Acórdão nº 37/23.1T8VFR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-01-15

Data de Julgamento15 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão37/23.1T8VFR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 37/23.1T8VFR.P1



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto



I. Relatório
AA, residente na Rua ..., Santa Maria da Feira, com o patrocínio do Ministério Público, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra A..., S.A., com sede Rua ..., Guimarães.
Formula os seguintes pedidos:
I. Declarar-se ilícito o despedimento da A. efectuado pela Ré e, por via disso, ser a Ré condenada a pagar ao A.:
1. o montante de 7.089,00€ (sete mil e oitenta e nove euros) a título de indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, no valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo do contrato (17.10.2022);
2. juros de mora à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento.
II. Ser também a Ré , independentemente da procedência ou não dos demais pedidos, condenada a pagar ao A.:
a) a título de proporcionais de férias e de subsídio de férias, o montante de 1.226,14€ (mil duzentos e vinte e seis euros e 14 cêntimos),
b) a título de proporcionais de subsídio de natal, o montante de 613,00€ (seiscentos e treze euros).
Alega em síntese que: a Ré admitiu o A., a 18.01.2022, por contrato escrito a termo certo, por 9 meses, para, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de Distribuidor; O A. exerceu as suas funções no estabelecimento da A. em Santa Maria da Feira; O estabelecimento da A. em Santa Maria da Feira abriu ao publico em 16.02.2022, mas desde o inicio do seu contrato de trabalho que o A exerceu as suas funções sob a autoridade, direcção e fiscalização da Ré; Designadamente na preparação da loja para abertura ao público; A 15 de março de 2022, a Ré comunicou por escrito à A. a denúncia do contrato de trabalho em período experimental, referindo que o mesmo se considerava sem efeito desde essa data; O período experimental estipulado pela Ré no contrato de trabalho foi de 30 dias.
Realizou-se audiência da partes, não se tendo logrado obter conciliação destas.
A ré veio contestar alegando em síntese: O estabelecimento da Ré foi efectivamente inaugurado no dia 16.02.2022 mas apenas abriu ao público no dia 17.02.2022; foi só a partir desta data (17.02.2022) que o Autor iniciou efectivamente as funções de ajudante de motorista/distribuidor para a qual foi contratado; o trabalhador não exerceu de facto qualquer função compatível com a sua categoria profissional; Aquando da cessação do contrato de trabalho o Autor recebeu todos os seus créditos laborais; O Autor não restituiu à Ré tal quantia, na qual, como se referiu, se inclui todos os créditos laborais devidos pela cessação do contrato, o que constitui aceitação do despedimento.
Foi dispensada a audiência prévia, elaborado despacho saneador, que transitou em julgado, e fixado o objecto do processo.
Foi fixado à acção o valor de €7.089,00.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova testemunhal nela produzida.
Foi proferida sentença, com fixação da matéria de facto provada e não provada, decidindo-se a final: “julgando a acção parcialmente procedente:
A) Declara-se ilícito o despedimento do autor AA, levado a cabo pela ré A..., S.A.
B) Condena-se a ré a pagar ao autor a quantia total de €6.556,09 (seis mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e nove cêntimos), sendo €5.250,00 (cinco mil, duzentos e cinquenta euros), correspondente à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, no valor das retribuições que o autor deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo do contrato, €426,65 (quatrocentos e vinte e seis euros e sessenta e cinco cêntimos), a título de proporcionais de férias, €439,72 (quatrocentos e trinta e nove euros e setenta e dois cêntimos), a título de proporcionais do subsídio de férias e €439,72 (quatrocentos e trinta e nove euros e setenta e dois cêntimos), a título de proporcionais do subsídio de Natal.
C) Condena-se a ré a pagar ao autor os juros de mora, vencidos e vincendos, sobre a quantia referida em B), contados à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento.
D) Absolve-se a ré do demais contra si peticionado.”
Inconformada interpôs a ré o presente recurso de apelação, concluindo:
1. Os fundamentos da sentença estão em oposição com a decisão, o que a torna nula;
2. A sentença recorrida fez também uma incorrecta subsunção da matéria de facto à lei, porquanto a matéria de facto provada e não provada imporia a total improcedência da acção;
3. O período experimental do trabalhador AA teve início a 17 de Fevereiro de 2022, com a abertura da loja da Apelante em Santa Maria da Feira, período a partir do qual o Autor pôde começar a desempenhar as suas funções.
4. Tendo o Autor sido contratado para exercer as funções de distribuidor/ajudante de motorista, tal como ficou provado, e tendo o mesmo passado a exercer efectivamente as funções para as quais foi contratado a partir de 17.02.2022, o período experimental deve contar-se apenas desde a data em que se iniciou a prestação efectiva do trabalho, só relevando o tempo de efectividade de funções.
5. No dia 15 de Março, quando a Apelante comunicou, por escrito, ao Autor, a denúncia do contrato de trabalho, o trabalhador AA ainda se encontrava em decurso o período experimental.
6. Assim, a cessação do vínculo contratual ocorreu de forma lícita.
7. Por esta via, não é devida ao trabalhador AA, a título de danos patrimoniais e/ou não patrimoniais, qualquer indemnização que tenha como fundamento a ilicitude do seu despedimento.
8. A sentença recorrida violou os artigos 111º, 112º, 114º, 338º, 366º, 381º do Código do Trabalho, e o artigo 615º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil.
O Ministério Público alegou, concluindo:
1. Em 18/01/2022, mediante contrato de trabalho escrito a termo certo de nove meses, a ré admitiu o autor ao seu serviço para, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de distribuidor, com um horário de 40 horas semanais e mediante a retribuição mensal de €750,00, e
2. desenvolver, ainda, quaisquer actividades profissionais próprias das categorias de armazém e correlativos a que corresponda o vencimento e qualificação equivalente,
3. Desde o dia 18/01/2022, o autor, sob a autoridade, direcção e fiscalização da ré, trabalhou na preparação da loja para abertura ao público, procedendo à limpeza das instalações e arrumação/organização da mercadoria na loja.
4. No decurso da execução do contrato não podem as partes proceder à alteração da data de início do contrato, dado que isso altera o elemento essencial da relação laboral que é a data do seu início.
5. Conclui-se, pois, que a ré recorrente fez cessar o contrato para além do período de 30 dias estabelecido no artigo 112º, nº 2, alínea a) do Código do Trabalho.
6. Traduzindo-se tal facto num despedimento ilícito.
O Ilustre Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos, não tendo emitindo parecer, devido ao patrocínio do autor.
Admitido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Como se sabe, o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões do recorrente (artigos 635º, nº 4, e 639º, nº. 1, do CPC, por remissão do art. 87º, nº 1, do CPT), importando assim decidir quais as questões naquelas colocadas.
Importa apreciar, se a sentença é nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão, e se o despedimento do autor ocorreu no decurso do período experimental, ou depois de findo este.

II. Fundamentação de facto
Na sentença recorrida foram considerados os seguintes factos provados:
1. A ré é uma sociedade comercial que tem por objecto o comércio por grosso de géneros alimentares.
2. No exercício dessa actividade, em 18/01/2022, mediante contrato de trabalho escrito a termo certo de nove meses, a ré admitiu o autor ao seu serviço para, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de distribuidor, com um horário de 40 horas semanais e mediante a retribuição mensal de € 750,00.
3. O autor exerceu as suas funções no estabelecimento da ré, sito em Santa Maria da Feira.
4. Esse estabelecimento foi inaugurado em 16/02/2022 e abriu ao público em 17/02/2022.
5. Desde o início do contrato (18/01/2022), o autor, sob a autoridade, direcção e fiscalização da ré, trabalhou na preparação da loja para abertura ao público, procedendo à limpeza das instalações e arrumação/organização da mercadoria na loja.
6. Ao autor foram-lhe pagas as retribuições mensais referentes aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março.
7. O autor esteve sujeito ao horário de trabalho estabelecido pela ré.
8. A 15 de Março de 2022, a ré comunicou por escrito ao autor a denúncia do contrato de trabalho em período experimental, referindo que o mesmo se considerava sem efeito desde essa data.
9. O período experimental estipulado no contrato foi de 30 dias.
10. Não foi instaurado ao autor qualquer processo disciplinar para averiguação de justa causa de despedimento.
11. Só a partir da abertura do estabelecimento ao público (17/02/2022) iniciou o autor as suas funções de distribuidor/ajudante de motorista.
12. Aquando da cessação do contrato, em Março de 2022, o autor recebeu: €123,29, a título de proporcionais do subsídio de Natal; €123,29, a título de proporcionais do subsídio de férias; €136,36, correspondente a 4 dias de férias não gozados.
13. A quantia total paga pela ré ao autor em Março de 2022, ascendeu a €700,47, que o autor não restituiu à ré.
14. A partir do dia 16/03/2022, inclusive, o autor entrou de baixa médica por um período de 7 dias, prorrogado ulteriormente até 02/04/2022.
15. A denúncia do contrato foi reiterada por carta registada enviada ao autor no dia 16/03/2022, recebida por este no dia 18/03/2022.
16. O autor foi contratado para distribuir
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