Acórdão nº 54/23.1Y3VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 12-07-2023

Data de Julgamento12 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão54/23.1Y3VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso Penal (contraordenação) n.º 54/23.1Y3VNG.P1
Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – J3



Acordam em conferência na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto


RELATÓRIO
Em processo de contra ordenação foi aplicada pela Sub/Diretora do Centro Local do Grande Porto da Autoridade para as Condições do Trabalho (no uso de competência delegada pelo Sr. Inspetor-Geral do Trabalho), à sociedade “A..., S.A.” (arguida), coima no valor de € 9.180,00, pela prática, a título de negligência, da contra ordenação muito grave, prevista no art.º 3º do DL nº 50/2005, de 25 de fevereiro[1] , em conjugação com o disposto no art.º 15º, nos 1, 2 e 3 da Lei nº 102/2009, de 10 de setembro[2] , art.º 43º, nº 1 do DL nº 50/2005 e artos 554º, nº 4, al. e) e 556º, nº 1, do Código do Trabalho, estando em causa o incumprimento pela arguida da obrigação de assegurar aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspetos relacionados com o trabalho.
Foi ainda determinado que AA e AA, como administradores da sociedade arguida, ficassem solidariamente responsáveis pelo pagamento da referida coima, nos termos do art.º 551º, nº 3 do Código do Trabalho (pág. 238).

Inconformada com tal decisão, apresentou a sociedade arguida impugnação judicial, concluindo dever a decisão administrativa ser declarada nula por algum dos motivos invocados (estando alegada a “falta de elemento subjetivo na decisão administrativa”).

O MºPº não se opôs a que fosse proferida decisão por despacho e, depois de a arguida, na sequência de notificação para tanto, ter declarado igualmente não se opor a que fosse proferida decisão sem necessidade de julgamento, foi proferida despacho (nos termos do art.º 39º RPCOLSS[3]) decidindo julgar improcedente a impugnação apresentada e, em consequência, manter a decisão administrativa que aplicou à arguida a referida coima no valor de € 9.180,00, pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelos artos 3º e 43º, nº 1, ambos do Decreto-lei n.º 50/2005, de 25 de fevereiro, em conjugação com o disposto nos nos 1, 2 e 3 do art.º 15º da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro.

Não se conformando com sentença proferida, dela interpôs recurso a arguida, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[4]:
1. Vem o presente recurso colocar em crise a sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho em que manteve a condenação da Recorrente.
2. Entende a Recorrente que a decisão administrativa é nula, quer pelo facto de não fazer menção do elemento subjetivo no auto de notícia quer pela sua omissão na decisão administrativa;
3. Entende a Recorrente que tal coarta o seu direito de defesa.
4. O auto de notícia não contém quaisquer menções ao elemento subjetivo da contraordenação pela qual foi a impugnante acusada, sendo que tal é “confessado” na própria decisão administrativa – página 29, 3º parágrafo;
5. Na decisão administrativa, defende-se a não obrigatoriedade de menção do elemento subjetivo comparando-se o auto de notícia, à participação criminal ou à notícia do crime – página 29, 7º parágrafo;
6. Como aí referido e até na sentença ora colocada em crise, defende-se tal pelo facto de não estar expressamente previsto no art.º 15º da Lei 102/2009;
7. Curiosamente quanto à decisão administrativa, já se defende a obrigatoriedade da menção do elemento subjetivo, sendo que a norma que se ocupa de tal (art.º 25º) também não refere expressamente o elemento subjetivo;
8. O elemento subjetivo deverá constar no auto de notícia, até porque o processo contraordenacional pode terminar aí, se o arguido efetuar o pagamento voluntário.
9. A arguida tem o direito de conhecer a plenitude dos factos que lhe são imputados para optar se se quer defender ou não.
10. Parece-nos legítimo que a arguida não pretenda apresentar qualquer defesa se lhe for imputado uma conduta por negligência e já o pretender fazer se a conduta que lhe for imputada o ser a título de dolo.
11. Ora, tal prerrogativa da arguida apenas é respeitada se do auto de notícia constar o elemento subjetivo;
12. Elemento subjetivo esse que pode muito bem ser “integrado”, “nas circunstâncias em que foram cometidos (os factos)” conforme nº 1 do art.º 15º da Lei 102/2009.
13. Aliás, até para se aferir a coima a pagar, tem a autoridade administrativa forçosamente que se debruçar sobre o elemento subjetivo.
14. Não constando no auto de notícia qualquer referência ao elemento subjetivo, não estava a Recorrente em condições de exercer cabalmente a sua defesa.
- da falta de elemento subjetivo na decisão administrativa -
15. Quer a aqui Recorrente, quer o Tribunal a quo considera que na decisão deve constar o elemento subjetivo.
16. O Tribunal a quo considera que o mesmo se encontra presente na decisão através de uma expressão vaga e abstrata.
17. A Recorrente entende que não.
18. Aqui chegados, dúvidas não poderão subsistir que a decisão é nula por qualquer um dos motivos: a) falta do elemento subjetivo no auto de notícia que não permite a defesa cabal da Recorrente; b) falta do elemento subjetivo na decisão administrativa.
Termina dizendo dever ser julgado procedente o recurso, sendo a decisão administrativa declarada nula e a recorrente absolvida.

Foi proferido despacho a admitir o recurso, para subir imediatamente, nos próprios autos e efeito suspensivo.

O MºPº apresentou resposta ao recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
− Inexiste fundamento válido para a alteração da decisão judicial recorrida, porquanto,
− O auto de contraordenação lavrado pela entidade administrativa não enferma de nenhuma nulidade, porquanto contém todos os elementos previstos e exigidos pelo artigo 15º do Regime Processual aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 107/2009, de 14/09;
− A decisão administrativa proferida pela ACT não padece de nenhuma nulidade, uma vez que da mesma consta, quer no segmento da factualidade dada como provada, quer na parte relativa à Fundamentação de Direito, a descrição do elemento subjetivo da contraordenação imputada à arguida; pelo que,
− Deverá o recurso interposto pela arguida ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, nos seus precisos termos.

Já neste Tribunal da Relação, o Senhor Procurador-Geral-Adjunto, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, referindo essencialmente o seguinte:
4.1. Como se disse resulta das conclusões da Recorrente que pretende que seja declarada nula a douta sentença recorrida e ser absolvida da prática da contraordenação, uma vez que não consta do auto de noticia bem como da decisão administrativa, o elemento subjetivo da infração.
Às contraordenações laborais aplica-se o Regime Processual das Contraordenações Laborais e de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 107/2009, de 14/09, e em termos subsidiários, o Regime Geral das Contraordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10) e o Código de Processo Penal.
No âmbito das contraordenações laborais, o direito de defesa na fase administrativa do procedimento vem
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