Acórdão nº 3744/18.7T8CSC-A.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão3744/18.7T8CSC-A.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, na 6.ª secção do Tribunal da Relação
de Lisboa:

I- RELATÓRIO

CONDOMÍNIO DO PRÉDIO sito na Rua …, Oeiras, intentou acção declarativa de condenação em processo comum, contra:
1.ª- L, com sede na Rua …, Lagos e
2.º- R, com última morada conhecida na Rua …, Porto.
O Autor pretende a declaração de nulidade da doação efectuada pelo segundo Réu à L, tendo por objecto a fracção “AD” do prédio sito na Rua ….
A acção foi proposta em 05-12-2018, tendo a Ré L apresentado a sua contestação em 01-02-2019. Juntou procuração a favor do Ilustre Advogado Dr. MC, datada de 16 de janeiro de 2019.
Os autos prosseguem até que em 22 de Setembro de 2020, foi proferido o seguinte despacho:
“(…) Conforme resulta da certidão que antecede, a Ré L foi declarada insolvente por decisão transitada em julgado em 12/06/2020 proferida no âmbito do processo n.º ….
Em consequência da declaração de insolvência da Ré, caducou o mandato conferido ao ilustre mandatário, nos termos do art.º 110.º n.º 1 do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas.
Deste modo, ao abrigo do disposto no art.º 40.º, n.º 1, al. a) e 41.º do Código de Processo Civil, com cópia da petição inicial e da contestação, notifique o sr. AI nomeado para, em vinte dias, constituir mandatário e ratificar o processado, sob pena de, não o fazendo, ficar sem efeito a sua defesa.”

Posteriormente, em 30 de Abril de 2021, veio a ser proferido o despacho com o seguinte teor:
Conforme resulta dos autos, por despacho proferido em 22/09/2020, considerou-se que o mandato conferido ao Ilustre Mandatário da 1.ª R. caducou, em razão da sua declaração de insolvência, ao abrigo do disposto no artigo 110.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas.
Nessa sequência, foi o Senhor Administrador da Insolvência nomeado notificado para, em 20 dias, constituir mandatário, sob pena de ficar sem efeito a sua defesa.
Em resposta, veio o Ilustre Administrador da Insolvência informar que foi decidido em assembleia de credores suspender a liquidação e partilha da massa insolvente, concedendo-se prazo para a apresentação de um plano de insolvência, bem como foi decidido que se mantivesse a devedora administradora do estabelecimento compreendido na massa insolvente. Não tendo sido proferida decisão quanto à homologação do plano apresentado, entende que se mantém válido o mandato conferido pela insolvente aos mandatários.
Dos autos resulta que, por decisão proferida em 11/12/2020, foi aprovada a proposta de plano apresentada em assembleia de credores, ao abrigo do disposto no artigo 212.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, vindo a R. informar que foi recusado a homologação do plano de insolvência apresentado por despacho proferido em 19/01/2021, o que não se mostra comprovado documentalmente.
Sem prejuízo, diremos o seguinte:
De facto, uma das causas de encerramento do processo de insolvência é, nos termos do artigo 230.º, al. b) do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, a homologação do plano de insolvência, se a isso não se opor o conteúdo deste, tendo como efeitos os previstos no artigo 233.º do referido diploma legal, entre eles, a recuperação por parte do devedor do direito de disposição dos seus bens e a livre gestão dos seus negócios (al. a)).
Por seu turno, de acordo com o artigo 110.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, caducam os contratos de mandato que não se mostre serem estranhos à massa insolvente, ou seja, não caducam, por efeito da declaração da insolvência do mandante, os contratos relativos a negócios de carácter não patrimonial ou relativos a bens que não integram, nem possam vir a integrar a massa insolvente – in Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e Recuperação de Empresas Anotado, Quid Juris, Lisboa, 2013, pág. 508.
No presente caso, peticionando o A. a nulidade da escritura de doação celebrada entre os RR., mediante a qual a 1.ª R. adquiriu a propriedade do prédio melhor identificado nos autos, parece-nos manifesto que está em causa um negócio de carácter patrimonial e, como tal, o mandato conferido ao ilustre mandatário caducou.
E, também, a representação processual da Ré encontra-se acometida ao Senhor Administrador da Insolvência nos termos do artigo 81.º, n.º 4 do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas.
Daí que, não obstante até ao momento não haver notícia de que foi declarado o encerramento do processo de insolvência da primeira R., mesmo que tal se venha a verificar no futuro, a verdade é que se mantém actualmente o Sr. Administrador da Insolvência como representante da Ré.
Por outro lado, também no caso de ser declarado o encerramento da insolvência, a caducidade do mandato entretanto ocorrida não deixará de subsistir.
Deste modo, face ao exposto, renovando o despacho anterior, ao abrigo do disposto no artigo 40.º, n.º 1, al. a) e 41.º do Código de Processo Civil, notifique o Sr. Administrador da Insolvência nomeado para, em 10 dias, constituir mandatário e ratificar o processado, sob pena de, não o fazendo, ficar sem efeito a sua defesa.”

Este despacho foi notificado ao Senhor Administrador, e este, no prazo determinado no despacho, nada fez.

Então, com data de 1-06-2021, foi proferido o seguinte despacho:

Na presente acção declarativa sob a forma de processo comum, na sequência da caducidade do mandato conferido pela R. L ao Ilustre Mandatário, foi o Ilustre Administrador da insolvência nomeado, notificado nos termos do artigo 41.º do Código de Processo Civil para constituir mandatário no prazo de 10 dias, sob pena de ficar sem efeito a sua defesa.
Decorrido o prazo legal, o Senhor AI nada disse.
Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do artigo 40.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Civil, é obrigatória a constituição de advogado nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário. Por seu turno, nos termos do artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, a alçada dos tribunais de primeira instância é de € 5000,00.
Ora, o artigo 41.º do Código de Processo Civil estabelece que, se a parte não constituir advogado, sendo obrigatória a constituição, o juiz, oficiosamente ou a requerimento da parte contrária, determina a sua notificação para o constituir dentro de prazo certo, sob pena de o réu ser absolvido da instância, de não ter seguimento o recurso ou de ficar sem efeito a defesa.
Deste modo, considerando o valor da causa, não tendo sido constituído mandatário pelo R., representada pelo seu Administrador da Insolvência, julga-se sem efeito a contestação por si apresentada.
Notifique.”

Inconformada com esta decisão, a Ré interpôs, da mesma, o presente recurso de apelação que subiu em separado e com efeito meramente devolutivo.
Formula as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso, interposto do douto despacho do Mmo. Juiz a quo com a ref.ª citius: 131075264, proferido no dia 01/06/2021, onde veio julgar sem efeito a contestação apresentada pela recorrente nos presentes autos no dia 01/02/2019;
b) O Advogado da recorrente, sustentando que o mandato constituído era regular, veio apresentar os requerimentos com as ref.ªs citius: 39068923 e 39071287, de 02/06/2021;
c) Sobre tais requerimentos não recaiu ainda qualquer despacho por parte do tribunal a quo.
d) A Recorrente foi declarada insolvente por sentença proferida no dia 21 de Maio de 2020, pelas 12:42h, no âmbito do processo n.º 56/20.0T8LGA, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Comércio de Lagoa – Juiz 1.
e) Regra geral, a declaração de insolvência priva o insolvente dos poderes de administração e disposição de bens da massa insolvente, os quais são assumidos pelo administrador da insolvência.
f) Todavia, o referido capítulo X do CIRE permite que verificados determinados pressupostos, e com condicionalismos, a administração da massa insolvente seja assegurada pelo devedor: em tais situações o administrador da insolvência fiscaliza a administração da massa insolvente pelo devedor e comunica imediatamente ao juiz e à comissão de credores quaisquer circunstâncias que desaconselhem a manutenção da situação (n.º 1 do artigo 226.º);
g) Incumbe ao devedor exercer os poderes conferidos ao administrador da insolvência, embora só este possa resolver actos em benefício da massa insolvente.
h) É certo que o contrato de mandato que não se mostre estranho à massa insolvente caduca com a declaração de insolvência do mandante, e que com a declaração de insolvência do representado caducam as procurações que digam respeito ao património integrante da massa insolvente (artigos 110.º, n.º 1 e 112.º, n.º 1, do CIRE; isto embora, no caso, o mandato forense seja anterior à declaração de insolvência, pelo que, em rigor, nem sequer se poderá considerar neste caso concreto a
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