhe a quantia de 1.400,00€ a título de indemnização pela falta de aviso prévio, acrescida de juros de mora desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento.

A A. respondeu à contestação, concluindo como na p.i. e no sentido da improcedência do pedido reconvencional, mais requerendo que os presentes autos sigam seus termos até final contra a Ré BB, nos termos do artigo 162.º n.º 2 do Código das Sociedades Comerciais.

Foi (aos 13.04.2021) proferido despacho de aperfeiçoamento da contestação, ao que a Ré respondeu conforme requerimento de 26.04.2021.

Aos 21.06.2021 foi proferido despacho a fixar o valor da ação em € 13.950,08, bem como despacho saneador em que:
i) Quanto à “Exceção de falta de personalidade judiciária – indevidamente qualificada como ilegitimidade passiva − da ré A... L.da”:
Se considerou como assente o seguinte:
“Encontra-se já documentalmente provada, com interesse para a apreciação da arguida exceção, a seguinte matéria de facto:
1 – A autora AA instaurou em 3 de setembro de 2020 a presente ação contra as rés A... L.da. e BB.
2 – Conforme inscrição efetuada pela Ap. ... de 20180810 no registo comercial da sociedade A... L.da., das alterações ao contrato de sociedade, a ré BB é a única titular das duas quotas da referida sociedade, conforme consta da certidão permanente junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
3 – Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 5 – Ap. ..., a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
4 – Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 6 – Of. 1 da Ap. ..., o cancelamento da matrícula da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
5 – O registo da dissolução e liquidação da sociedade A... L.da. foi efetuado com base na Ata n.º 8 da reunião realizada em 14/08/2020 da Assembleia Geral da sociedade A... L.da., com a presença da sócia BB, titular das duas quotas da sociedade que representam a totalidade do capital social, a qual deliberou a aprovação por unanimidade da dissolução da sociedade, tendo ainda sido aprovado por unanimidade a declaração de encerramento da liquidação, por inexistência de ativo e passivo, tudo conforme consta da cópia da referida ata junta a fls. 158 a 162 pela Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia”,
E se decidiu julgar a mencionada exeção procedente, absolvendo a 1ª Ré da instância.
ii) Quanto à “Exceção de ilegitimidade passiva da ré BB; exceção de ineptidão da petição inicial”, concluindo:
“Conclui-se, assim, que face à existência de vários pedidos e diferentes causas de pedir, a ré BB é parte legítima na ação, nomeadamente, quanto ao pedido de condenação no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora, em consequência das condutas que lhe são imputadas pela autora na petição inicial”,
iii) Mais tendo decidido “Pelo exposto, julgo manifestamente improcedente o pedido deduzido nesta ação, de condenação (fundada na responsabilidade solidária desta ré com a sociedade empregadora A... L.da.) da ré BB no pagamento da quantia de € 7.550,08 respeitante a salários em atraso, férias não gozadas, subsídio de férias e proporcionais de férias e subsídios de férias e de natal devidos e não pagos pela ré sociedade A... L.da., e respeitante à indemnização devida pela sociedade A... L.da pela resolução do contrato com justa causa efetuada pela autora, fundado nos factos alegados na petição inicial), absolvendo a ré BB de tal pedido.
Custas na proporção do valor deste pedido (€ 7.550,08) a cargo da autora.”.
iv) Não admitiu a reconvenção;
v) Determinou-se o prosseguimento da ação no que se reporta ao pedido de condenação da 2ª Ré no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora, tendo-se procedido à identificação do objeto do litígio e indicação dos temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Ré[1] do pedido.

Inconformada, a A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1.ª) Por terem relevância para a compreensão da motivação da recorrida (intencionalidade delituosa ou mobbing) ao praticar os factos dados como provados na sentença recorrida,
...

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