Acórdão nº 516/18.2PBOER.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-03-23

Ano2023
Número Acordão516/18.2PBOER.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, os Juízes na 9ª Secção Criminal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
No Juízo Local Criminal de Oeiras (Juiz 2), do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, no âmbito do processo comum nº 516/18.2PBOER, com intervenção do Tribunal singular, o arguido A, devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento pela prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de ameaça, previsto e punido pelo disposto no artigo 153.º, do Código Penal e de um crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º, nº 1 do Código Penal, tendo a final sido proferida sentença que decidiu:
1- Condenar o arguido A na pena única de 85 (oitenta e cinco) dias de multa, à taxa diária de € 7 (sete) euros, no montante global de €595,00 (quinhentos e noventa e cinco) euros, pela prática, como autor, em concurso real:
a) de um crime de ameaça, previsto e punido, pelos artigos 153.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa; e
b) de um crime de injúria, p. e p. no art.º 181º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa;
2- Condenar o arguido/demandado A a pagar à ofendida/assistente/demandante B a quantia de €500,00 (quinhentos) euros, a título de indemnização devida por danos não patrimoniais, bem como no pagamento dos juros vencidos e vincendos, a contar da data da decisão e até efectivo e integral pagamento, nos termos dos artigos 562.º e 566.º, ambos do Código Civil.
Previamente à prolação da decisão final foi, pelo arguido A, interposto o seguinte recurso interlocutório:
a) Recurso de fls. 200 a 217 dos autos [referência citius 20697688], que incidiu sobre o despacho judicial de 15.03.2022 [com referência citius 135421600], com as seguintes conclusões (transcrição):
A - Vem o presente Recurso interposto do Despacho da Mma. Juiz de Direito de 15-03-2022, que indefere o Pedido do conhecimento da Nulidade de todo o Processado quanto ao crime de injúria – que determinaria o arquivamento dos autos quanto a este crime - , por, apesar de reconhecer a existência do vício da intempestividade da constituição como assistente por parte da ofendida e do vício da aceitação como assistente por parte do Senhor Dr. Juiz de Instrução, entender que o mesmo se encontra sanado através da intervenção da Dr.ª CM quando dirigiu ao processo o requerimento de 22-07-2019, sem que nunca a mesma tivesse junto procuração forense ao processo, sem que nunca tivesse sido notificada para fazê-lo, sem que nunca o arguido fosse notificado para, querendo, ratificar o processado, antes pelo contrário, ter o arguido vindo juntar declaração de não ratificação do processado, por nunca ter existido mandato forense conferido pelo arguido à Dr.ª CM para intervir nos presentes autos,
B - Despacho este que recaiu sobre os Requerimentos do arguido de 17-01-2022 e de 07-02-2022.
C - S.m.o, não se concorda com tal entendimento, devendo o Despacho da Mma. Juiz de Direito de 15-03-2022 ser revogado e substituído por Despacho que reconheça o vício da intempestividade da constituição da ofendida como assistente, determinando-se o imediato arquivamento dos autos quanto ao crime de injúria, assim como a improcedência do pedido cível, mais se determinando que o acto praticado pela Dr.ª CM seja considerado ilegal, por ter agido em excesso de mandato, do que devem ser extraídas as devidas e legais consequências, e ainda considerando que tal acto, em consequência, não tem a virtualidade de sanar qualquer irregularidade.
D - Em 18-02-2018, a denunciante B apresentou e formalizou a queixa-crime contra o arguido, tendo-lhe sido entregue fls. 4 e 5 dos autos, Auto de Denúncia, donde consta que “Quanto aos factos que possam configurar crime de natureza particular, o (a) denunciante foi informado(a) de que é obrigatório constituir-se assistente no processo, constituir advogado e proceder ao pagamento da taxa de justiça, no montante de uma Unidade de Conta (102 Euros cento e dois Euros [sic] ), no prazo de dez dias, a contar deste momento em que está(ão) a ser notificado(s) para o efeito, e através de requerimento que terá(ão) que fazer nos serviços do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, sob pena de arquivamento do procedimento criminal, dos factos criminais com natureza particular”, que se encontra assinado pela denunciante e pelo Autuante.
E - Mais foi entregue à denunciante, nesse mesmo acto, a Notificação que corresponde a fls. 6, 7 e 8 dos autos, donde consta que “Se assistente ou parte civil: (…) Obrigatoriedade de se constituir como assistente no processo nos crimes de natureza particular. Fica advertido, nos termos do artigo 246, n.º 4 do CPP, de que deve constituir-se assistente no processo mediante requerimento a apresentar no prazo de 10 dias a constar desta data, conforme estipulado no Artigo 68.º, n.º 2, do CPP. Foi verbalmente informado sobre o regime do direito de queixa e suas consequências processuais, conforme o estipulado no n.º 2, do artigo 247.º, do CPP). (…) Neste acto foi entregue ao notificado(a) cópia deste documento, que declara ficar ciente do seu conteúdo e vai assinar”, notificação essa que se encontra efectivamente assinada pela Notificada, a Denunciante e pelo Notificante.
F - Não obstante, a Denunciante nada fez no prazo de 10 dias, nem no 1.º dia útil seguinte, 29-06-2018, sexta-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 0,5 UC (cfr. alínea a), do artigo 107.º-A, do CPP), nem no 2.º dia útil seguinte, 02-07-2018, segunda-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 1 UC (cfr. alínea b), do artigo 107.º-A, do CPP), nem no 3.º dia útil seguinte, 03-07-2018, terça-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 2 UC (cfr. alínea c), do artigo 107.º-A, do CPP), como nada consta do processo quanto a qualquer justo impedimento (cfr. artigo 107.º-A, do CPP e artigo 145.º, n.ºs 5 a 7, do CPC, actual artigo 139.º), o que também nunca fora invocado.
G - Impunha-se que o Senhor Procurador do MP tivesse determinado o arquivamento do procedimento criminal quanto aos factos criminais com natureza particular, por falta de legitimidade na promoção do processo.
H - Não obstante, o Senhor Procurador do MP não determinou o arquivamento dos autos e, em 04-07 2018 ordenou nova notificação da denunciante, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 68.º 2, e artigo 246.º, n.º 4, do CPP, repetindo a notificação que já havia sido feita, não obstante carecesse já de legitimidade para a dita promoção.
I - A denunciante foi notificada em 27-09-2018 (cfr. fls. 24) de que dispunha novamente de 10 dias para dar cumprimento ao disposto no n.º 2, do artigo 68.º e n.º 4, do artigo 246.º, notificação essa que ocorreu nos termos e para os efeitos do n.º 2, do artigo 113.º do CPP.
J - De forma que, considerando-se notificada no dia 01-10-2018, segunda-feira, a denunciante teria de ter dado cumprimento ao teor da notificação até ao dia 11-10-2018, quinta-feira, prazo que voltou a não ser cumprido, como também não foi cumprido no 1.º dia útil seguinte, em 12-10-2018, sexta-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 0,5 UC (cfr. alínea a), do artigo 107.º-A), do CPP), no 2.º dia útil seguinte, em 15-10-2018, segunda-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 1 UC (cfr. alínea b), do artigo 107.º-A, do CPP), nem no 3.º dia útil seguinte, em 16-10-2018, terça-feira, mediante o pagamento de multa equivalente a 2 UC (cfr. alínea c), do artigo 107.º-A, do CPP), nem, em última análise, em data posterior, mediante a alegação e comprovação de justo impedimento (cfr. artigo 107.º-A, do CPP e artigo 145.º, n.ºs 5 a 7, do CPC, actual artigo 139.º), o qual também nunca fora invocado.
K - Somente em 17-10-2018 (FLS. 27) é que a denunciante veio ao processo requerer a sua constituição como assistente, constituir advogado e proceder à junção do pagamento da taxa de justiça de €102,00, sem ilidir a presunção do n.º 2 do artigo 113.º do CPP, que, por ser uma presunção ilidível, implicaria que o notificado alegasse e provasse que a notificação ocorreu em data posterior ao 3.º dia útil ao do seu envio, por serem ónus seus.
L - Só em 02-02-2022, depois do requerimento do arguido de 17-01-2022, em que arguiu o vício da intempestividade do requerimento da ofendida, é que a ofendida vem alegar e provar que a notificação para se constituir como assistente ocorreu em data posterior ao 3.º dia útil á do envio, o que também não foi reconhecido no Despacho de que ora se recorre.
M - De resto, o Supremo Tribunal de Justiça fixou Jurisprudência quanto a este propósito, em Acórdão de 26-01-2011, disponível em www.dgsi.pt, tendo consignado por unanimidade os Senhores Venerandos Conselheiros que “O prazo de 10 dias fixado no n.º 2 do artigo 68.º do Código de Processo Penal é um prazo peremptório”, e que “Em procedimento dependente de acusação particular, o direito à constituição como assistente fica precludido se não for apresentado requerimento para esse efeito no prazo fixado no nº 2 do artigo 68.º do Código de Processo Penal”.
N - O Senhor Procurador do MP pronunciou-se, em 18-01-2022, tendo invocado que “(…) Relativamente ao invocado regime de perentoriedade do prazo para constituição de assistente, previsto no artigo 68º, 2, do Código de Processo Penal, é inequívoco que assim é, e como tal como foi reconhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 1/2011, não sendo tal questão disputada, pelo que nada aditaremos sobre a mesma. Também não disputamos que, efetivamente, não deveria ter sido novamente notificada a queixosa para se constituir assistente, quando a mesma já o havia sido quando da apresentação da queixa, e menos ainda quando já se mostrava precludida a possibilidade de requerer tal constituição por já ter então decorrido o prazo de 10 dias concedido para o efeito”.
O - Continuando: “Ora, sucede, que a situação
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