Acórdão nº 3371/21.1T8MTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-11-27

Ano2023
Número Acordão3371/21.1T8MTS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo 3371/21.1T8MTS.P1
Relator – Paula Leal de Carvalho (Reg. 1366)
Adjuntos: Des. Rita Romeira
Des. Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

AA intentou ação declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra a Ré, A..., SA, pedindo que seja a ré condenada no pagamento de:
“a) Subsídio por morte no montante de € 5.792,28, acrescido de juros
b) A pensão obrigatoriamente remível de €3.443,28 devida desde o dia 08/07/2021, dia seguinte ao da morte (sem prejuízo de ampliação do pedido, se outros factos se vierem a apurar nos termos do art. 18º da REGULAMENTA O REGIME DE REPARAÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO E DE DOENÇAS PROFISSIONAIS);
c) Despesas de funeral e trasladação na quantia de € 2350,00
d) Despesas com deslocação ao tribunal no valor de €12,00”

Citada a ré veio requereu a intervenção da entidade patronal da sinistrada/falecida em face da transferência parcial da remuneração da sinistrada falecida mantendo a posição já assumida na tentativa de conciliação, ou seja, de que o acidente se ficou a dever à violação das regras de segurança por parte da entidade empregadora.

Foi determinada a intervenção principal da empregadora, B..., L.da, a qual contestou alegando que o acidente deve ser descaraterizado por ter havido violação das regras de segurança pela trabalhadora.
O A. solicitou a fixação de pensão provisória o que foi deferido tendo o FAT vindo informar em 2.12.2022 que procedeu já à liquidação da quantia de € 2.562,00 a título de pensão provisória mantendo-se a mesma em pagamento.

Por despacho de 11.07.2022 foi fixado ao A. “a pensão provisória anual atualizável de € 2940,00, a adiantar pelo Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT), devida desde a data em que foi pedida, 23.2.2022, a pagar mensalmente nos termos do disposto no art. 72.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, no domicílio da autora, sem prejuízo de estipulação diversa por acordo (art. 73.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro).
Os montantes já vencidos serão pagos de uma só vez com a primeira prestação”, tendo o FAT requerido que, aquando da prolação da sentença final, seja ordenada a restituição ao Fundo das quantias adiantadas ao beneficiário da sinistrada pela entidade que vier a ser considerada responsável, em conformidade com o disposto no art. 122 n.º 4 do CPT.

Foi proferido despacho saneador, consignando-se os factos assentes e os temas da prova.

O autor veio requerer a ampliação do pedido em 6.12.2022 pedindo a condenação no agravamento das pensões por atuação culposa do empregador, nos termos dos art.s 59º a 61º da LAT e 265 n.º 2 do CPC (Código de Processo Civil) referindo que da prova produzida na primeira audiência de julgamento e tendo sido proferido despacho de acusação no processo crime no dia 15.11.2022 que teve origem nos factos em discussão nos presentes autos afigura-se existirem fortes indícios de que a entidade empregadora atuou culposamente, ampliação do pedido que foi deferida em sede de sentença.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“Termos em que, julgo a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:
I) Condeno a ré B..., L.da a pagar ao autor:
- a pensão anual no montante de € 10.954,34 com vencimento desde o dia seguinte ao falecimento da sinistrada e a pagar nos termos previstos no art.º 72.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde o vencimento (08.07.2021) até efetivo pagamento;
- o valor de € 5792,29 a título de subsídio de morte, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde o dia seguinte ao falecimento do sinistrado até efetivo pagamento;
- o valor de €1.930,76 a título de subsídio por despesas de funeral acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação desta ré até efetivo pagamento; sendo que a estas quantias haverá que deduzir o montante liquidado a título de pensão provisória;
E, ainda, na restituição ao FAT das quantias por si adiantadas e que em 18.11.2022 ascendiam já a € 2562,00 bem como nas liquidadas posteriormente.
II) Condeno solidariamente a ré A... no pagamento das quantias acima aludidas, sem prejuízo do direito de regresso e limitada à sua responsabilidade nos termos do art. 79º n.º 4 da Lei 98/2009, de 4 de setembro, sendo que em relação à pensão anual corresponderá a 30% da retribuição transferida até perfazer a idade da reforma por velhice de € 2.940,00 e 40% a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho, no mais se absolvendo as rés
Custas pelo autor e ré B..., L.da, na proporção do decaimento.
Fixo como valor da ação para efeito de custas em €18.677,39, art.º 120.º, n.º 2, do CPT”.

Inconformada, veio a Ré “B...” recorrer, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1.ª Não podemos concordar com o sentido seguido pelo douto aresto de que se recorre.
2.ª A Recorrente não se conforma com a sentença entendendo que os factos considerados não provados foram mal julgados face à prova produzida, e que ditaria decisão contrária.
3.ª A Recorrente tem perfeita consciência dos requisitos e ónus da reapreciação da matéria de facto, mas, no caso concreto, em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, lamentavelmente, vai ter de pedir aos Venerandos Desembargadores a reapreciação de muitos dos pontos da matéria de facto dados como não provados.
4.ª Com o devido respeito entende a Recorrente que foram mal julgados os factos dados como não provados:
- No dia do sinistro a sinistrada tenha carregado no botão do elevador e este tenha subido ao rés-do-chão e colocado de seguida na plataforma os baldes de lixo que transportava;
- A sinistrada tenha tido necessidade de realizar outras tarefas e tenha fechado a porta do elevador e ausentou-se do local;
- Minutos depois regressou a porta do rés-do-chão do ascensor a fim de o utilizar;
- Entre o momento em que a sinistrada esteve anteriormente junto do ascensor e aquele em que regressou uma outra pessoa acionou o elevador tendo a plataforma descido até à cave;
- As manutenções periódicas e verificação do funcionamento do monta-cargas fosse efetuado pelo técnico BB;
- O espaço de acesso ao monta-cargas através do corredor de cozinha estivesse iluminado;
- A porta através da qual se acedia ao ascensor estivesse sempre trancada à chaves;
- Abertura da porta de acesso ao ascensor estivesse dotada de dois mecanismos de segurança um primeiro manual que consistia na abertura com a chaves;
- Fosse visível saber se plataforma se encontrava no patamar certo dada a dimensão do monta-cargas e a iluminação do espaço.
5.ª Todos estes factos foram cabalmente provados e resultaram claros na audiência de discussão e julgamento, conforme depoimentos já transcritos, pelo que não pode, pois, subsistir a decisão recorrida.
6.ª Na opinião da aqui Recorrente ou existiu culpa da sinistrada quer não atuou com o cuidado e diligência devidos. Com efeito, provou-se a existência de regras ou condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora na altura da avaria do equipamento. E a prática, por parte da sinistrada, de uma conduta – ato ou omissão – violadora dessas regras ou condições de segurança que eram de si conhecidas. Ficou provado a voluntariedade desse comportamento, ainda que não intencional, e sem causa justificativa, por parte da sinistrada. E a existência de um nexo causal entre o ato ou omissão da sinistrada e o acidente ocorrido.
7.ª Caso os Venerandos Desembargadores entendam que não se verifica a causa de descaracterização de acidente de trabalho prevista na al. a) do n.º 1 do artº 14º da Lei nº 98/2009, de 4/09 foi um acidente de trabalho, então a responsabilidade pelo sinistro deverá ser assumida pela Ré Seguradora.
8.ª Dispõe o art. 8º, nº 1 da LAT (Lei nº 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais) que se considera acidente de trabalho aquele que se verifique no local de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte.
9.ª A sinistrada, no dia 28 de janeiro de 2021, trabalhava sob as ordens, direção e instruções do Interveniente/Recorrente quando sofreu um acidente.
10.ª Na data em que tal acidente ocorreu, o Interveniente/Recorrente, na qualidade de entidade patronal, havia transferido a sua responsabilidade por acidentes de trabalho para a Ré/Recorrida A..., S.A., através de contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho titulado pela apólice com o nº ... pelo valor da retribuição anual de €9.800,00.
11.ª Através desse contrato, a Ré/Recorrida comprometeu-se a, de acordo com as condições gerais e particulares da apólice, “garantir” a responsabilidade do seu segurado pelos “encargos obrigatórios provenientes de acidente de trabalho em relação às Pessoas Seguras identificadas na apólice, ao serviço da unidade produtiva também ali identificada, independentemente da área em que exerçam a sua atividade”, onde se incluía a falecida.
12.ª No dia do acidente, a sinistrada encontrava-se a trabalhar nas instalações da Interveniente/Recorrente e tinha perfeito conhecimento que o elevador de serviço – uma plataforma elevatória monta-cargas – estava avariado há algum tempo.
13.ª Em momento anterior ao acidente, a porta de tal monta-cargas trancava automaticamente quando a plataforma se encontrava a funcionar, nunca tendo ocorrido qualquer acidente de trabalho na utilização de tal equipamento.
14.ª É ainda falso que tal porta não tivesse um mecanismo de encravamento que funcionasse de forma interligada com o próprio ascensor. Este mecanismo existia,
...

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