Acórdão nº 5084/21.5T8SNT-E.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-05-16

Ano2023
Número Acordão5084/21.5T8SNT-E.L1-1
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam as Juízas da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa


1.Relatório:


Em 02/08/2022, RCS intentou a presente ação declarativa de verificação ulterior de créditos contra:
A insolvente, LAS, SA, a massa insolvente de LAS, SA, representada pelo Administrador de Insolvência e os Credores da Massa Insolvente de LAS, SA.

Pedindo seja a presente ação julgada procedente por provada e, consequentemente:
a)-seja ordenada a citação urgente dos réus para contestar querendo;
b)-Ser reconhecido que o contrato de trabalho do autor cessou por caducidade;
c)-Ser declarado e reconhecido um crédito do autor sobre a insolvência no montante total de € 7.722,47, assim descriminado:
Compensação por caducidade € 4.151,50
Férias não gozadas € 950,00
Subsídio de férias € 950,00
Proporcional de férias € 556,99
Proporcional de subsídio de férias € 556,99
Proporcional de subsídio de natal € 556,99
TOTAL …………………………….…… € 7.722,47
d)-Ser declarado e reconhecido que o crédito do auto goza de privilégio mobiliário e imobiliário especial, graduando o mesmo nos devidos termos;
e)-Ser a massa insolvente condenada no pagamento ao autor do crédito de € 7.722,47, acrescido de juros legais à taxa em vigor até integral pagamento, a contar da citação.

Para tanto alegou, em síntese, que foi trabalhador da ré insolvente desde 01-04-2013, exercendo as funções de Assistente de cabine, auferindo a retribuição base mensal de € 950,00. O seu contrato de trabalho foi suspenso entre abril e agosto de 2020 ao abrigo do regime de lay-off simplificado, tendo recebido o último pagamento em julho de 2020. Suspendeu o contrato de trabalho por falta de pagamento em setembro de 2020.

A ré insolvente foi declarada insolvente em 13/08/2021, quando o seu contrato de trabalho se encontrava suspenso, não tendo o Sr. Administrador da Insolvência comunicado até ao momento ao autor, nos termos e para os efeitos do art. 348º do Código do Trabalho, a cessação do seu contrato ou o encerramento definitivo da empresa, cuja manutenção em atividade foi entendida como inviável no relatório apresentado nos termos do art. 156º do CIRE.

Atenta a manutenção do encerramento da empresa, verifica-se uma “impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho” pelo que o seu contrato de trabalho caducou, ainda que tal caducidade não lhe tenha sido comunicada até ao momento. Tal caducidade confere ao autor direito a reclamar no prazo de um ano fixado no art. 337º do CT, os créditos de que seja titular em consequência da cessação do contrato de trabalho. Pede a citação urgente dos RR. para evitar que ocorra após o prazo de 1 ano decorrido após a declaração de insolvência.

Foram oficiosamente realizadas as citações dos RR.

Não foi apresentada qualquer contestação.

Em 08/12/2022, foi proferido o seguinte despacho:
“A Insolvente, LAS, SA, foi declarada como tal por sentença proferida em 13.08.2021, com efeitos limitados, nos termos do art.º 39.º, n.º 1, do CIRE.
A referida sentença foi complementada, nos termos do art.º 39.º, 4, do CIRE, por decisão proferida em 02.12.2022, transitada em julgado em 23.12.2021.
A presente acção foi instaurada em 02.08.2022.
Acresce que o A. consta da lista de créditos reconhecidos, com créditos reconhecidos, de natureza laboral.
Nos termos e para s efeitos do art.º 3.º, n.º 1, do CPC, fixo o prazo de 10 dias para o A. se pronunciar, querendo, quanto à intempestividade e inadmissibilidade da acção, nos termos do art.º 146.º, n.º 2, do CIRE.
Notifique.”

O A. veio pronunciar-se, alegando que reclamou oportunamente os créditos de natureza laboral vencidos e não pagos à data da insolvência e que o seu contrato de trabalho cessou apenas por caducidade com a declaração constante no relatório elaborado pelo Sr. Administrador de Insolvência nos termos do art. 155º do CIRE, datado de 05-04-2022, razão pela qual apenas na presente ação veio, tendo por base a caducidade do contrato de trabalho do autor, ocorrida já após a declaração de insolvência e nunca comunicada, reclamar os créditos de natureza laboral, vencidos após aquela declaração e decorrentes da cessação do contrato de trabalho. O pedido é admissível e tempestivo, nos termos do art. 337º, nº1 do CT.

Em 20/01/2023, foi proferida a seguinte decisão:
“Decide-se assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, julgar intempestiva a acção, em consequência absolvendo os Réus do pedido.
Custas a cargo do Autor, fixando-se o valor da causa em conformidade com o indicado na petição inicial (art.ºs 305.º e 306.º do CPC e 148º do CIRE).
Registe e notifique.”

Inconformado apelou o A., pedindo seja o presente recurso julgado procedente e revogada a decisão proferida e atenta a ausência de contestação ser julgado procedente o pedido formulado, apresentando as seguintes conclusões:
a)-Os créditos laborais cujo reconhecimento é pedido não se constituíram em data anterior à declaração de insolvência, sendo decorrentes da caducidade do contrato de trabalho por encerramento definitivo da empresa;
b)-O contrato de trabalho do recorrente encontrava-se suspenso na data de declaração de insolvência, cuja acção, de resto até foi contestada pela entidade patronal;
c)-Até ao momento, o Administrador de insolvência não deu cumprimento ao estabelecido no art. 347º, do Código de trabalho, limitando-se, em sede de relatório apresentado 05-04-2022 nos termos do art. 155º do CIRE, a declarar que a actividade da ré é inviável, devendo ser determinado o respectivo encerramento;
d)-Atenta a manutenção do encerramento da empresa, verifica-se, nos termos do art. 343º, b) do Código do Trabalho, uma “impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho”, entendendo o recorrente que o seu contrato de trabalho caducou, ainda que tal caducidade não lhe tenha sido comunicada até ao momento;
e)-Motivo pelo qual, além do reconhecimento dos créditos laborais, pede nos igualmente autos e em primeiro lugar o reconhecimento da cessação do contrato de trabalho por caducidade;
f)-Tal caducidade confere ao autor direito a reclamar no prazo de um ano fixado no art. 337º do CT, os créditos de que seja titular em consequência da cessação do contrato de trabalho, o que o recorrente fez,
g)-Como é entendimento pacífico da nossa jurisprudência, de que é exemplo Ac. TRG, Proc. nº1/08.0TJVNF-EW.G1, de 21-04-2022, disponível em www.dgsi.pt, segundo o qual “I. Distinguem-se no CIRE os créditos sobre a massa insolvente (cuja constituição resulta, grosso modo, do próprio processo de insolvência), pagos precipuamente, sem necessidade de reclamação e logo que se vençam, e os créditos sobre a insolvência (cuja constituição ocorre em momento anterior à insolvência), pagos depois daqueles primeiros, e apenas se tiverem sido reclamados e reconhecidos por sentença transitada em julgado.
II.–Os créditos laborais constituídos após a declaração da insolvência constituirão: créditos sobre a massa insolvente, se tiverem natureza remuneratória (v.g. salários, subsídios de férias, subsídios de natal, subsídios de alimentação); e créditos sobre a insolvência, se tiverem natureza compensatória por cessação do contrato de trabalho. (…) IV. O trabalhador que pretenda intentar uma acção com vista ao reconhecimento de créditos emergentes da vigência ou cessação do seu contrato de trabalho, terá que o fazer no prazo máximo de um ano a contar da sua cessação, nos termos do art. 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho; e, não o fazendo então, não poderá depois intentar uma acção de processo comum, nos termos do art. 89.º, n.º 2, do CIRE, para o mesmo efeito (nomeadamente, para obter título executivo, que reconheça e qualifique os seus créditos laborais como créditos sobre a massa insolvente).”;
h)-Constituídos após a declaração de insolvência, errou o Tribunal a quo ao considerar intempestiva a proposição da acção, violando claramente o regime resultante da aplicação conjugada dos art. 337º e 347º do Código de trabalho;
i)-Errou igualmente o Tribunal a quo ao entender que, em qualquer circunstância, o direito do recorrente estaria já caducado, porquanto, a acção terá sido proposta para lá dos prazos previstos no art. 146º, nº2, b) do CIRE;
j)-Proposta a acção, a citação foi efectuada regularmente, sem que tenha sido apresentada qualquer contestação e, como tal, invocada qualquer caducidade de direito de acção ou outro;
k)-Por um lado, não se regista qualquer caducidade, porquanto atendendo ao supra exposto, os prazos legais para pedido de reconhecimento ulterior de créditos não se mostram ultrapassados;
l)-Por outro lado, nos termos do art. 333º, nº1 a caducidade apenas é de conhecimento oficioso, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes, sendo que quando não se verificar tal situação, há lugar à aplicação do estabelecido do regime previsto no art. 303º do mesmo diploma, ou seja, “o tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público”;
m)-Os créditos laborais cujo reconhecimento é pedido nos autos constituem já direitos disponíveis, por quanto o seu pedido de reconhecimento é apresentado já após a cessação do contrato de trabalho;
n)-Esse é o entendimento pacífico e dominante da nossa jurisprudência, de que são exemplos Ac. STJ, Proc. nº399/13.9TTLSB.L1.S1, de 20-12-2017, Ac. STJ, Proc. nº04S3154, de 03-03-2005 ou Ac. STJ, Proc. nº01S4270, de 20-11-2003, todos disponíveis em www.dgsi.pt, segundo os quais os direitos laborais do trabalhador são irrenunciáveis e como tal indisponíveis apenas durante a vigência do contrato de trabalho, cessando tal indisponibilidade com o fim da relação laboral;
o)-Como tal, não poderia, como fez, o Tribunal a quo conhecer
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