Acórdão nº 366/23.4PAENT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05-03-2024

Data de Julgamento05 Março 2024
Ano2024
Número Acordão366/23.4PAENT-A.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
RELATÓRIO

Reapreciando a prisão preventiva em que o arguido AA se encontra, em 15/11/2023, foi proferido o seguinte despacho:

“Vi o relatório da DGRSP.

Do seu teor, dê conhecimento ao arguido.

Dado que inexistem circunstâncias novas que tenham reflexo na medida de coacção a que o arguido AA, está sujeito e que tenham que ser apuradas, resulta despicienda, a nosso ver, a audição do arguido prévia à prolação do presente despacho (artigo 213º, nº 3 do C.P.P.).

Nos presentes autos, foi no dia 13/11/2023, a fls. 789 e segs., deduzida acusação contra o aqui arguido AA, imputando-se-lhe, para além do mais, a prática de um crime de roubo na forma tentada e outro na forma consumada e a prática de crimes de furto qualificado.

O mencionado arguido encontra-se sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, desde 15/07/2023, conforme resulta de fls. 134 e segs., tendo-se então entendido preenchidos os perigos de continuação da actividade criminosa e fortemente indiciados a prática de cinco crimes de furto qualificado, revista a fls. 491 e segs., em 12/10/2023.

Não ocorreram quaisquer circunstâncias que tenham alterado os pressupostos de facto e de direito que estiveram na base da aplicação a tal arguido de tal medida de coacção, sendo que a dedução da acusação só adensou e reforçou os indícios que, então, se consideraram já recolhidos, sendo que agora se lhe imputam também crimes de roubo, na forma consumada e tentada, para além de outros.

Nomeadamente, mantém-se o perigo de continuação da actividade criminosa, dados os factos que constam da acusação deduzida, praticados em período de liberdade condicional e a situação pessoal do arguido e seu percurso de vida, sendo consumidor de cocaína de há vários anos a esta parte, conforme o arguido o assume, tendo feito duas tentativas de internamento em Comunidade Terapêutica das quais veio a desistir passados pouco dias. No inicio do ano de 2023, deixou de comparecer em consulta do Centro de Respostas Integradas e, em meio prisional mantém-se abstinente e mantém acompanhamento psicológico (tudo conforme fls. 675 e segs., prisão que condiciona e implica tal abstinência.

Fruto das suas necessidades de consumo, a prática dos crimes aqui em apreço, contra o património, cremos, tendo o arguido em sede de 1º interrogatório aludido a tais problemas aditivos. Acresce que tal medida já foi ponderada em sede de 1º interrogatório judicial de arguido detido e afastada, por se entender ser insuficiente e inadequada. Ora, se o era, insuficiente e inadequada, por referência a uma habitação, também o é e muito mais, por referência a instalações de maior dimensão e de mais difícil vigilância.

Acresce que as medidas de coacção estão sujeitas ao principio “rebus sic stantibus”.

Só podem ser alteradas se se alterarem as circunstâncias que estiveram na base da sua aplicação, o que não ocorreu.

Assim sendo, entendo manter o arguido AA sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, assim revendo a mesma, não se mostrando adequada nem suficiente, a salvaguardar o perigo cautelar de continuação da actividade criminosa a obrigação de permanência na habitação ainda que mediante internamento em Comunidade Terapêutica, com sujeição a meios electrónicos de vigilância à distância, conforme requerido pelo arguido.

A comunidade é composta também por espaços exteriores, sem controlo de segurança especial, que os utentes podem frequentar, sendo a Equipa de opinião que o arguido deveria ser autorizado a efectuar saídas no âmbito do seu processo terapêutico, o que de todo acautela tal perigo de continuação da actividade criminosa, mormente recaídas na adicção de que sofre e necessidades de satisfação dessa adicção, consabido que qualquer tratamento de longo prazo apresenta retrocessos e avanços e o arguido ao longo da sua vida já passou por alguns, sem sucesso.

Como todos sabemos, não é difícil o retirar uma pulseira, escusando-se assim o arguido à vigilância electrónica.

O prazo máximo da prisão preventiva não se mostra decorrido, sendo que os 4 meses a que alude o Artigo 215º, nº1, al. a) terminavam no dia 15/11/2023 (4 meses), tendo sido antes deduzida acusação.

DECISÃO:

Termos em que, ao abrigo do Artigo 213º, nº 1, al. b) do CPP, revejo e mantenho a medida e coacção de prisão preventiva aplicada ao arguido AA, indeferindo-se o por si requerido quanto à aplicação de medida de obrigação de permanência em Comunidade Terapêutica, ainda que com sujeição a meios electrónicos de vigilância à distância, por manifestamente insuficiente e inadequada tal medida de coacção face ao perigo cautelar de continuação da actividade criminosa.”

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Inconformado com o referido despacho, dele recorreu o arguido, tendo terminado a motivação de recurso com as seguintes conclusões:

“1. DECISÃO RECORRIDA: decisão que não alterou a MC de PP para a MC de OPHVE em comunidade terapêutica, nos termos dos artigos 219.º, n.º 1, 401.º, n.º 1, alínea b), e 411.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal.

2. não pode o arguido conformar-se com tal despacho judicial, porquanto o mesmo viola o disposto nos artigos 193.º, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Penal, e o artigo 28.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, tendo ainda sido feita uma incorrecta interpretação da norma constante do artigo 212.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.

3. o presente recurso versará sobre a interpretação e aplicação das normas constantes dos artigos supramencionados, ou seja, sobre matéria de direito, em conformidade com o artigo 412.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

4. O arguido foi sujeito à MC de prisão preventiva, por se encontrar fortemente indiciado de factos susceptíveis de consubstanciar a prática, em concurso efectivo, de cinco crimes de furtos qualificados. Os factos imputados ao arguido são os que constam da decisão que lhe aplicou a MC de prisão preventiva que aqui damos por integralmente reproduzidos.

5. Considerou-se existir um elevado perigo de continuação da actividade criminosa, não se tendo dado como verificado em concreto o perigo de perturbação da instrução do processo (risco de intimidação e silenciamento dos ofendidos), bem como não foi determinado a existência de qualquer perigo de fuga.

6. Por outro lado, o despacho judicial em que se determinou a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva determinou desde logo - e bem – que “porquanto não existem ainda elementos seguros para garantir a viabilidade técnica da obrigação de permanência na habitação ou se a mesma é adequada à situação familiar do arguido e permite tal medida de coação arredar o arguido do modo devida em que ingressou apos ter sido restituído à liberdade.”

7. Mais se escreveu que “assim, tudo visto e ponderado, apenas a medida de coação de prisão preventiva permite garantir de forma bastante, a qual é suscetível de ser substituída se reunidas as condições técnicas e pessoais para a obrigação de permanecia na habitação com vigilância electrónica, caso se venha a comprovar que o arguido tem uma problemática aditiva e se o tratamento em regime de internamento é viável.”

8. Nesse seguimento, foi oficiada a DGRSP solicitando-se a elaboração da informação a que alude o artigo 7.º, n.º 2, da Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro. Nesse seguimento, a DGRSP elaborou relatório que foi junto aos autos a 8 de novembro de 2023, no qual concluiu que: “Tendo em conta a apreciação global da situação do arguido, afiguram-se reunidas as condições objectivas para que este possa beneficiar de acolhimento em comunidade terapêutica.

9. O arguido procedeu à junção aos autos todos os relatórios médicos que comprovam o facto de o arguido tem problemática aditiva e, ainda, de que o seu tratamento em regime de internamento não só é viável, como foi junto parecer favorável da comunidade terapêutica “…” à admissão do recorrente nessa comunidade, havendo já vaga para o mesmo entrar, sendo que a sua admissão seria agendada após decisão do Tribunal nesse sentido.

10. Tendo em conta o teor de tal relatório, e uma vez que se considerou estarem verificados os pressupostos previstos nos artigos 1.º, al. a), 4.º, n.ºs 1, 2, 4 e 5, e 16.º, n.º 1, da Lei n.º 33/2010, de 02 de Setembro, em conjugação com o artigo 201.º, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Penal, e por se entender que a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação se revela adequada, necessária e proporcional às exigências cautelares que se fazem sentir, o arguido requereu, nos termos do disposto no artigo 212.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, a substituição da medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao arguido AA pela medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, a ser cumprida em regime de tratamento terapêutico à sua dependência de drogas duras, nas instalações da Comunidade Terapêutica “…”.

11. A decisão recorrida só se percebe porque foi proferida por magistrado diferente daquele que proferiu a decisão que aplicou a Prisão preventiva e porque a nova magistrada judicial não leu a decisão que aplicou a MC de prisão preventiva, ou, se a leu, não percebeu o seu alcance nem entendeu o espírito de quem a proferiu – surge então o teor da decisão recorrida.

12. despacho recorrido considerou ser de manter a prisão preventiva aplicada ao arguido.

13. Para fundamentar tal decisão, a Mma. Juíza referiu que inexistência de circunstâncias novas que tenham reflexo na medida de coação que o arguido AA, está sujeito e que tenham de ser apuradas (…).

14. O arguido recorrente não concorda com tal fundamentação, porque os autos demonstram exactamente o contrário.

15. A decisão que aplicou a MC de prisão preventiva ao arguido é clara. No momento em que foi aplicada a MC de prisão preventiva, não resultava provado que o arguido...

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