Acórdão nº 326/21.0YHLSB.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 21-06-2022

Data de Julgamento21 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão326/21.0YHLSB.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa,
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I. RELATÓRIO.
PACHECA HOTEL, EVENTOS & GOURMET, LDA. interpôs recurso do despacho do Senhor Diretor do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), proferido por subdelegação de competências do Conselho Diretivo, do mesmo Instituto, que recusou o pedido registo do DM 4722.
Alegou, em síntese, que o pedido de registo foi concedido numa primeira fase, sem que tenham ocorrido reclamações e que após a decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, a recorrida pediu a modificação da decisão, sendo que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial não deveria ter aceite tal pedido, na medida em que não tendo a recorrida reclamado em momento anterior ficou precludido o seu direito de pedir a modificação oficiosa.
Acrescentou que, o seu DM tem as características e requisitos legais de registo, razão pela qual o registo deveria ter sido concedido.
Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 42.º do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 110/2018, de 10/12.
Foi citada a parte contrária que pediu a improcedência do recurso, alegando, em síntese, que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial decidiu adequadamente.
Veio então a ser proferida sentença que julgou improcedente o recurso.
Inconformada, apelou a Requerente, concluindo, após alegações, da seguinte forma:
1. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedente o recurso judicial apresentado pela ora Recorrente e, consequentemente, determinou a manutenção da decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (“INPI”) em recusar o registo relativo ao Desenho ou Modelo (“DM”) Nacional n.º 4722, publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 142/2021.
2. Considera a Recorrente, que o Tribunal a quo não procedeu a uma cabal análise da prova documental junta aos autos, entendendo, ainda, que a sentença assenta numa errada apreciação da matéria de direito.
3. Assim, a Sentença Recorrida deve ser revista, uma vez que contrariamente ao que decorre da mesma, encontram-se preenchidos os requisitos de novidade e da singularidade dos DM em crise nos presentes autos, pugnando-se por isso pela substituição da sentença recorrida por outra que ordene a competente revogação do Despacho proferido pelo INPI o qual recusou o pedido de registo do DM nacional n.º 4722.
4. Pretendia a Recorrente com o recurso judicial interposto para o Tribunal a quo julgasse o mesmo procedente e com isso substituísse o despacho de modificação da decisão proferido pelo INPI relativo à concessão do registo do DM n.º 4722.
5. Por outras palavras considerou o Mm.º Juiz a quo que o despacho proferido pelo INPI não merecia qualquer censura, tendo este despacho sido no sentido de que ao desenho constante do pedido de registo submetido pela Recorrente faltava novidade e singularidade, com fundamento na similitude entre esse produto e vários outros anteriormente divulgados ao público, através, por exemplo, de publicações de imprensa e páginas da Internet;
6. Considerando que o DM n.º 4722 falhava o preenchimento dos dois requisitos substantivos centrais para a atribuição do direito exclusivo de DMs, sendo que o INPI alterou a decisão de concessão que havia proferido em 23 de janeiro de 2017.
7. Pode ler-se na sentença recorrida que “O que o recorrente defende serem, no seu desenho, particularidades, como o forro a prancha de madeira na parte que, na ótica da recorrente torna o seu bungalow inconfundível; o facto de estar assente em duas traves horizontais; o revestimento em madeira clara (característica que não resulta dos desenhos); a janela frontal na forma circular; e, a tampa circular na cobertura não conferem os desejados novidade e carácter singular, na medida em que não alteram a perceção global e de conjunto do produto, circunstância em alinhamento com o artigo 176.º n.º 2, que dispõe que se consideram idênticos (pelo que não são novos) os desenhos ou modelos cujas características especificas apenas difiram em pormenores sem importância e em alinhamento com o artigo 177.º segundo o qual só existe carácter singular se a impressão global que suscita no utilizador for diversa da impressão global causada pelo desenho anterior. Em conclusão, e em concordância com o Instituto Nacional da Propriedade Industrial, afigura-se que não estamos na presença de um desenho que reúna os requisitos necessários à sua proteção (…)”.
8. Ora, não pode a Recorrente concordar com tal decisão, impondo-se uma revisão cautelosa e minuciosa dos desenhos e modelos sobre os quais incidiu o pedido de registo nacional n.º 4722.
9. Desde logo, constitui fundamento de recusa de registo o não preenchimento do disposto nos artigos 176.º (novidade) e 177.º (caráter singular) do CPI, requisitos esse que como demonstrado pela Recorrente estão preenchidos.
10. Ademais e como se sabe, quer para aferir a novidade, quer para aferir a singularidade, é necessário comparar o desenho em análise com os desenhos já divulgados ao público na data do pedido (ou da prioridade reivindicada).
11. Apesar de não ter efetuado esse exame comparativo entre o produto da ora Recorrente e os produtos potencialmente conflituantes invocados no presente processo, o INPI e a sentença recorrida corrobora, que aquele não preenchia os requisitos da novidade e da singularidade.
12. Salvo o devido respeito, porém, se a Recorrente já considerava que o INPI apreciou estes requisitos de proteção de modo apenas superficial, o mesmo se diga do Tribunal a quo, não tendo o mesmo confrontado os desenhos que se dizem “iguais”, pois caso tal exercício tivesse sido realizado, a pretensão da Recorrente seria procedente e o pedido de registo seria aprovado.
13. Uma análise mais atenta, revela não apenas que a aparência do DM n.º 4722 é nova, diferindo de DMs anteriormente divulgados em pormenores com significativa importância ornamental mas também dotada de singularidade.
14. Isto porque ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, a impressão global que o DM da Recorrente suscitada no utilizador informado difere da causada pelo conjunto de DMs pertencentes à chamada parte prévia.
(Da novidade)
15. Nos termos do art. 176.º do CPI, o DM é considerado novo se nenhum DM idêntico tiver sido divulgado ao público antes da data relevante para a proteção, dentro ou fora de Portugal (n.º 1), sendo que os DMs serão tidos como idênticos se as suas características específicas diferirem apenas em pormenores sem importância (n.2).
16. Se por um lado a Recorrente não põe em causa que, à data do pedido de registo do DM n.º 4722, já tinha havido divulgação ao público, para efeitos do art. 178.º n.º1, de bungalows com a aparência de uma pipa de vinho, admitindo inclusive a Recorrente que, tendo esses produtos anteriores sido divulgados através da utilização no comércio, de revistas da especialidade e de páginas da Internet, não pode deixar de considerar-se que esses produtos foram divulgados de forma a poder razoavelmente ter chegado ao conhecimento dos meios especializados na UE, integrando assim o património prévio de DMs.
17. Por outro lado, não pode a Recorrente aceitar, a análise comparativa entre esses produtos e o DM n.º 4722 e conclusões que dela se deve extrair, uma vez que entende o Tribunal a quo que para além dos produtos divulgados anteriormente no mercado hoteleiro (posição já vertida no despacho do INPI), existe uma grande similaridade global dado que os pormenores da prancha (terraço) não são suficientemente diferenciadores.
18. Ora a verdade é que o confronto entre os dois conjuntos de figuras coloca a nu as manifestas diferenças entre o DM da Recorrente e o tipo de produtos anteriormente divulgados.



Figuras 1, 2, 3 - Desenho ou modelo n.º 4722, cujo pedido de registo foi publicado no BPI em 15 de novembro de 2016;



Figuras 5 e 6 - Produto anterior, utilizado na Alemanha e divulgado na rede social Pinterest.
19. Desde logo, a prancha de madeira na parte dianteira, a servir de terraço para os ocupantes, torna o bungalow da Recorrente inconfundível e em nada se confunde com o de qualquer outro desenho anteriormente divulgado, pois que para além de constituir uma diferença relevante, este é um terraço verdadeiramente original e que nunca passaria despercebido aos olhos dos consumidores.
20. Trata-se, aliás, de um dos elementos marcantes dos bungalows que vieram a ser edificados na Quinta da Pacheca com base no DM n.º 4722, sendo utilizado pelos ocupantes para fins diversos, nomeadamente para refeições e repouso:


21. Para além das diferenças relacionadas com a prancha dianteira, são várias as escolhas criativas que distinguem o DM n.º 4722 da "arte prévia": o facto de estar assente em duas traves horizontais, o revestimento de madeira clara (que contrasta com o dos bungalows retratados nas figuras 4 e 5), a janela frontal em forma circular e a tampa circular no topo da cobertura.
22. Naturalmente, o facto de partilharem a mesma finalidade - elemento destacado no despacho do INPI para concluir no sentido da existência de identidade ou "grande similitude" – está longe de ser decisivo, uma vez que a finalidade não constitui uma característica ornamental.
23. A finalidade do produto não faz parte dos elementos legais da definição de "desenho ou modelo", não sendo sequer avaliável ou equacionável na aferição ou determinação das características do DM ou da sua aparência.
24. Considerar a finalidade servida por um produto como um elemento relevante implicaria ainda a exclusão de numerosos produtos do âmbito potencial de proteção: qualquer produto que cumprisse o mesmo propósito que um produto anteriormente divulgado veria as chances de aceder à proteção conferida pelo regime de DMs diminuídas, o que não poderia deixar de se considerar
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