Acórdão nº 5/09.6IDSTR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-02-07

Ano2023
Número Acordão5/09.6IDSTR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

1. RELATÓRIO


A – Decisão Recorrida

No processo comum com intervenção de tribunal singular nº 5/09.6IDSTR, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Competência Genérica de Rio Maior, efectuado julgamento nos termos da acusação formulada pelo MP, foi decidido pelo Tribunal (transcrição):

a) Declarar extinto o procedimento criminal contra a sociedade arguida AAA, Ld.ª (artigo 128.º do Código Penal).
b) Condenar o arguido BBB, pela prática, em co-autoria de um crime de fraude fiscal qualificado, previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, alínea b), e artigo 104.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão;
c) Suspender a execução da pena referida em b) pelo período de 3 (três) anos, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP (artigos 50.º, do Código Penal).
d) Condenar a sociedade arguida CCC Ld.ª, pela prática, em co-autoria de um crime de fraude fiscal qualificado, previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, alínea b), e artigo 104.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 350 (trezentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia de 2.450,00 (dois mil, quatrocentos e cinquenta euros),
e) Condenar o arguido DDD, pela prática, em co-autoria de um crime de fraude fiscal qualificado, previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, alínea b), e artigo 104.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão;
f) Suspender a execução da pena referida em e) pelo período de 2 (dois) anos, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP (artigos 50.º, do Código Penal).
g) Condenar a arguida EEE, pela prática, em co-autoria de um crime de fraude fiscal qualificado, previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, alínea b), e artigo 104.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 1 (um) ano de prisão;
h) Substituir a pena aplicada em g) por 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias de multa à taxa diária de 5,00 (cinco euros), o que perfaz um total de 1.825,00 (mil, oitocentos e vinte e cinco euros);

Inconformados com o assim decidido, recorreram o arguido BBB e o MP, vindo a ser proferido acórdão por esta Relação que declarou a nulidade da sentença, determinando que a 1ª instância proferisse proferindo nova decisão, fazendo constar da motivação factual as declarações prestadas pelos arguidos em sede de julgamento, elaborando sobre estas o competente exame crítico e daí retirando as eventuais consequências jurídicas.

Tendo baixado os autos à instância recorrida, foi proferida nova sentença em que condenou os arguidos nos exactos termos acima mencionados.

B – Recursos

Inconformados com o assim decidido, recorreram o MP e arguido BBB.

B.1. – Recurso do MP

Este recorrente apresentou as seguintes conclusões (transcrição):

1. O objecto do recurso vem limitado à reapreciação de matéria de direito, concretamente à decisão de não condicionar a suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos BBB e DDD ao pagamento da prestação tributária e acréscimos legais e do montante dos benefícios indevidamente obtidos, ao arrepio do disposto no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT.
2. O Tribunal a quo afastou – incorrectamente - a aplicação do disposto no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT com base na Jurisprudência Uniformizada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2012, que não é directamente aplicável in casu e, a jusante, não deve ser aplicável in casu por via de uma inadmissível extensão dos seus termos e fundamentos.
3. Prius, o âmbito objectivo da jurisprudência fixada vem perfeitamente delimitado, quando se reporta ao crime de abuso de confiança fiscal e não a todos os crimes tributários.
4. Secundu, porque vindo reiteradamente e amplamente não julgada verificada a inconstitucionalidade do artigo 14.º do RGIT, conforme Acórdãos do Tribunal Constitucional mencionados na motivação, só gritantes fundamentos (que no caso não se verificam) de natureza teleológico-racional poderiam justificar que um julgador afaste a aplicação de uma norma com base em argumentos que contrariam frontalmente a sua literalidade e a intenção do legislador, por reporte à proposição “sempre” utilizada no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT – artigo 9.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil e artigo 2.º e 3.º do Código de Processo Penal.
5. Tercius, porque a jurisprudência fixada afronta, mesmo quando aplicada apenas aos crimes de abuso de confiança fiscal ou contra a segurança social, as mais elementares premissas da doutrina geral das sanções criminais e do regime de determinação das penas, o que nos é permitido concluir por auxílio a uma visão crítica e juridicamente conformada que desconsidera argumentos de autoridade.
6. Quartus, porque no caso particular do crime de fraude fiscal qualificada, são ainda mais evidentes os fundamentos que deverão conduzir à conclusão de que, em caso de condenação – obrigatoriamente em pena principal de prisão -, a suspensão da execução tem que ser sempre condicionada ao pagamento à Fazenda Nacional, dos benefícios indevidamente obtidos.
7. A insuficiência económica para cumprir integralmente ou parcialmente a obrigação imposta no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT é matéria a apreciar durante a execução da pena, rectius, nos termos previstos nos artigos 55.º e 56.º do Código Penal, e não aquando da determinação daquela pena substitutiva, como de resto se verifica noutras figuras jurídicas, como o pagamento da multa em prestações (artigo 47.º, n.º 3 do Código Penal) ou a suspensão da execução da prisão subsidiária (artigo 49.º, n.º 3 do Código Penal).
8. Deverão V. Exas. adoptar o mesmo entendimento vertido no recente Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, no Processo 338/12.4TARMR.E1, que aqui seguimos e para o qual remetemos.
9. A simples sujeição dos arguidos BBB e DDD a regime de prova no âmbito da suspensão da execução da pena de prisão aplicada, é insuficiente e desadequada para satisfazer as necessidades de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir.
10. Impõe-se que a decisão recorrida seja revogada na parte recursiva, e substituída por outra que condicione a suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos arguidos BBB e DDD à obrigação de pagamento à Fazenda Nacional, por cada um, de metade do valor total de €193.870,30 (cento e noventa e três mil oitocentos e setenta euros e trinta cêntimos), referente à vantagem patrimonial ilegítima obtida, durante o período de suspensão, além da sujeição a regime de prova, nos termos do disposto no artigo 14.º, n.º 1 do RGIT.

B.2. – Recurso do arguido BBB

Este recorrente concluiu as suas motivações da seguinte forma (transcrição):

1) A Sentença proferida é Nula por omissão da publicidade da audiência da Leitura daSentença (artigos206ºda CRPe 321º,nº1e 372º, n/s3a 5doCPP);
2) O arguido não foi pessoalmente notificado para se pronunciar no sentido de dispensar a publicidade da Leitura da Sentença, por forma a autorizar a dispensa dasualeitura;
3) A notificação dirigida aos defensores dos arguidos, sem que conste qualquer cominação, caso os mesmos se mantivessem - como se mantiveram - em silêncio, não legitimou o Tribunal “a quo” na sua decisão unilateral de dispensar a publicidadedaSentença;
4) A sentença ora posta em crise padece de um ERRO NOTÓRIO DE JULGAMENTO, por errada apreciação da prova, visto terem sido incorrectamente julgados factos dados como provados, que deviam ter sido dados como não provados;
5) Segundo o Tribunal a quo, o arguido terá feito uso indevido de facturas falsas, utilizandoas junto de instituições bancárias para concessão de contratos de leasing que não correspondem a negócios reais, porque as máquinas constantes dessas mesmas facturas não existam ou, existindo, não estavam na posse;
6) Com todo o respeito, não se concebe nem se aceita, que o Tribunal a quo tenha dado como provada a tese da acusação de que as máquinas nunca chegaram a existir ou, tendo existido, nunca estiveram na posse e disponibilidade do arguido;
7) O Tribunal a quo abarca toda a motivação da decisão de facto (em que considerou provados todos os factos vertidos no libelo acusatório) no depoimento de apenas 5 (cinco) testemunhas, num universo de 18 (dezoito) pessoas ouvidas em julgamento;
8) As (5) cinco testemunhas cujos depoimentos mereceram a atenção da Meritíssima Juiz para a fundamentação da decisão de facto não têm conhecimento directo das questões sobre que versa a acusação, ao invés das outras pessoas que foram inquiridas;
9) O seu “conhecimento” dos factos apenas resulta duma inspecção levada a efeito pelo fisco, decorridos cerca de 6 (seis) anos após terem tido lugar os negócios jurídicos realizados pelo arguido;
10) O Tribunal a quo afirma ter alicerçado a sua convicção “na análise crítica e conjugada da prova produzida em audiência de julgamento, a qual foi apreciada segundo as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposto pelo ordenamento jurídico, fazendo o Tribunal, no uso da sua liberdade de apreciação, uma análise crítica das provas, incluindo‐se as declarações dos arguidos;
11) Mas na Sentença não consta qualquer referência à forma como o arguido depôs, nem, tãopouco,à valoraçãoque foidadaàssuadeclarações;
12) E isto porque, o arguido BBB prestou depoimento em sede de audiência de discussão e julgamento, explicou as razões pelas quais as facturas de venda das máquinas não apresentavam lucro, tendo referido que adquirira as máquinas originariamente em nome de uma das sociedades arguidas e que, posteriormente, as transferiu para si, por forma a poder vendê-las às instituições financeirasque
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